Retirada das bases militares russas da Geórgia

As declarações dos dirigentes dos ministérios dos Negócios Estrangeiros da Rússia e da Geórgia sobre o início da retirada das bases militares russas da Geórgia e a conclusão deste processo até 1 de Janeiro de 2008 só aparentemente parecem sensacionais.

Na realidade, da parte russa este facto reflecte a tendência para rever a estratégia da Rússia relativamente ao espaço pós-soviético. E tais alterações constituem uma continuação lógica da "compressão das ambições geopolíticas da Rússia" - aliás, um processo que durou durante todo o período pós-soviético e no início do primeiro mandato presidencial de Vladimir Putin culminou com a retirada das bases estratégicas de Cuba e do Vietname. Naquela altura, esta retirada veio legitimar uma realidade que já existia: diferentemente da superpotência que era a União Soviética, a Federação Russa, embora continuando a ser potência mundial, já não podia fazer frente à expansão global dos Estados Unidos e, subsequentemente, teve que reduzir substancialmente a sua actividade política externa e circunscrevê-las ao território da Comunidade de Estados Independentes (CEI).

Naquele mesmo período, embora muito tardiamente, a Rússia começou a implementar a política estratégica de recuperação das relações económicas com os países vizinhos da CEI, colocando como objectivo a intensificação dos processos de integração com a Comunidade sob a liderança russa. Esta tendência manifestou-se em relações económicas especiais com a Bielorrússia e nas facilidades concedidas a todos os países-membros do Espaço Económico Comum (EEC), nomeadamente a cobrança do IVA no país de destino. Contudo, os processos políticos internos que se desenvolveram em alguns países da Comunidade levaram a mudanças nos respectivos governos, com os quais Moscovo apostava na realização dos seus programas integracionistas. Mais ainda, a diplomacia russa passou a ter mais cautela mesmo em relação às elites formais ou realmente amigáveis nos países vizinhos. A Rússia deixou de formar elites amigáveis tanto por causa da falta da estratégia política externa como também devido à imperfeição do sistema de apoio político e financeiro.

Face à mudança de orientação, o que resta à Rússia é só apostar numa política económica externa diferenciada em relação aos países vizinhos e ao espaço pós-soviético em geral, livrando-se progressivamente da herança anterior que impede a realização de uma política externa mais equilibrada e actualizada. Neste sentido, as relações com a Geórgia poderiam constituir o início de novos vectores da política externa da Rússia no espaço pós-soviético. Com efeito, do ponto de vista estratégico e militar, as bases russas em Batumi e Akhalkalake nada proporcionam à Rússia, a não ser um sinal formal da sua presença militar na região da Transcaucásia. Evidentemente, estas bases poderiam constituir parte do sistema de apoio da presença militar russa, importante desde o ponto de vista da política externa, na Arménia, mas estando situadas no território georgiano, presentemente tão hostil, não serão capazes de desempenhar tal missão.

Os acordos com a Geórgia sobre o estatuto destas bases até ao período de retirada e sobretudo depois da retirada poderiam ser para a Rússia uma boa oportunidade para reivindicar o estabelecimento de relações económicas mutuamente vantajosas de facto com este país, que na realidade é financiado pela Rússia através de preços bonificados dos produtos energéticos russos, sensivelmente inferiores aos que vigoram nos mercados mundiais. É óbvio que, sendo a questão colocada assim a Geórgia pode chantagear a Rússia, prometendo impor um bloqueio energético e comercial à Arménia, que não tem acesso geográfico directo à Rússia. Contudo, neste caso a parte georgiana iria pôr a nu toda a sua política marcadamente anti-russa, ao conferir a um problema puramente económico um acentuado cariz político.

Se a liderança russa fosse consequente - e o que é essencial, persistente - no problema em questão, seria possível criar na Geórgia uma situação que confirmaria a todos uma verdade irrefutável: sem a Rússia este país não tem condições para um desenvolvimento normal e qualquer governo que seja jamais permanecerá no poder se não mantiver boas relações com o grande e poderoso país vizinho. Tanto mais que o regime de Mikhail Saakachvili aos poucos começa a enfraquecer.

Anatoli Beliaiev dirigente do Departamento Analítico do Centro de Conjuntura Política da Federação Russa c. RIA "Novosti"

Subscrever Pravda Telegram channel, Facebook, Twitter

Author`s name Pravda.Ru Jornal
X