2021, um ano quase perdido
Adelto Gonçalves (*)
SÃO PAULO - Nem mesmo se chegou à metade do ano e não há quem possa imaginar que a balança comercial irá fechar com um superávit de US$ 70 bilhões, com as exportações chegando a US$ 256 bilhões (contra US$ 221 bilhões em 2020) e as importações a US$ 186 bilhões (contra US$ 168 bilhões em 2020), de acordo com a previsão feita em março pelo Banco Central. Se isso se confirmar, o superávit representará um recorde histórico, pois será superior à maior marca já alcançada, a de 2017 (de US$ 67 bilhões).
Segundo o Banco Central, embora o ano tenha começado com números decepcionantes, em consequência do agravamento provocado pela segunda onda da pandemia de coronavírus (covid-19), é esperado um aumento nas exportações ainda neste primeiro semestre de 2021, especialmente em razão da boa safra de soja e do patamar elevado em que se encontram os preços das commodities (alimentos, petróleo e minério de ferro) e pela recuperação da demanda internacional.
Essa previsão, porém, parece muito otimista, até porque as indústrias brasileiras continuam com dificuldades para obter insumos e matérias-primas nacionais e importadas, o que significa que do segmento de produtos industrializados não se poderá esperar uma contribuição significativa para a formação do superávit. Segundo o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, as expectativas de normalização das cadeias produtivas nacionais, inicialmente previstas para este semestre, foram frustradas. Segundo levantamento da CNI, 37% das empresas esperam que a situação se normalize nos próximos três meses, 42% preveem melhora apenas para o segundo semestre e 14% só veem um cenário mais positivo em 2022.
Esse cenário adverso, obviamente, vem não só do impacto provocado na economia pela letargia com que o governo federal se movimentou no combate à epidemia, o que contribuiu decisivamente para o seu agravamento, como de uma ausência quase completa de medidas mais concretas que pudessem reduzir as consequências da falta de competitividade dos produtos industrializados em função do elevado custo-Brasil, que, segundo estudo do Ministério da Economia, consome R$ 1,5 trilhão e representa 22% do Produto Interno Bruto (PIB).
Entre as medidas, aparentemente, deixadas de lado pelo governo, a pretexto de esperar por melhores tempos, estão a tão anunciada reforma tributária, a implementação do Acordo de Facilitação de Comércio e a conclusão do mecanismo de funcionamento do Portal Único de Comércio Exterior, que poderia reduzir sobremaneira a burocracia e seu custo nos produtos industrializados. Para piorar, há ainda uma série de problemas econômicos e políticos enfrentados por países vizinhos, que deverá redundar em baixa nas exportações dos manufaturados brasileiros.
Sem contar os prejuízos trazidos para a diplomacia comercial por um ministro das Relações Exteriores nada diplomático que, em vez de estimular a negociação de acordos com países e blocos representativos e o fortalecimento do Mercosul, contribuiu ainda mais para o isolamento do País, chegando ao ponto de colocar em risco até o relacionamento com a China, hoje o principal parceiro comercial do País.
De positivo, só se deve ressaltar os leilões de concessões de mais de 50 ativos nas áreas de energia elétrica, gás, óleo e logística portuária que o Ministério da Infraestrutura vem promovendo, que deverão resultar em mais de R$ 460 bilhões de investimentos ainda neste ano. De assinalar ainda é que, em 2022, deverão ser privatizadas a Autoridade Portuária de Santos (antiga Codesp), a Companhia Docas do Espírito Santo, a Companhia Docas de São Sebastião e a Autoridade Portuária de Itajaí-SC.
Nesse cenário turvo, portanto, as exportações de commodities deverão continuar a funcionar como o motor de sustentação das exportações brasileiras, dependendo ainda de medidas que venham a ser tomadas pelo presidente norte-americano Joe Biden, que podem impactar esse importante segmento das exportações brasileiras. Mas, seja como for, o que se prevê é que a soja deverá continuar a liderar a lista dos principais produtos de exportação, seguida por petróleo e minério de ferro, que representaram 35,4% do volume total exportado em 2020. Diante disso, o mais provável é que o Brasil venha a ter uma participação até mesmo inferior a 1% no comércio mundial. Tempos difíceis vêm por aí.
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(*) Adelto Gonçalves, jornalista, é assessor de imprensa do Grupo Fiorde (Fiorde Logística Internacional, FTA Transportes e Armazéns e Barter Comércio Exterior). E-mail: fiorde@fiorde.com.br Site: www.fiorde.com.br