À Comissão de Seguimento, Impulso e Verificação da Implementação do Acordo Final (CSIVI)
Aos Representantes do governo nacional e das FARC na CSIVI
Cuba y Noruega, países Garantidores da Mesa de Conversações entre o Governo da República da Colômbia e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia - Exército do Povo [FARC-EP], dirigimos esta carta às Partes para expressar nossa preocupação sobre o estado atual do processo de paz, e fazer um chamado sobre a necessidade de agilizar a implementação do pactuado no Acordo Final.
Não é propósito dos Garantidores fazer uma análise exaustiva de todos os temas que enfrentam dificuldades para sua implementação, senão que recorrer à confiança que construímos com as duas Partes, ao longo destes anos, para fazer um chamamento em favor de identificar com urgência possíveis medidas, no curto prazo, que permitam desenvolver avanços na implementação do Acordo.
Reconhecemos que foram alcançados até o momento importantes avanços. As FARC-EP deixaram suas armas, num processo reconhecido como um dos mais exitosos nessa matéria no mundo. Se estabeleceu como um partido político, tal como se acordou, e adquirem o direito de participar em política. O governo impulsou avanços importantes na agenda legislativa.
Este processo de paz despertou a esperança na comunidade internacional com a finalização de um conflito de mais de 50 anos. O respaldo mundial foi unânime. Neste momento se determina se a implementação seguirá sendo um exemplo para a resolução de outros conflitos do planeta.
O estado atual da implementação do Acordo Final tem desafios importantes. Ambas Partas têm a responsabilidade de reafirmarem a confiança no processo. Consideramos que o novo partido da FARC deve redobrar seus esforços para que os ex-guerrilheiros se mantenham dentro do processo, enquanto o governo tem a responsabilidade de fazer cumprir o pactuado, em especial nos próximos meses, para a implementação dos acordos.
A este propósito nos permitimos recordar a sentença da Corte Constitucional na qual declara exequível o Ato Legislativo 02 de 2017, segundo o qual: "As instituições e autoridades do Estado têm a obrigação de cumprir de boa-fé com o estabelecido no Acordo final. Em consequência, as atuações de todos os órgãos e autoridades do Estado deverão guardar coerência e integralidade com o acordado, preservando os conteúdos, o espírito e os princípios do Acordo Final".
Conhecemos dos resultados do processo que implicou nas modificações de diversas normas legislativas que formam parte dos acordos de Havana, em particular da Jurisdição Especial para a Paz [JEP], um dos eixos da andaimaria de todo o Acordo Final, onde se estabelecem inabilidades a magistrados que tenham estado vinculado à denúncia de violações de direitos humanos ou litigado contra o Estado, ao tempo que exime a terceiros, vinculados ao conflito, de se apresentarem à própria JEP, como se estabelecia o Acordo final.
Ademais, não foram aprovados outros acordos de relevância, como a reforma política, outros referentes aos temas de terra, e inclusive a da outorga das cadeiras a representantes das vítimas, a qual ainda está num litígio jurídico.
Isto cria um novo cenário para essas leis primordiais, que são vitais para a implementação do Acordo, pelo que urgimos ao Governo Nacional a que adote ações que permitam retomar a letra e o espírito dos ditos compromissos, e fazer aprovar as importantes leis que não se alcançaram, ou ficaram pendentes.
Alguns dos desafios atuais na implementação têm a ver com os consideráveis atrasos no âmbito jurídico, com a falta de segurança nas áreas de habitual presença das FARC, e com o lento processo de reincorporação socioeconômica dos ex-combatentes, que recai na responsabilidade do Governo Nacional.
Consideramos positiva a decisão de estender o apoio logístico e econômico aos Espaços Territoriais de Capacitação e Reincorporação [ETCR] até fins de março do próximo ano.
Um grupo de ex-combatentes optou por abandonar os ETCR. Parte deste movimento é resultado de um processo normal de reintegração à sociedade. Pensamos que existe uma grande frustração entre muitos deles, pelo que é necessário adotar urgentes medidas que possam restabelecer neste coletivo a confiança no processo.
Expressamos preocupação pelo incremento dos assassinatos de defensores de direitos humanos, líderes sociais e de ex-combatentes, ou pessoas com vinculação familiar. A falta de segurança é um fator de desestabilização do processo de paz, como o demonstram os recentes fatos de Tumaco e outras regiões do pós conflito, afetados pela luta de controle sobre economias ilegais.
Sugerimos uma priorização dos seguintes temas:
1. Ações de incidência concretas para conseguir o imediato desencarceramento dos membros das FARC que foram credenciados pela OACP e a tomada de decisões urgentes sobre os membros das FARC que ainda não foram objeto de credenciamento por parte da OACP.
2. Esforços redobrados para que o número significativo de membros das FARC, verificados pelo Escritório do Alto Comissionado para a Paz [OACP], que ainda não têm sua carteira de identidade contem o antes possível com seus documentos de identificação.
3. A deterioração da situação de segurança nas áreas abandonadas pelas FARC é preocupante ante o incremento da presença de bandos criminais, pelo que estimulamos a que o Governo tome medidas que fortaleçam a segurança das comunidades e dos ex-combatentes das FARC.
4. O acesso à terra para dar início a pequenos projetos produtivos de impacto imediato é um fator chave. Sugerimos a compra expedita de imóveis identificados pela Agência Nacional de Terra [ANT], identificados como viáveis em termos jurídicos e produtivos para este fim. Se torna essencial que a adjudicação individual ou coletiva desses imóveis garanta uma segurança jurídica suficiente para uma atividade econômica sustentável a longo prazo. É urgente implementar projetos produtivos nos ETCR.
5. Algumas iniciativas da cooperação internacional relativas à reincorporação já iniciaram nos referidos espaços, apesar das restrições relacionadas com o acesso à terra. Estimulamos as Partes, e em particular ao governo, a fazer um esforço coordenado para os países doadores com o fim de acelerar a implementação de tais projetos.
6. A luta contra os cultivos ilícitos é um compromisso comum entre as Partes. Se fizeram avanços importantes, porém a falta de coordenação entre atividades de substituição como reza o acordo, assim como os desafios de um diálogo eficaz com as comunidades, gerou tensões nos territórios, o que ameaça a estabilidade do processo. É de suma importância que as Partes avancem de forma conjunta neste esforço.
Cremos que estas medidas podem ser relevantes também a respeito do debate do informe ao Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a implementação do acordo -quanto ao pactuado no âmbito de segurança e reincorporação de ex-combatentes- que está programado para o dia 10 de janeiro de 2918.
Os Garantidores ressaltam a urgência e necessidade do respaldo da comunidade internacional neste especial momento para o processo de paz da Colômbia, pelo que solicitamos às Partes que desenvolvam ações com o propósito de convocá-lo.
O Acordo Final tem um componente importante de seguimento internacional, nas funções atribuídas aos ex-presidentes Felipe González e José Mujica, como Notáveis dentro do Mecanismo de Verificação da Implementação do Acordo Final, pelo qual como Garantidores estimularemos os esforços que este Mecanismo realize. Estamos remetendo aos Notáveis cópia da presente carta.
Para Cuba e Noruega é uma honra apoiar e acompanhar as Partes no processo de paz e a implementação dos acordos de Havana. Nossa condição de países Garantidores do processo nos obriga a apresentar estas preocupações, com todo respeito, confiança e, antes de tudo, com a intenção sincera de respaldar a implementação do Acordo Final. Saibam que nosso compromisso com a paz em Colômbia seguirá sendo firme, ainda que frente aos desafios futuros por vir.
Pela República de Cuba Sr. Jorge Iván Mora Godoy, Embaixador e Chefe da Equipe de Garantidores
Pelo Reino de Noruega Sra. Anne Heidi Kvalsøren, Enviada Especial e Garantidora para o Processo de Paz em Colômbia
Tradução > Joaquim Lisboa Neto