Bush humilha-se na ONU

George W. Bush resolveu ignorar a opinião pública mundial e desrespeitar a Carta da ONU, lançando um ataque ilegal contra o Iraque sem consultar o Conselho de Segurança da ONU. Foi avisado acerca das consequências mas irresponsavelmente, decidiu prosseguir, utilizando evidências falsas e documentos forjados para apresentar uma justificação para a guerra. Agora que seu governo entende a dimensão do erro que cometeu, Presidente Bush vai à comunidade internacional com discurso de coitadinho com o chapéu na mão, chorando por ajuda.

Se o Presidente dos Estados Unidos da América realmente acredita no que disse ontem na Assembleia Geral da ONU, foi uma demonstração clara que administração de Bush está desligada da realidade, apanhada numa nuvem jingoísta e farisaica e um frenesim egoísta de promover os interesses dos grupos de pressão todo-poderosos que rodeiam a Casa Branca e o Pentágono.

Depois de ter desrespeitado a ONU após o falhanço duma política diplomática que utilizou pressões e ameaças em vez de debate e diálogo, George Bush deu ordem de lançar uma guerra contra o Iraque sem qualquer justificação legal em qualquer fórum de lei internacional. Na sua arrogância cega, o seu governo apercebeu-se tarde demais que a guerra começaria com a paz, e esta paz está custando muito mais vidas, muito mais dinheiro e muito mais recursos do que foi planeado.

De facto, esta guerra foi pessimamente mal planeada. Se George Bush tivesse escutado a comunidade internacional, habilmente representado por Moscou, Brasília, Paris, Berlim e Pequim, entre outros, não precisaria de inverter a marcha e pedir à organização que ele desrespeitou um plano de acção com base de apoio mais larga, que é precisamente aquilo que a ONU tinha proposto antes do ataque e que George Bush tinha recusado.

A acção com base larga de apoio proposta pela ONU teria sido devidamente planeada depois de ter dado às equipas de UNMOVIC e a AIEA um prazo de tempo razoável para terminar as suas inspecções, as quais já estavam provando o que todos sabem agora: que o governo de Saddam Hussein não tinha um programa activo de desenvolver armas nucleares, que não tinha armas de destruição em massa e não havia qualquer ligação entre Saddam Hussein e Al Qaeda, nem tinha Bagdade nada a ver com o ataque contra as Torres Gêmeas no 11 de Setembro, como o próprio Bush agora admite.

Como George Bush pudesse começar seu discurso referindo este evento e depois tentar ganhar a simpatia da ONU por mencionar a morte de Sérgio Vieira de Mello, é prova de quão manipulador, quão insensível e quão superficial é este governo em Washington, como foi demonstrado repetitivamente. Para começar, Saddam Hussein e Osama bin Laden viviam em mundos diferentes quanto à ideologia islâmica e em segundo lugar, Sérgio Vieira de Mello estaria vivo hoje se os EUA não tivessem decidido unilateralmente atacar o Iraque fora da autoridade da ONU, pois não teria havido qualquer ataque contra seus escritórios e Sérgio Vieira de Mello não teria estado no Iraque.

No seu discurso na Assembleia Geral ontem, em que mencionou muitas vezes o Afeganistão na mesma frase em que se referiu ao Iraque, George Bush fez uma tentativa infantil e ingénua para marcar pontos, insinuando mais uma vez que o governo Ba’ath e Al Qaeda eram uma entidade única e igual. Não são e nunca foram.

Enquanto se queixava da falta de investimento do governo Ba’ath nos serviços públicos, George Bush se esqueceu de referir às sanções impostas contra este governo durante mais do que uma década, se esqueceu de referir à política de pirataria efectuada pela aviação norte-americana e britânica contra alvos no Iraque também durante mais do que dez anos e convenientemente, se esqueceu de mencionar a política de atacar os campos de cultivo no Iraque com aviação militar, para reduzir a colheita e privar os cidadãos de comida.

No seu apelo às nações de boa vontade apoiarem os Estados Unidos nos seus esforços de reconstruir o Iraque, ouvimos mais uma vez aqueles tons que seguem a linha “Se não estiver connosco, é contra nós”, um mundinho aconchegado de valores a preto-e-branco e ao cowboy, de fácil consumo e rápida digestão. Neste apelo, temos uma admissão clara do governo de Bush que não quer, nem pode, continuar esta campanha no Iraque com a meia-duzia de nações que a apoia e com a módica quantia de recursos que providenciam, excepto o Reino Unido, que cometeu cerca de uma quarta parte do seu exército no terreno.

Neste apelo para alargar a base de acção e por isso o financiamento, Washington está admitindo que está a gastar dinheiro que não tem e está cometendo muito mais recursos do que esperava. É um grito de socorro. Washington investiu demais no Iraque para de repente se retirar ou permitir qualquer distribuição mais igualitária na cadeia de comando.

Como qualquer criminoso comum, o governo de Bush deveria, por lógica, ser esforçado a encarar as consequências das suas acções. Porém, por assim fazer, a comunidade internacional enfrentará a ira de Washington. Contratos de financiamento serão misteriosamente revistos, suspender-se-ão programas de apoio e acordos científicos e culturais serão parados.

A questão que se põe é se o Washington tem dinheiro suficiente para comprar uma passagem para sair do pesadelo em que teimou em meter-se e se a comunidade internacional tem os princípios e os valores éticos para tomar uma posição firme sobre o que é aceitável ou não, para definir sem qualquer qualificação onde se deverá traçar a linha entre o bem e o mal – e enviar uma mensagem clara ao governo de Bush: quem pela espada vive, pela espada deve estar preparado a morrer.

Timothy BANCROFT-HINCHEY PRAVDA.Ru

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