Marcus Eduardo de Oliveira (*)
Sem retórica ou exagero desmesurado, uma das mais urgentes necessidades em termos de organização da sociedade é a de conciliar desenvolvimento econômico com a promoção do desenvolvimento social, respeitando e resguardando o meio ambiente. A ideia central é procurar compatibilizar as dimensões econômica, social e ambiental; ponto de partida para tentar superar o dilema dicotômico entre "crescer" e "preservar o equilíbrio ecológico"; dito de outra forma, entre "prosperar" (econômica e socialmente) "sem destruir" (ambientalmente).
Na essência, busca-se alcançar e cumprir três princípios básicos que estão referenciados no Relatório Brundtland (publicado em 1987), também conhecido como "Nosso Futuro Comum": desenvolvimento econômico (aspiração imanente da humanidade), proteção ambiental (o cuidado para com a nossa Casa Comum, a Mãe Terra) e equidade social (a inclusão dos excluídos).
Com isso, para superar a dicotomia acima referenciada tem-se um evidente questionamento do ecologismo sobre a racionalidade econômica, tendo em conta que essa última, pelas lentes do pensamento neoclássico - que em geral forma a maneira de pensar dos economistas - pouco se importa com as consequências (degradação do capital natural) ambientais advindas de uma política de intenso estímulo ao crescimento econômico.
Por sinal, alcançar o crescimento a qualquer custo se transformou numa espécie de obsessão da macroeconomia convencional, ignorando com isso os graves distúrbios gerados na biosfera, pondo em risco a base de sustentação da vida, uma vez que, em decorrência da expansão econômica produtiva, os limites biofísicos são completamente desrespeitados. É a atividade econômica dilapidando o capital natural.
Nesse pormenor, cabe citar uma importante passagem que consta do Manual Global de Ecologia (1993): "A produção de alimentos, energia e artigos industrializados está fortemente relacionada à deterioração do sistema que garante a vida na Terra. Entre 1950 e 1986, quando a população do mundo duplicou, o consumo de grãos aumentou 2,6 vezes, o uso de energia cresceu 3,2 vezes, a potência efetiva da economia quadruplicou, e a produção de bens manufaturados cresceu sete vezes. (...) Atualmente, o ser humano consome em alimentos, direta ou indiretamente, cerca de 40% do total de terras cultivadas no mundo".
É exatamente por esse tipo de atuação invasiva (a atividade humana interferindo nos ciclos naturais da Terra) que o crescimento econômico não pode continuar sua "jornada" de deterioração dos recursos naturais e dos ecossistemas.
Continuar estimulando a aceleração do crescimento da atividade produtiva é aumentar substancialmente a perda de diversidade biológica e dos serviços ecossistêmicos. Não há como escapar dessa verdade: aumentar a produção econômica é, dentre tantos outros possíveis estragos ambientais, sinônimo de "jogar" mais poluição na atmosfera.
Os elevados níveis de poluição e contaminação do ar não deixam dúvidas quanto à reposta que esse tipo de prática econômica expansiva oferece ao meio ambiente. No mundo, mais de dois milhões de pessoas morrem a cada ano por "respirar poluição", alojando nos pulmões pequenas partículas (PM 10) geradas pela queima de combustíveis fósseis, além da poluição de ozônio (O3).
Somente na América Latina e no Caribe, a cada ano, morrem aproximadamente 35 mil pessoas devido à contaminação do ar; na Europa, são mais de 150 mil e, no leste da Ásia, mais de 1 milhão de vidas são ceifadas pelo mesmo motivo. É no mínimo vergonhoso presenciar que em pleno século 21 ainda se computam vidas perdidas devido à poluição.
Por isso, o posicionamento ecológico, ao deixar claro que há limites e medidas restritivas para o aumento da produção econômica, deve estar acima do pensamento econômico tradicional, ferindo assim, para desespero dos economistas tradicionais, o dogma atinente ao crescimento econômico, visto e defendido, erroneamente, como fator preponderante para consolidar a prosperidade de uma sociedade.
Com um padrão de consumo avassalador, alimentado pela voracidade consumista de 20% da população mundial (1,4 bilhão de pessoas) residente nas sociedades mais abastadas, o Planeta Terra apresenta sinais de completo esgotamento, evidenciando que não suporta produções expansivas.
Não por acaso, 10% da terra fértil do planeta já se transformou em deserto. Por ano, são perdidos 7 milhões de hectares. Simplesmente, 60% dos principais serviços ecossistêmicos estão deteriorados. De acordo com o documento "Avaliação Ecossistêmica do Milênio 2005", nos últimos 50 anos perdemos 35% dos manguezais, 40% das florestas, 50% das áreas alagadas. Os estoques de peixes estão 80% menores e a área cultivada do planeta cobriu 25% da superfície da Terra. Lamentavelmente, esses dados mostram que o posicionamento econômico encontra-se acima da questão ambiental. Urge reverter isso.
(*) Professor de economia. Mestre em Integração da América Latina (USP).
prof.marcuseduardo@bol.com.br