Ásia-Pacífico e Ucrânia? Até agora, nada a ver

Há doidos já dizendo que começou a 3ª Guerra Mundial. 'Doidos' no sentido de que essa ideia é impensável, indizível, não mencionável, em tempos termonucleares. Mas as tensões, sim, estão-se sobrepondo, nas relações entre as grandes potências.


É modo de dizer, mas Rússia e China, essa semana, parecem estar na trilha de testarem os limites do poder dos EUA. Por vias diferentes, Rússia e China estão 'cutucando' a única superpotência na região da Ásia-Pacífico. Pode não passar de simples coincidência, mas pode nada ter a ver com coincidência e pode, sim, haver aí pensamento coordenado.

Relatos norte-americanos falam de "aumento significativo" na atividade aérea russa e "muito mais" atividade em águas na região do Pacífico Asiático num "show de força e para recolher inteligência". Especialistas norte-americanos dizem dessas atividades que elas "evocam a Guerra Fria".[1]

Simultaneamente, as tensões espiralaram aos céus no Mar do Sul da China, envolvendo a China, de um lado; e Vietnã e Filipinas, do outro lado. Os especialistas abraçaram os diagnósticos pró um dos lados e já se puseram a 'declarar' que "Pequim está dando grande salto na defesa de suas demandas territoriais, testando a decisão dos vizinhos armados - e também dos EUA" - como se lia no Wall Street Journal.[2]

Mas, se se examina mais de perto, os dois desenvolvimentos parecem nada ter a ver um com o outro, e podem ser eventos de caráter completamente diverso. Seja como for, a China parece ter afastado para longe do Vietnã a sua plataforma de petróleo, e o bate-boca com as Filipinas faz Manila aparecer como tola, por ter detido um barco chinês e metido na cadeia 11 marinheiros por manter cativas algumas tartarugas - de fato, 30, as quais, infelizmente, vieram a falecer.

Em resumo, Pequim parecia ter conseguido 'deter' Hanoi e está requerendo que Manila não seja desnecessariamente provocatória. As declarações dos chineses revelaram que há registro de 171 incidentes com barcos vietnameses, que atropelam navios chineses.

O governo Obama, corretamente, pôs as tensões do Sul da China sob a perspectiva devida, e conclamou os dois lados e exercer a contensão e a moderação. Entrementes, os olhos de Washington estão treinados para acompanhar a próxima visita do Secretário do Tesouro dos EUA, Jacob Lew, a Pequim, amanhã, 3ª-feira, como enviado especial do presidente Barack Obama.

Lew é interlocutor chave para Pequim e arquiteto do relacionamento EUA-China. Já tem audiência marcada com o presidente Xi Jinping. Obviamente, há item gordo nessa agenda.

As tensões que envolvem a Rússia, por sua vez, são diretamente rastreáveis até a crise na Ucrânia. A Rússia tem dados passos calibrados milimetricamente, e distribuído ruídos que deixem claro que suas capacidades militares existem e serão usadas, para evitar, assim, que EUA e OTAN metam os pés pelas mãos. Isso, por um lado.

Ao mesmo tempo, bufar alto e forte, ar quente e ar frio alternadamente, é tática útil para confundir o adversário sobre as reais intenções do bufador. Fato é que na 6ª-feira o presidente Vladimir Putin viajou para a Crimeia  (ato que Washington imediatamente criticou como "provocatório e desnecessário".) 

Mas a visitia de Putin coincide com os 70 anos da libertação da Crimeia, pelo Exército Vermelho, derrotando a ocupação nazista. Não há dúvida alguma de que a visita é riquíssima em simbologia política, em vários sentidos, todos importantes.[3]

E numa direção, em especial, essa visita é muito, muito significativa, a saber: a visita de Putin à Crimeia cai praticamente na véspera do estilo à moda da Crimeia, que está sendo planejado pelos militantes pró-Rússia no leste da Ucrânia, a realizar-se domingo, para decidir sobre o futuro da região.

É altamente provável que o referendo resulte em secessão, com a região optando por separar-se da Ucrânia. O mais provável é que uma vasta fatia de terra, que cobre o leste e o sul da Ucrânia separe-se do país e declara-se nova república da Confederação Russa, sob o nome de 'Novorossiya'.

Em termos táticos, o referendo põe abaixo a eleição presidencial marcada para 25 de maio na Ucrânia, e que é [seria] crucialmente importante para re-estabelecer em Kiev algum governo eleito, representativo, que substitua o deposto presidente Viktor Yanukovich e o presidente 'interino' lá instalado ninguém sabe por quem, mas com o apoio dos EUA.

Mas, diferente do que está fazendo em relação à China, em relação à Rússia o governo Obama fez o mais absoluto silêncio. Nem a volta de circunavegação do 'Urso' em Guam, apitando na costa da Califórnia faria Obama pegar o telefone e ligar para o Kremlin [Moscou já anunciou que não atende telefonemas da Casa Branca, enquanto Kerry andar por lá (NTs)].

Mas, aconteça o que acontecer, no próximo dia 6 de junho, Obama não terá como esconder-se, no Desfile da Vitória, em Paris. Será a primeira excursão de Putin para fora das fronteiras russas, depois da reintegração da Crimeia na Federação Russa. As areias da Normandia terão algum efeito curativo? Quantas e quantas almas circularão por ali, naquelas praias. Rindo, provavelmente, dos 'grandes líderes'.

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10/5/2014, MK Bhadrakumar, Indian Punchline
http://blogs.rediff.com/mkbhadrakumar/2014/05/10/asia-pacific-ukraine-unrelated-so-far-at-least/


[1] http://www.reuters.com/article/2014/05/06/us-usa-russia-asiapac-idUSBREA4501M20140506

[2] http://goo.gl/4vC93K  

[3] http://www.nytimes.com/2014/05/10/world/europe/russia-celebrates-victory-day.html?_r=1

 

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
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