Racismo e economia mundial

Por: Valdeck Almeida de Jesus [1]

Remonta os primórdios a diferenciação e a discriminação racial. Ao longo dos anos, no processo evolutivo da vida, observou-se que a questão racial sempre provocou discussões na sociedade. O continente africano foi esquecido à própria sorte e o povo de África foi escravizado pela Inglaterra, Portugal, Brasil e outros países por muitos séculos.

Enquanto servia de mola propulsora para a economia, os negros foram utilizados como mão-de-obra gratuita. Quando o capitalismo precisou de consumidores, “libertou-se” os escravos. O comando da produção sempre esteve sob a mão do grupo dominante, brancos, de olhos azuis, cinza etc. A crise econômica, logo, só pode ser atribuída a quem dirige os rumos do mundo globalizado.

O poder no planeta está dividido entre quem tem razão (dinheiro) – e manda; e quem não tem – e obedece... O capital determina as regras do jogo, quem pode ter voz. Historicamente, pessoas de etnia negra ficam em segundo plano. No caso particular da cidade do Salvador, a desigualdade se manifesta nas posições de trabalho subalternas, nos bairros sem infra-estrutura adequada, na falta de acesso a ensino de qualidade etc, como demonstram estudos do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD, publicados em “Quem faz Salvador”, em 2002, pela UFBA.

O preconceito e o racismo são, na verdade, atitudes, modos de ver certas pessoas ou grupos sociais, o que é condenável mas que, apesar dos avanços nas discussões, ainda acontece em pleno século XXI. É importante ressaltar que o racismo e preconceito racial não são coisas equivalentes. O racismo, sem dúvida, é mais amplo em seu sentido do que o preconceito racial. O racismo ocorre quando se atribui a um grupo determinados aspectos negativos em razão de suas características físicas ou culturais. A Sociologia classifica o racismo como uma discriminação ideológica, na qual um grupo considera ter mais qualidades que o outro.

O pronunciamento do presidente Luís Inácio Lula da Silva atribuindo “aos brancos de olhos azuis” a responsabilidade pela crise econômica mundial, dito de forma infeliz, ao invés de reacender o debate sobre a concentração da renda, ficou apenas no plano da discussão sobre a discriminação racial, sem apontar, no entanto, soluções para o desafio de ultrapassar, através de profundas mudanças culturais e sociais, a discriminação racial. A mudança poderá ocorrer mas, para que isso aconteça é fundamental tomarmos consciência das marcas impressas por ela (baixa estima, medo, insegurança, desconfiança, temor) para, de vez, exterminá-la.

Os meios de comunicação social e de massa (rádio, revistas, jornais, propaganda, cinema, teatro, música popular, literatura e, acima de tudo, TV) têm a visão da sociedade dominante e está a seu serviço. Nesse cenário, pode-se perceber que a interpretação que se deu à frase de Lula foi muito mais no sentido de debater o conteúdo racista do que discutir com profundidade o apartheid social existente num mundo de brancos e negros. De um lado, estão os brancos, detentores do comando da economia e, de outro, os negros, trabalhadores e consumidores, em situação de desvantagem. Este viés não fez parte da discussão, nem foi pautado pela mídia.

Luís Inácio Lula da Silva culpou “a gente branca com olhos azuis” pela crise mundial. Há muito que o senhor presidente vem argumentando que as nações pobres e em desenvolvimento têm sido vítimas dos erros cometidos nos países mais ricos, causados pela irresponsabilidade ou a falta de regulamentação nos sistemas bancários mundiais. Sua declaração, além de conduzir o debate sobre as causas sociais e a concentração da renda mundial nas mãos de caucasianos, também serviu de objeto de discussões discriminação racial.

Racismo contra brancos também existe, e a frase de Lula pode encerrar algum ranço de intolerância, mas, vista por outro ângulo, traz à tona o aspecto mais cruel que a discriminação racial encerra: a questão da situação caótica dos negros do Brasil e do mundo.

Os movimentos de defesa das minorias precisam se manifestar, contribuir para uma justa divisão do poder. É necessário e urgente repensar as políticas públicas, trazer os atores sociais discriminados para o centro do debate, incluir na pauta do dia toda forma de racismo e discriminação. Quem detém o poder é quem deve arcar com as consequências da crise econômica. Os excluídos é que não poderão pagar pelo que não devem.



[1] Valdeck Almeida de Jesus é escritor, poeta, estudante de jornalismo e agitador cultural. Autor de “Memorial do Inferno” e patrocinador do “Prêmio Literário Valdeck Almeida de Jesus de Poesia”, projeto que publica poetas do mundo inteiro gratuitamente.


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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
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