RÚSSIA RECUPERA INFLUÊNCIA NA ÁSIA CENTRAL?

Os turbulentos acontecimentos ocorridos este ano na Ásia Central - a revolução quirguize e a sangrenta repressão de protestos no Uzbequistão - estão a impulsionar uma viragem no equilíbrio geopolítico da região. A Rússia parece ser o principal beneficiário desse realinhamento, enquanto os Estados Unidos estão a perder influência na região.

Moscovo tem trabalhado através de organizações multi-laterais regionais para reforçar a sua posição estratégica na Ásia Central. Em 5 de Julho, um desses grupos, a Organização de Cooperação de Shangai (OCS), emitiu um pedido aos Estados Unidos para estabelecerem uma data para a retirada dos seus militares da região.

Os norte-americanos rejeitaram esse pedido evocando os seus acordos bilaterais com o Quirguizistão e com o Uzbequistão. No entanto, o pedido parece ter confirmado que Whashington está numa situação diplomática defensiva, dado que tanto o Uzbequistão como o Quirguizistão são membros da OCS. Os outros membros são a China, o Casaquistão e o Tajiquistão.

Imediatamente após a tragédia terrorista do 11 de Setembro, os lideres da Ásia Central estabeleceram uma cooperação estratégica com os Estados Unidos como um meio de combater o crescimento da militância islâmica na região. No entanto, quase quatro anos depois, o radicalismo islâmico permanece uma ameaça, desvanecendo o entusiasmo dos lideres da região em relação a uma forte presença estratégica dos EUA na Ásia Central.

Para além disso, muitos dirigentes da região consideram que as políticas agressivas de democratização do Governo de Bush contribuíram para fomentar mudanças políticas na antiga União Soviética, levando a mudanças de regime na Geórgia, na Ucrânia e no Quirguizistão. Aqueles que se mantêm no poder na Ásia Central procuram agora impedir que se espalhe a onda revolucionária que engoliu o Quiguizistão.

O pedido da OCS constitui o mais claro sinal até à data de que está a diminuir o prestígio dos EUA na Ásia central. E constitui também uma prova de que a Rússia e a China se estão a unir para enfraquecer a posição estratégica dos Estados Unidos.

Para além da OCS, a Rússia está a trabalhar através de outras duas organizações regionais, a Comunidade Económica Euro-Asiática (n.t. - EVRAZES, na sigla russa) e a Organização do Tratado de Segurança Colectiva (OTSC), para recuperar influência na Ásia Central. A EVRAZES, unindo a Rússia, Casaquistão, Quirguizistão, Tajiquistão e Bielorrússia, aponta para uma integração económica multi-lateral, enquanto a OTSC, incluindo os mesmos membros mais a Arménia, incide nas preocupações regionais de segurança.

Estas organizações são dominadas pela Rússia. Ambas são dirigidas por generais reformados russos - com Grigory Rapota à frente da EVRAZES e Nikolai Bordyuzha como secretário-geral da OTSC. Até agora, as duas organizações praticamente ainda só funcionaram no papel. No entanto, alguns observadores afirmam que as crescentes preocupações de segurança estão encorajando uma maior cooperação regional. Numa cimeira da EVRAZES em 22 de Junho, por exemplo, os lideres políticos expressaram um novo optimismo acerca da criação na região de uma zona de comércio livre e uma união aduaneira.

Durante a cimeira da EVRAZES, o presidente do Casaquistão, Nursultan Nazarbayev apontou que as trocas comerciais entre os membros do bloco, num total de 28 biliões de dólares em 2004, haviam crescido 40% no ano anterior (n.t. - 2005). A Rússia tem dedicado uma particular empenho no fortalecimento dos laços económicos com o Casaquistão, que possui a mais robusta economia da Ásia Central. A Rússia e o Casaquistão acordaram em criar um banco regional de investimento com um capital inicial de 1,5 biliões de dólares, essencialmente fornecido pela Rússia. O banco, que se espera estar operacional em Dezembro de 2005, terá sede em Almaty, no Casaquistão. Segundo afirmou o presidente da Rússia, Vladimir Putin, "Não é um banco fechado, vai estar aberto à participação de outros países da CEI" (n.t. - Comunidade de Estados Independentes, ténue sucedânea da URSS que integra a maioria das antigas repúblicas soviéticas).

Em conjugação com a cimeira da EVRAZES, Moscovo desempenhou o papel de anfitrião do encontro dos Estados da OTSC a 22 e 23 de Junho. Os participantes assinaram acordos prevendo a organização de um sistema unificado de defesa aérea e a criação de forças de reacção rápida na Ásia Central. Estas forças poderão ser utilizadas em operações de manutenção de paz, declarou Putin aos jornalistas.

A cimeira da OTSC decidiu criar uma comissão inter-estatal de cooperação militar e económica, nomeadamente para promover laços mais estreitos entre as indústrias militares dos Estados membros. A Rússia, principal potência na região acordou também em treinar tropas dos estados membros e vender-lhes equipamento militar a baixo preço. Responsáveis russos expressaram também a vontade de expandir a OTSC. "Planeamos convidar outros países para participarem como observadores nas actividades da OTSC, e também admitimos a entrada de novos membros no futuro" terão declarado fontes anónimas do Kremlin à agência noticiosa RIA-Novosti.

Putin aproveitou a cimeira da OTSC para criticar a coligação anti-terrorista liderada pelos EUA no Afeganistão, caracterizando-a como "muito ineficaz". O presidente russo apontou que que os rebeldes taliban permanecem activos no Afeganistão e que o país voltou a ser um ponto central de tráfico de droga.

Os membros da OTSC declinaram também a exigência dos Estados Unidos e outros países ocidentais de uma investigação independente à actuação do governo uzbeque face aos acontecimentos de Maio em Andijan (n.t. - quando grandes manifestações nesta cidade, exigindo a libertação de elementos de um movimento islâmico ilegalizado, foram duramente reprimidas). "O Uzebequistão não é membro da OTSC, e nós não interferimos nos assuntos internos de outros países ", declarou o ministro russo dos negócios estrangeiros, Sergei Lavrov.

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Tradução de Luís Carvalho

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