Iraque: Irã leva EUA às cordas

A diplomacia iraniana está trocando de marcha, no que tenha a ver com a situação no Iraque. O vice-ministro de Relações Exteriores Hossein Amir-Abdollahian partiu em viagem[1] pelos Emirados Árabes Unidos, Kuwait e Omã. Antes, no início da semana, o presidente Hassan Rouhani já conversara separadamente com o Emir do Qatar. 


Semana passada, Abdollahian esteve em Moscou, viagem que ele já descreveu[2] como bem-sucedida, dado que forjou "uma posição comum e coordenada" entre os dois países com vistas a combater contra o terrorismo no Iraque e ajudar Bagdá a proteger a "unidade, independência e integridade territorial."

Teerã está deliberadamente deixando de lado a Arábia Saudita, que está sendo vista como principal protagonista no Iraque e Síria apoiando o Estado Islâmico do Iraque e Levante [ISIL]. E adotou a medida bem pouco usual de distribuir uma 'declaração',[3] no domingo, para esclarecer, acima de qualquer dúvida, que o ministro de Relações Exteriores Mohammad Zarif absolutamente não visitara nem visitaria a Arábia Saudita e que boatos nessa direção não têm qualquer fundamento.

Essa declaração equivale a 'empurrar para o lado', diplomaticamente, a Arábia Saudita, ao mesmo tempo em que o Irã 'declara' que nada há a discutir com a Arábia Saudita sobre o Iraque, enquanto os sauditas mantiverem a estratégia pervertida de desestabilizar o Iraque e forçar 'mudança de regime'. A viagem regional de Abdollahian tem, muito provavelmente, o objetivo de chamar a atenção para o perigo de um revide a partir do Iraque, que teria impacto negativo sobre a segurança e a estabilidade regional.

Para garantir, ele levará aos três países, que são aliados chaves dos EUA, a conclusão a que Teerã chegou,[4] de que Washington está jogando jogo duplo no Iraque, fugindo como a raposa e caçando como a cachorrada. As mais recentes notícias de Teerã sugerem que o Irã concluiu definitivamente, a partir de informação de inteligência confiável, que o governo Obama faz-se de Janus bifronte e usa duas caras na crise do Iraque, buscando meios para uma 'reestreia' militar e política dentro do país para tentar proteger seus interesses econômicos.

Importante: o comandante da Força Basij Mohammed Reza Naqdi alertou, em tom grave, sobre a "formação de uma nova frente de resistência", por Teerã, contra os EUA e seus aliados regionais. É o mais forte sinal de alerta que o Irã envia a Washington, até agora. Naqdi, figura muito poderosa no establishment de segurança no Irã, reporta-se diretamente ao supremo líder aiatolá Ali Khamenei. A dura mensagem a Obama é para que ele ponha fim imediatamente à empreitada do ISIL; ou aguente as consequências da 'resistência'.

Ao mesmo tempo, Abdollahian novamente refutou os boatos de que o Irã teria enviado tropas para o Iraque.[5] Claro, são boatos gerados também como propaganda distribuída por empresas de jornalismo mantidas com dinheiro do governo dos EUA, como a Radio Free Europe/Radio Liberty.[6]  Evidentemente, Teerã sabe que esses boatos visam em primeiro lugar a manter a escalada constante, incremental,  da presença militar dos EUA no Iraque ["EUA negam superdistensão da guerra ("mission creep"), e não param de superdistender a guerra".[7]

Não surpreendentemente, a névoa da guerra vai se tornando mais espessa. Apesar da névoa, não param de surgir inúmeras sempre novas questões incômodas. Por um lado, Bagdá questionou a autenticidade[8] de um vídeo recentemente distribuído,[9] em que se vê o chefe do ISIL Abu Bakr Al-Baghdadi. Se o vídeo é falso, a grande pergunta é: quem anda pelo mundo a inflar a imagem do ISIL, fazendo de tudo para atrair na direção dele as atenções planetárias? Dito em outras palavras: quem tem mais a ganhar, com espalhar mais terror e mais medo?

Interpretação completamente nova surgiu hoje, segundo a qual o atual tumulto no Iraque foi golpe cuidadosamente urdido[10] por EUA e seus aliados regionais, especialmente a Turquia - que mantém silêncio ensurdecedor sobre os desenvolvimentos no Iraque. Pergunta-se: o sequestro de turcos no consulado deles em Mosul, ostensivamente pelo ISIL, pode ser golpe de publicidade, para divulgação global, para apresentar Ancara como vítima, não com mentora do grupo terrorista? E não há resposta fácil.

O Daily Mail britânico publicou matéria exclusiva[11] sobre a estranha decisão tomada pelo governo Obama, de libertar Al-Baghdadi, há cinco anos, da prisão onde estava. Gesto absolutamente excepcional, tratando-se de suspeito de comandar a al-Qaeda. Hmmm... A névoa da guerra só se adensa!

Novamente, recentes relatos iranianos[12] selecionados pela imprensa oficial do governo russo sugerem que os EUA podem estar partilhando inteligência importante com o ISIL, que, adiante teriam utilidade em campo, no front operacional. Sendo isso verdade, o envio pelo governo Obama de algumas centenas de 'conselheiros militares', e o deslocamento de brigadas de drones para os céus do Iraque, assumem significado absolutamente novo.

Ainda que se deixe de lado tudo isso, fato é que o governo Obama e os aliados regionais dos EUA - Arábia Saudita e Ancara, em especial - já não podem confiar que o 'projeto' ISIL tenha alguma serventia para derrubar do poder o primeiro-ministro Nouri Al-Maliki. A melhor aposta deles era isolar Maliki dentro do próprio campo xiita. Mas as coisas não estão andando nessa direção.

Outro duro golpe contra Washington, Riad e Ancara: Al-Sistani, grande aiatolá do Iraque - e clérigo imensamente respeitado e reverenciado - tomou a providência excepcional de esclarecer[13] seus pronunciamentos sobre o impasse político em Bagdá.  O grande aiatolá distribuiu declaração oficial em que diz que jamais manifestou qualquer oposição a que Maliki se mantivesse como primeiro-ministro (em direção diametralmente oposta ao que a imprensa-empresa saudita e dos EUA publicaram que seria a posição de Al-Sistani).

Fato é que Maliki está bem vivo e ativo e parecia realmente empenhado, quando disse que talvez se interesse por concorrer ao terceiro mandato como primeiro-ministro.[14] Não há dúvidas: Maliki está na liça. ******

 


[1] http://www.presstv.ir/detail/2014/07/07/370213/iran-official-to-talk-iraq-in-pg-tour/

[2] http://www.presstv.ir/detail/2014/07/06/370157/iran-russia-agree-to-join-forces-in-iraq/

[3] http://english.farsnews.com/print.aspx?nn=13930415001102

[4] http://english.farsnews.com/print.aspx?nn=13930415001099

[5] http://english.farsnews.com/print.aspx?nn=13930415001170

[6] http://www.rferl.org/articleprintview/25445278.html

[7] http://news.antiwar.com/2014/07/04/us-continues-iraq-buildup-with-combat-troops-helicopters/

[8] http://in.reuters.com/article/2014/07/05/iraq-security-baghdadi-government-idINKBN0FA0MO20140705

[9] http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2014/07/primeira-aparicao-publica-e-sermao-de.html

[10] http://nsnbc.me/2014/07/05/u-s-military-advisers-in-iraq-spies-for-isis-and-kurdish-militants-analyst/

[11] http://www.dailymail.co.uk/news/article-2657231/Revealed-Obama-RELEASED-warlord-head-ISIS-extremist-army-five-years-ago.html

[12] http://voiceofrussia.com/news/2014_07_05/US-supply-militants-in-Iraq-with-software-Iranian-TV-4427/

[13] http://english.farsnews.com/print.aspx?nn=13930416000813

[14] https://www.todayszaman.com/news-352186-iraqs-maliki-signals-his-intent-to-stay-in-job.html

7/7/2014, M K Bhadrakumar, Indian Punchline
http://blogs.rediff.com/mkbhadrakumar/2014/07/07/iran-corners-us-over-isil-project-in-iraq/

 

 

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