Mísseis em Cuba e Mísseis na Ucrânia

Semelhanças e diferenças: Mísseis em Cuba e Mísseis na Ucrânia. William Polk, renomado analista norte-americano, que foi reitor de Harvard e consultor de política exterior, enviou-me há alguns dias seu mais recente ensaio sobre as relações EUA-Rússia (depois publicado em Consortiumnews).

25/2/2015, MK Bhadrakumar, Indian Punchline

http://blogs.rediff.com/mkbhadrakumar/2015/02/25/cuban-missile-crisis-and-ukraine-standoff/

Acho que estamos mais ou menos no mesmo ponto das nossas reflexões, Polk e eu, sobre a crise na Ucrânia. Polk, é claro, tem vasta experiência sobre questões russo-norte-americanas. Foi conselheiro presidencial, com papel considerável durante a presidência de John Kennedy, na redução das tensões da crise dos mísseis cubanos.

Tudo isso faz de seu mais recente ensaio, altamente pertinente, objeto de leitura detalhada - quando extrai lições da crise de 1962 e a partir delas oferece um roteiro para superar-se também o impasse EUA-Rússia na questão da Ucrânia. De fato, sim, Polk traça paralelos muito claros entre o arriscadíssimo impasse de então (entre EUA e a URSS) e o de agora, os quais, para ele, teriam mais ou menos as mesmas 'linhas vermelhas'. No resumo que Polk oferece,


- "É praticamente certo que nem o governo dos EUA nem o governo russo aceitariam sem responder qualquer tipo de ataque, ainda que ataque limitado."

- "Não há motivo para crer que o governo russo, se estiver na iminência de ser derrotado por armas convencionais, conseguirá evitar o recurso a armas nucleares."

- "Todas as tentativas para limitar a escalada provavelmente fracassarão e, ao fracassarem, levarão a guerra total."

- "E as consequências previsíveis de uma guerra nuclear são catástrofe inimaginável."


Polk indica que um possível acordo na Ucrânia deva ser baseado nos seguintes elementos:


- Rússia não aceitará que a Ucrânia seja empurrada para dentro da OTAN;

- Rússia tem interesses legítimos na Ucrânia;

- A intromissão dos EUA no que são assuntos essencialmente russo-ucranianos é injustificável e tem de ter fim imediatamente.


A parte triste é que está longe de garantido que o presidente Barack Obama esteja aberto para ouvir conselho tão altamente sensível. Posto em fórmula simples, Obama é incapaz de livrar-se do triunfalismo que marcou as políticas de Washington para a Rússia pós-soviética desde o início dos anos 1990s.

Fato é que um dos principais ideólogos que aparentemente orienta o pensamento de Obama sobre a Rússia, Robert Kagan, da Brookings, escreveu há apenas uma semana, que


"Apesar de toda a conversa fiada sobre o declínio dos EUA, o que conta é que é no campo militar que a superioridade norte-americana continua a aparece mais claramente. Mesmo nos quintais de outras grandes potências, os EUA ainda conservam a capacidade, além de aliados poderosos, para conter quaisquer desafios contra a ordem da segurança. Mas sem a disposição dos EUA para usar o poder militar para estabelecer o equilíbrio em regiões distantes do mundo, todo o sistema desabará sobre a incontida concorrência militar de outras potências militares regionais."


Na ordem Kaganista 'liberal' do mundo, admite-se que Rússia, China ou qualquer potência regional entrem em competição econômica contra os EUA, mas "competição no plano da segurança é outra coisa", porque "não há equilíbrio estável de poder na Europa ou na Ásia, sem os EUA."

Polk dificilmente encontrará ouvidos racionais que lhe deem atenção em meio ao triunfalismo e sob a mentalidade de Guerra Fria que ainda prevalecem em Washington. Mas, como escrevi há algum tempo com admiração (vide Obama's 'moving finger' writes Irã ties), e por surpreendente que seja, no que tenha a ver com o engajamento com o Irã, Obama tem sido o realismo em pessoa, perfeito na avaliação dos limites do poder dos EUA. Assim sendo... como é possível que a mesma mente capaz de reflexão tão ponderada, converta-se em exatamente o contrário de qualquer ponderação refletida e equilibrada, se o assunto é a Rússia?

Para mim, a diferença crucial está noutro ponto: a Ucrânia nada tem a ver com reagir contra alguma "agressão" russa, como Obama repete incansavelmente. Na realidade, a Ucrânia tem muito mais a ver com os EUA reafirmarem a própria liderança transatlântica, nesses tempos de pós-Guerra Fria. Não é o caso no que tenha a ver com o Irã, porque aí Obama conta com o apoio da Europa. - E com certeza absoluta não foi o caso na crise dos mísseis em Cuba em 1962, em plena era da Guerra Fria. ******

 

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