De que estavam à espera?!

Numa recente emissão da "Quadratura do Círculo", o politólogo Pacheco Pereira, habitual comentador de atualidade política naquele programa da SIC Notícias, a propósito das consequências de um incumprimento do Memorando da Troika, referiu a seguinte sentença de Passos Coelho: "automaticamente, vamos passar o poder político para as instituições centrais em detrimento das instituições representativas nacionais". Aquele comentador, que por sinal é do mesmo partido do 1º. Ministro, o PSD, acrescentou que, não fosse o atual contexto, de Crise, a afirmação do Chefe do Governo era passível de crime de "traição à Pátria".

Artur Teixeira

Ponta Delgada, 22 de Outubro de 2013

Ainda no referido programa, Pacheco Pereira, defendeu que o Governo, logo no início dos contactos com a Troika, mostrou-se demasiado "dócil", deixando que esta lhe tomasse o pulso... Agora é tarde para puxar dos galões... O Governo chegou a ser "mais papista que o Papa", indo além da Austeridade do Memorando de Maio de 2010. Daí que esteja moralmente incapacitado de reagir à crescente interferência externa no debate Nacional sobre a Crise Económica, nomeadamente a questão do Défice. Que há um claro alinhamento ideológico do Governo de Passos Coelho ao Neoliberalismo, matriz do pensamento económico dos atuais representantes das Instituições Globalistas, não temos dúvidas. De resto, tem sido confrangedor observar a subserviência que este Governo tem revelado, preferindo servir os Prestamistas Internacionais que o seu povo.

Não nos surpreende portanto algumas das declarações que temos lido e ouvido de responsáveis de Instituições Internacionais. Recentemente a francesa Christine Lagarde, numa conferência conjunta do FMI e do Banco Mundial, em Washington, afirmou que o Tribunal Constitucional constitui "uma dificuldade", obrigando "a revisões regulares do programa (da Troika) para cumprir as exigências feitas" (pelo tribunal Constitucional). Para bom entendedor, basta... Durão Barroso foi mais "terra a terra" e declarou que o "caldo (está) entornado" se Portugal não cumprir as metas do Resgate Financeiro... Em 2010, a Chanceler alemã afirmava que os países não cumpridores devem perder a sua Soberania. Mais claro do que isto, não é possível.

Obviamente todas estas declarações reproduzem um único facto: Portugal está em franco processo de perda de Autonomia Política. A independência começou a perdê-la com os Tratados de Maastricht e de Lisboa, ambos subscritos pelos partidos do "Arco do Poder". Para escamotear esse facto, até criaram um novo conceito de soberania: "soberania partilhada". Um país ou é soberano ou não, e quando o deixa de ser, passa a ser um protetorado...

Não é a primeira vez que a ameaça de falência do Estado, coloca a Soberania do País em causa. No reinado de D. Carlos I (1892/1908), o Estado Português esteve sob a ameaça de insolvência, tendo a Dívida Pública atingido o rácio histórico máximo de 124% do PIB, em1893. Tal situação, que não era inédita, obrigou a uma demorada negociação com os credores ingleses, alemães e franceses. Em cima da mesa foi colocada pelos dois últimos o "confisco" dos rendimentos das alfândegas, incluindo as colónias. Tal, correspondia evidentemente a uma perda de Soberania, e substancial, uma vez que retirava ao Governo um instrumento soberano de coleta de recursos financeiros e concomitantemente de influência política, podendo a longo prazo perder os próprios territórios, incluindo a Metrópole. Os ingleses se opuseram e opuseram-se, não pelos nossos lindos olhos, mas porque temiam uma excessiva influência alemã no Sul de África. Em 1902, o risco de incumprimento acaba numa reestruturação da Dívida Pública, que foi convertida num novo empréstimo amortizável a 99 anos (!), com juros a 3%. Só recentemente foi liquidada.

Na véspera do golpe militar de 28 de Maio de 1926, Portugal tentava um empréstimo de 12 milhões de libras esterlinas junto da Sociedade das Nações, futura ONU. Os Credores Internacionais mais uma vez puseram como contrapartida do empréstimo a perda de Soberania. Desta vez pretendiam, nem mais, nem menos: a entrega das colónias. Contavam inclusive com o apoio da oposição portuguesa que por várias vezes defendera a venda dos territórios ultramarinos para financiar o desenvolvimento da Metrópole. A emergência da Crise da Dívida Pública, com o risco de Insolvência a pairar sobre o Estado, leva o Marechal Carmona, líder do golpe e presidente do governo, a convidar o Dr. Oliveira Salazar para sanear as finanças do País e deter o crescimento exponencial da Dívida Pública. Pela primeira vez, em cerca de século e meio, Portugal começou a libertar-se de uma dívida histórica crescente. Na véspera do 25 de Abril de 1974, o rácio da Divida Pública era inferior a 15% do PIB, apesar do enorme esforço financeiro do País com a Guerra do Ultramar. A partir daquela data, lamentavelmente, o Estado retomou a saga do endividamento crescente e até agora não conseguiu reverter essa situação. E não será com uma Austeridade cega e injusta que o conseguirá. Estamos convictos.

Dois factos centrais se podem deduzir desta narrativa:

1º., que o endividamento excessivo é um instrumento limitativo da Autonomia Financeira de um Estado, nas mãos de credores usurários, tendente a reduzir a Soberania de um País;  

2º., que o Crédito Internacional raramente foi feito para realizar investimento produtivo, mas para pagar o Serviço da Dívida e despesas de natureza danosa, facto que concorre para o interesse dos Credores, uma vez que não permite um desenvolvimento autónomo, nomeadamente na produção agrícola e industrial, virado para a substituição de importações.

Artur Rosa Teixeira

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