por Domingos Sávio Telles
Os vetos presidenciais à Lei nº 12.688, de 18 de julho de 2012, trouxeram sérias preocupações para grande parte das instituições de ensino catarinenses. Como se sabe, as mais antigas instituições de ensino superior (IES) de Santa Catarina são públicas ou mantidas por fundações constituídas por lei. As fundações criadas por municípios são mantenedoras de uma expressiva quantidade de IES.
Dentre essas fundações, algumas, têm personalidade jurídica de direito privado e não recebem subvenções públicas. São, na verdade, integrantes do chamado terceiro setor e sobrevivem das receitas oriundas das taxas e mensalidades cobradas dos alunos e ainda de serviços prestados para a comunidade.
A preocupação veio à tona no tocante ao veto que impede as mantenedoras de IES integrantes dos sistemas estaduais de ensino de aderirem ao Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento das Instituições de Ensino Superior (PROIES) instituído pela mencionada lei. Até o momento, as IES mantidas pelas fundações não haviam analisado mais detidamente seu enquadramento nos sistemas de ensino legalmente previstos.
Notícias recentes afirmam que as fundações catarinenses, em sua maioria, não poderiam aderir ao programa, dada suas condições de integrantes do sistema estadual de ensino. No entanto, a questão não é tão simples.
A Lei de diretrizes e bases da educação (LDBE) não possui, a nosso ver, um rigor técnico ao utilizar conceitos como "iniciativa privada", "direito privado", e as expressões "instituídas" e "mantidas". Essa falta de rigor metodológico é fruto da evolução legislativa pós constituição federal de 1967, com as sucessivas reformas decorrentes do regime então vigente, e da adaptação normativa pós constituição de 1988. Certamente redigida com a participação de técnicos especializados, que conheciam as diretrizes, conceitos e jargões educacionais, a LDBE parece esquecer certas particularidades jurídicas no conjunto conceitual formado pela intersecção das esferas civil e administrativa. Vejamos, rapidamente, o caso das fundações criadas por lei.
O poder público, inclusive o municipal, pode criar fundações com personalidade jurídica de direito privado. No ato de instituição, pode o município dotar a fundação de autonomia administrativa e desvinculação das finanças públicas quanto à sua manutenção. É assim que existem fundações comunitárias, que, embora tenham origem em lei municipal, atuam autonomamente, com participação da comunidade em sua administração, e gerem seus recursos financeiros captando-os diretamente no mercado, exercendo, portanto, a livre iniciativa. (O que as diferencia de uma sociedade empresária é, primordialmente, a inexistência de distribuição de lucros ou dividendos). Essa categoria está prevista na LDBE, em que pese a redação do inciso II do art. 20. A lei classifica as IEs comunitárias, por sua vez, como "instituições privadas". Essas são, segundo a lei, mantidas e administradas por pessoas física ou jurídicas de direito privado.
Todavia, essa categorização "instituições privadas" parece não ser útil na LDBE. Ao estabelecer quais IES integram os sistemas de ensino, a lei utiliza como categoria distintiva a "iniciativa privada". Em decorrência, o sistema federal de ensino é integrado pelas IES "criadas e mantidas pela iniciativa privada".
Ora, uma universidade criada por uma fundação municipal comunitária, de direito privado, que é mantida por seus próprios recursos, enquadra-se em qual sistema? No federal ou no estadual? Neste último, certamente não! A LDBE estabelece que apenas as IES mantidas pelo poder público estadual ou municipal integram o sistema estadual. Por outro lado, como vimos, a LDBE é confusa quando trata do sistema federal de ensino. E é essa imprecisão que gera a dúvida a respeito das consequências dos vetos à lei que instituiu o PROIES.
Entendemos que mediante interpretação sistemática da legislação pode-se concluir que as mantenedoras constituídas na forma de fundações municipais, a depender de suas características institucionais, podem aderir ao PROIES sob pena de haver indevida discriminação. Um exame detalhado de seus históricos e origens legislativas, do funcionamento de sua administração e da forma como são geridas e sustentadas, possibilitará uma conclusão mais segura sobre o tema.
Domingos Sávio Telles - Advogado da Pactum Consultoria Empresarial
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