A pseudo interatividade na mídia global

Muito tem se falado sobre as novas tecnologias como formas modernas de comunicação, sendo notável o interesse de grandes empresas e governos em adotar ferramentas que possibilitam uma maior interatividade entre o público e os emissores de informação. Sem qualquer intenção de menosprezar os bons usos dessas tecnologias, algumas questões estão passando ao largo da "modernização" dos processos de comunicação. Até que ponto estes elementos de interatividade representam, de fato, uma maior participação do público?

Essas formas de "democratização" da comunicação são extremamente perigosas, porque passam a nítida impressão de que há uma intervenção direta do receptor. Que, no entanto, é apenas uma meia-verdade e, em alguns casos, uma completa farsa.

Primeiro, porque quem vai escolher com o que os receptores vão interagir continua a ser os mesmos emissores. A produção continua centralizada nas mãos de poucos, o que por si só delimita o campo de ação do cidadão, que se resume a escolher opções pré-estabelecidas pelos próprios emissores. Em outras palavras, quando a escolha for feita pelo receptor, uma escolha, de fato, já foi feita anteriormente.

Segundo, porque uma suposta participação mais efetiva na escolha de conteúdo e linguagem pode não significar, em absoluto, um avanço real na tomada de decisão por parte do público.

A interatividade é aqui entendida como uma interação flexível, onde relações recíprocas entre os interlocutores — próprias de situações de diálogo — são possíveis a partir da tecnologia eletrônica ou digital[1]. Isso significa superar visões de um modelo redutor marcado pela unidirecionalidade, que coloca o emissor como propositor de mensagens fechadas e o receptor passivo diante delas.

Significa transformar e redimensionar o espaço da recepção como espaço de interação e transformação, modificar os papéis de emissores e receptores para uma dinâmica relacional, de co-autores/criadores.

Além disso, é sempre bom lembrar que uma das maiores armas de qualquer governo ou empresa na sociedade pós-moderna — a publicidade — é extremamente dependente do conhecimento que possui do público, o que torna algumas ferramentas interativas em pesquisas de mercado eficientes que, por sua vez, ajudam ainda mais o mercado a entender e conquistar o público. O problema desse uso é que, ao tratar seres humanos como meros consumidores e a informação como mercadoria, a sociedade está direcionando automaticamente as novas tecnologias para quem pode pagar mais, tornando-se assim a interatividade mais uma ferramenta de concentração e exclusão social.

Num país que não vê, por exemplo, rádios e tevês como concessões públicas — e sim como meras empresas privadas da livre iniciativa e sem qualquer compromisso com a Constituição —, dificilmente as grandes e médias emissoras se preocuparão em colocar em pauta debates sobre o direito real dos cidadãos brasileiros, porque isso implicaria cortar na própria carne. Implicaria em perder poder.

As iniciativas que promovem a comunicação pró-ativa, com receptor e emissor interagindo e participando, dentro do possível, de todo o processo, devem ser vistas com bons olhos. No entanto, há de estar atento às propostas que visam dar apenas uma falsa impressão de interatividade, quando na verdade continuam a manter a velha lógica do espectador passivo e apático. Em última análise, esses tipos de "avanços" contribuem enormemente para esconder dos cidadãos o real poder que o povo tem sobre os processos de comunicação. _____________________________ [1] LIMA, V. Mídia. Teoria e Política. SP. Fundação Perseu Abramo, 2001 _____________________________ Raquel de Almeida Moraes é formada em Pedagogia pela Unicamp (1985), com Mestrado (1991) e Doutorado (1996) em Filosofia e História da Educação, também pela Unicamp. Além de pesquisadora sobre Informática e Educação, atua desde 1990 na docência em informática educativa e educação a distância. É editora de Educação da Revista Consciência.Net (www.consciencia.net). Clique aqui e saiba mais sobre a autora.

Gustavo Barreto é editor da revista Consciência.Net (www.consciencia.net), colaborador do Núcleo Piratininga de Comunicação (www.piratininga.org.br), estudante de Comunicação Social da UFRJ e bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Inciação Científica (PIBIC) pela ECO/UFRJ. Contato por e-mail: [email protected]

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