Brasil e Portugal em águas profundas

Milton Lourenço (*)                  

Quem acompanha a movimentação de carga geral no mundo sabe que a utilização de contêineres só tende a crescer e não há no horizonte nenhum outro meio de armazenagem e transporte para longa distância que possa agregar tanto valor ao produto manufaturado. Esta é uma constatação que pode fazer facilmente quem observa o crescimento do número de encomendas nos estaleiros mundiais por navios que transportam contêineres.

Entre esses navios encomendados, a procura, na maioria, é por embarcações com calado superior a 14 metros, o que significa que cada vez mais o comércio internacional marítimo exigirá portos bem instalados à beira do oceano, com grande profundidade, que permitam a entrada e a saída de navios especializados na movimentação de contêineres e granéis. E, obviamente, com equipamentos que possam facilitar a utilização plena de toda a capacidade dos navios. É o que se chama hoje na linguagem técnica um porto ou terminal multipurpose (contêineres, granéis sólidos, carga geral e ro-ro).

No Brasil, a região de Vitória, no Espírito Santo, é aquela que atende, por sua própria natureza, plenamente às exigências para a criação de um porto de águas profundas, o que constituiria uma grande evolução no transporte marítimo, ampliando as possibilidades de o País aumentar a sua participação no comércio global, hoje limitada a 1% de tudo o que é vendido e comprado no mundo. Sem contar que a localização central desse porto na costa brasileira iria permitir, por meio da intermodalidade, facilidades logísticas para a sua integração com os principais polos econômicos do País.

            Ainda que já existam projetos em Vitória pautados por essa ideia, a verdade é que esse porto carece de instalações que permitam o tráfego de embarcações de maior porte, que, como se sabe, diminuem não só os custos de escala como os de movimentação de carga. 

            Por sua localização, quando se pensa em transporte intercontinental entre a América do Sul e a Europa, não se pode deixar de imaginar que Vitória seria a melhor opção para essa "ponte" imaginária com o porto de Sines, em Portugal, igualmente de águas profundas, com profundidade natural de até 28 metros, já dotado de terminais especializados que permitem o movimento de diferentes tipos de mercadorias.

            Hoje, devido às suas características geofísicas, Sines, localizado a 150 quilômetros de Lisboa, constitui a principal porta de entrada de abastecimento energético de Portugal: gás natural, carvão, petróleo e seus derivados. E está dotado de terminais de granéis líquidos, petroquímico, multipurpose, de gás natural liquefeito e de contêineres (Terminal XXI), que começou a operar em 2004.

            Portanto, está na hora de Brasil e Portugal deixarem de lado a retórica que sempre marcou as relações entre os dois países e partirem para projetos de longo prazo que possam produzir resultados práticos, desenvolvendo uma estratégia mútua de cooperação econômica. E uma "ponte" entre Vitória e Sines seria o melhor exemplo dessa nova era de cooperação sempre anunciada, mas nunca viabilizada.

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(*) Milton Lourenço é presidente da Fiorde Logística Internacional e diretor do Sindicato dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística do Estado de São Paulo (Sindicomis) e da Associação Nacional dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística (ACTC). Site: www.fiorde.com.br E-mail: fiorde@fiorde.com.br

 


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Timothy Bancroft-Hinchey