Um pouco de redundância, por favor!

Clóvis Campêlo

Somos seres miméticos. Aprendemos a viver assim. Repetimos gestos e ideias à exaustão. Do beabá inicial aos discursos filosóficos transcendentais, somos repetitivos e raciocinamos em bloco. A redundância nos redime.

Por isso, as atitudes diferenciadas tendem a ser punidas e eliminadas. Constituem-se em ameaça à continuidade das coisas. Até no jargão futebolístico, existe a máxima de que em time que está ganhando não se mexe. Basta repetir-se e pronto, o sucesso está garantido.

Exercitar o senso crítico, portanto, não é nada fácil no mar de mesmices em que vivemos. Afinal, para que nadar contra a corrente se o final sempre é o mesmo? Só os mais inquietos, patologicamente inquietos, aventuram-se a tanto.

No entanto, se a mesmice cansa e bitola, o excesso de novas informações também pode travar os 10% utilizados pela nossa cabeça animal. A novidade deve sempre ser servida em doses homeopáticas, haja visto que o excesso deixa de ser remédio e transforma-se em veneno. E, se não nos matar, vai jogar-nos no isolamento temporal, do qual, em alguns casos, só se consegue sair depois da morte. Para quem não acredita em reencarnações, aliás, o pós morte não serve para nada. Finda a vida, findo o mundo, finda as palavras. O morto não pensa, não fala, não discute mais e nem externa ideias ou ideais. O morto apenas se decompõe.

Aos vivos, portanto, cabe a continuidade e a comunicatividade do mundo. E tome redundâncias! Exercitar o senso crítico em relação a si mesmo e aos cosmos, no mundo dos vivos, não é nada fácil, embora extremamente necessário na maioria das vezes. Pensamos, logo existimos! Questionamos, logo resistimos! Até quando, porém, acho que nem mesmo Deus sabe!

Como, apesar de só utilizar 10% da sua cabeça animal, a espécie humana conseguiu evoluir e sofisticar o ato de raciocinar, vive a contradição de ter de alimentar a redundância para sobreviver nos níveis superiores da linguagem e de ter que exercitar novas formas de informação para transgredir e evoluir. Assim caminha e sempre caminhou a humanidade ao longo do tempo.

O homem sábio, portanto, tenta exercitar o equilíbrio na vida, na linguagem e nas informações. Hora tende para um determinado lado, hora para o outro, mas sempre com a consciência de que tenta evoluir e ser entendido ao mesmo tempo. De nada adianta o hermetismo ou o ludismo das invenções mirabolantes se o resultado final for o desentendimento.

Os inventores e artistas que tendem por esse caminho correm o risco de morrerem incompreendidos e só serem decifrados e decodificados pelas gerações futuras e posteriores, quando a contravenção se transformar em regra e consolidar-se como matéria assimilada e incorporada ao modo de vida dos nossos sucessores.

Aos afobados futuristas, portanto, eu peço um pouco de redundância, por favor!

 

Recife, 2014

 

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