Da Despolitização à Formação de Partidos

Os ministros russos foram autorizados a ocupar postos dirigentes nos partidos políticos, enquanto as eleições para a Duma de Estado (câmara baixa do Parlamento) serão efectuadas em breve só pelo sistema proporcional, ou seja com base em listas partidárias. Que significam estas inovações? No mínimo, tornar-se-á claro qual o partido que se encontra realmente no poder na Rússia.

A Rússia é uma república presidencial e o papel do presidente tem muito mais peso do que as posições de todos os partidos políticos em conjunto.

Este princípio tem os seus prós - a famosa "estabilidade" de Putin, que veio substituir a década crítica de Ieltsin, deve-se em muito ao facto de o jovem e enérgico presidente, ao chegar ao Kremlin ter começado realizar plenamente as suas competências presidenciais.

Contudo, este sistema político tem também os seus contras - uma única pessoa (e nem sempre será Putin) concentra uma responsabilidade desmedida por tudo que ocorre no país, o que torna menos seguros os fundamentos da actual estabilidade.

A situação na Rússia tem a sua própria especificidade e raízes históricas. No fim dos anos 80, no país começou uma "despolitização" total. As organizações do Partido Comunista da União Soviética, único partido no poder, foram expulsas das empresas, saneadas dos organismos públicos e, finalmente, proibidas. Tratou-se de uma reacção a dezenas de anos de governo do PCUS que desempenhava, segundo a Constituição de então, o papel de única força "dirigente e orientadora" da sociedade.

Em resultado, os numerosos partidos políticos que surgiram nos anos 90 na Rússia transformaram-se em organizações de entusiastas relativamente pequenas. Por inércia da luta contra o PCUS, os membros do governo foram proibidos de fazer parte de quaisquer partidos. Nos organismos públicos era considerado de mau tom discutir problemas políticos.

A alergia social em relação aos partidos políticos na Rússia manifesta-se até hoje. Embora os membros do governo tivessem sido recentemente autorizados a pertencer a partidos, a maioria dos cidadãos evita participar na vida partidária - o maior partido russo, o "Rússia Unida", não ultrapassa pelo número de membros 5% dos militantes que tinha o PCUS, que contava com 20 milhões de pessoas nas suas fileiras. Os comunistas, o segundo maior partido, não podem mesmo gabar-se de tal indicador, enquanto os restantes partidos são ainda muito mais pequenos.

O país é dirigido por um presidente sem partido. Os principais funcionários do seu Gabinete e a maioria dos membros do Governo tampouco fazem parte de qualquer partido. Como se considera, os ministros são profissionais pragmáticos que sem quaisquer programas de partido conhecem como se deve trabalhar eficazmente para o bem do país.

Porém, tal atitude nem sempre funciona, porque o pragmatismo é apenas uma ideologia específica que não exclui divergências de princípio e até conflitos entre os seus partidários. Diferentemente de um partido, em que todos se entendem bem, o pragmatismo não tem nem estatutos, nem programa, nem, no fundo, quaisquer objectivos concretos. Seria pelo menos estranho falar da sua responsabilidade perante a sociedade, os eleitores e os superiores. O pragmatismo é apenas um fantasma e não um partido ou uma organização.

A situação tornou-se crítica e era necessário corrigi-la. O primeiro passo foi dado pela Duma de Estado, que aprovou uma emenda à lei constitucional sobre o governo, permitindo aos ministros desempenhar cargos dirigentes nos partidos políticos. Em breve, como se espera, será aplicada outra inovação e as eleições para a Duma de Estado serão efectuadas só segundo o sistema proporcional e não pelo esquema misto proporcional-maioritário como agora. Tal significa que nas eleições participarão pessoas que representem um determinado partido, programa, ideologia.

Tal, no intuito dos autores da reforma, elevará o interesse dos cidadãos em relação aos partidos e à vida partidária, ajudará a superar a velha alergia em relação à política e, além disso, tornará legítima a força política que assuma a responsabilidade por tudo o que ocorre no país.

Yuri Filippov observador político RIA "Novosti"

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