Presidente Bashar al-Assad da Síria:
"Israel apoia organizações terroristas na Síria" (2/3)
27/1/2015, entrevista ao editor Jonathan Tepperman da revista Foreign Affairs, aqui reproduzida da versão distribuída pela SANA, Síriahttp://sana.sy/en/?p=26278
O que parece ao senhor que seja o melhor meio para um acordo entre todos os diferentes partidos na Síria?
Presidente Assad: É indispensável negociar diretamente com os rebeldes, mas há dois tipos de rebeldes. A maioria deles são da al-Qaeda, que é ISIS e al-Nusra, com outras facções também da al-Qaeda, mas menores. E o que Obama chamou de "oposição moderada", uma fantasia. Não é "oposição": são rebeldes. A maior parte deles uniram-se à al-Qaeda, e alguns deles recentemente uniram-se ao exército. Ao longo da última semana, muitos deles deixaram seus grupos e uniram-se ao exército.
Pergunta 15: Serão antigos desertores que voltaram?
Presidente Assad: Sim. Agora, voltaram para o exército. Dizem que não querem mais guerra. Assim sendo, resta muito pouco daqueles grupos. Afinal, se pode negociar com al-Qaeda e outros? Não estão prontos para negociar, eles têm o plano deles. A reconciliação que nós começamos e o Sr. de Mistura continuará é a solução prática em campo. Esse é o primeiro ponto. Em segundo lugar, é preciso implementar a Resolução n. 2.170 do Conselho de Segurança sobre al-Nusra e ISIS, aprovada há alguns meses, e essa Resolução é muito clara: ela proíbe qualquer apoio militar, financeiro ou logístico àquelas facções. Ok, mas Turquia, Arábia Saudita e Qatar continuam a apoiá-las. Se a Resolução não é implementada, não se pode falar de solução real, porque há obstáculos. É indispensável começar por aí.
Em terceiro lugar, os países ocidentais devem retirar o 'guarda-chuva', que é como dizem vários dos que apoiam a tal "oposição moderada". Eles sabem que protegem principalmente a al-Qaeda, ISIS e Frente al-Nusra.
Pergunta 16: O senhor estaria preparado para algumas medidas antes das conversações, para construir confiança? Por exemplo, troca de prisioneiros ou o fim das barreiras de artilharia, ou a libertação de prisioneiros políticos, para construir confiança no outro lado, de que o senhor está disposto a negociar de boa fé?
Presidente Assad: Essa não é uma relação pessoal. Aqui se trata de mecanismos, de instituições. Na política só se cogita de mecanismos e de instituições. Ninguém precisa confiar pessoalmente em alguém para fazer alguma coisa no mundo político. Se há um mecanismo claro, que todos conheçam, é possível chegar a um resultado. O povo quer resultados. Portanto, a pergunta correta é: qual o mecanismo que poderá ser acionado? Com isso, voltamos necessariamente àquela pergunta anterior: quem são os grupos com quem negociar? O que representam? Que influência têm? De que adiantaria a alguém "construir confiança" com gente que nada representa e não tem influência alguma?
Jornalista: As medidas de que falei teriam o efeito de baixar a temperatura, alguma coisa concreta.
Presidente Assad: Já temos o processo de reconciliação, muito concreto. Gente depôs armas, nós demos anista a quem depôs armas, vivem hoje vida normal. Esse é exemplo muito concreto. Essa também é medida de confiança mútua. Por outro lado, que relação haveria entre aquela 'oposição' e os prisioneiros? Nenhuma relação. Não são prisioneiros daqueles grupos. A questão aí é completamente diferente.
Pergunta 17: O senhor está dizendo que ofereceu anistia aos combatentes?
Presidente Assad: Claro que sim, e várias vezes.
Pergunta 18: Quantos aceitaram? O senhor tem números?
Presidente Assad: Não tenho aqui os números precisos, mas são milhares, milhares, não centenas, de militantes.
Pergunta 19: E o senhor está disposto a dizer a toda a oposição que se depuserem armas estarão seguros?
Presidente Assad: Claro que sim. Já disse exatamente isso, publicamente, num de meus discursos.
Pergunta 20: E como o senhor garantiria a segurança deles? Porque eles têm razões para desconfiar do seu governo.
Presidente Assad: Não há garantia absoluta para nada, mas, no fim, se, digamos, mais de 50% dos casos forem bem-sucedidos, já será um sucesso. Nada é absoluto. O caminho é esse e todos temos de contar com algumas dificuldades, mas as dificuldades não são predominantes.
Pergunta 21: Gostaria de mudar um pouco de assunto. O Hezbollah, a força Quds do Irã e as milícias xiitas treinadas no Irã têm, todos esses, papel significativo na luta contra os rebeldes aqui na Síria. Dado esse envolvimento, o senhor se preocupa com a influência do Irã sobre a Síria? Afinal, o Iraque, e mesmo o Líbano, mostram que quando uma potência militar estrangeira estabelece-se dentro de um país, é muito difícil conseguir que saiam.
Presidente Assad: O Irã é país importante na região, e já era influente antes da crise. A influência do Irã nada tem a ver com a crise, tem a ver com o papel do país, com sua posição política em geral. Quando se fala de influência, há vários fatores que tornam influente um determinado país. No Oriente Médio, nossa região, há uma mesma sociedade, uma mesma ideologia, tantas coisas semelhantes, as mesmas tribos, que cruzam fronteiras. Todos os fatores de influência cruzam fronteiras, por aqui. Se alguém influencia num fator, a influência cruzará fronteiras. Isso é parte de nossa natureza. Não está relacionado ao conflito. Claro, quando há conflito e anarquia, outro país poderá ser mais influente sobre um ou outro país. Se você não tem vontade de ter um país soberano, essa influência prevalecerá. Mas, respondendo sua pergunta: o Irã não tem qualquer ambição na Síria e, como país, a Síria jamais admitirá que qualquer país 'influencie' nossa soberania. Nós não admitiremos em nenhum caso, nem os iranianos desejam tal coisa. Admitimos a cooperação.
Mas se se admite que qualquer país influencie, por que não deixar que os norte-americanos mandem aqui? Porque esse é o problema com os norte-americanos: eles só querem influenciar, sem cooperar.