A morte de Anísio Teixeira

Em 11 de março de 1971, Anísio Teixeira passou boa parte da manhã na Fundação Getúlio Vargas, na Praia do Botafogo, no Rio de Janeiro. Saiu antes das 11 horas, a pé, para o apartamento de Aurélio Buarque de Holanda, no edifício Duque de Caxias, também Praia do Botafogo, 48. Almoçaria com ele, e pediria voto: era candidato a membro da Academia Brasileira de Letras.

Emiliano José*


Em 11 de março de 1971, Anísio Teixeira passou boa parte da manhã na Fundação Getúlio Vargas, na Praia do Botafogo, no Rio de Janeiro. Saiu antes das 11 horas, a pé, para o apartamento de Aurélio Buarque de Holanda, no edifício Duque de Caxias, também Praia do Botafogo, 48. Almoçaria com ele, e pediria voto: era candidato a membro da Academia Brasileira de Letras.

Um pouco antes das 20 horas, a mulher de Anísio, Emília, liga para a filha Anna, preocupada: nada de Anísio chegar. Logo, o apartamento, à Rua Raul Pompéia, 58, apartamento 803, em Copacabana, começou a se encher de parentes e amigos.
Começa uma via-crucis: delegacia de polícia de Copacabana, onde não havia qualquer notícia; não estivera na Editora Civilização Brasileira, onde trabalhava.

Terminaram o dia no Hospital Miguel Couto, onde não havia sinal dele. Dia seguinte: não estivera também na casa de Aurélio Buarque de Holanda. Tudo muito estranho, a família em polvorosa. E mais angustiado ficaram todos quando o jornalista Artur da Távola, genro de Anísio, informa que o acadêmico Abgar Renault soubera do comandante do I Exército, Sizeno Sarmento, que Anísio Teixeira estava "detido para averiguações" em dependências da Aeronáutica.


No dia 13, jornais noticiam o desaparecimento do educador. E às 17 horas, a família é informada pela polícia: o corpo de Anísio Teixeira fora encontrado no poço do elevador onde morava Aurélio Buarque de Holanda, e estava agora no Instituto Médico Legal. Na autópsia, estiveram presentes o acadêmico Afrânio Coutinho, o neurologista Djalma Chastinet Contreiras e os médicos Francisco Duarte Guimarães Neto, Domingos de Paula e Deolindo Couto, estes três professores da UFRJ.


Havia duas grandes lesões traumáticas no crânio e na região supra-clavicular, incompatíveis com a suposta queda. O legista cita também um eventual instrumento cilíndrico, provavelmente de madeira, presumível causador das lesões. A autópsia foi interrompida abruptamente por dois funcionários provenientes do local de onde o corpo fora retirado (sem perícia), que afirmavam ter sido "morte acidental por queda em poço de elevador".


No edifício onde Aurélio Buarque de Holanda morava, outro genro de Anísio, Mário Celso da Gama Lima, junto com um detetive policial, José Pinto, constatava: o corpo não poderia ter caído do alto e chegado ao ponto onde fora encontrado. Não passaria entre duas vigas logo acima, separadas entre si por uma distância de pouco mais de 20 centímetros. As lentes intactas dos óculos de Anísio, encontradas no local, outra evidência da farsa - não havia, então, lentes inquebráveis.

Os dois subiram para testar as portas dos elevadores de cada um dos andares. Não conseguiram abrir nenhuma delas. Dos que assistiram a autópsia, Mário ouviu a certeza: Anísio fora assassinado. Foi enterrado no dia 14 de março de 1971.


Esclareço que essas informações estão baseadas em textos produzidos principalmente pelo professor João Augusto de Lima Rocha, da Escola Politécnica da UFBA, membro do Conselho Curador da Fundação Anísio Teixeira e da Comissão da Verdade da UFBA, autor do livro "Anísio em Movimento" e, também, no Memorial enviado à Comissão Nacional da Verdade e à Comissão da Memória e Verdade Anísio Teixeira, da Universidade  de Brasília, assinado pelo filho de Teixeira, Carlos Antonio Ferreira Teixeira, Haroldo Lima e pelo próprio João Augusto.  


O Memorial anexa matéria do jornal Última Hora, de 15 de março de 1971, onde sérias dúvidas são apresentadas em relação à tese de acidente, depoimento de Luiz Viana Filho dando conta de que Teixeira estava preso à época da morte, e de Afrânio Coutinho, certo de que o educador fora morto sob torturas, e cita o brigadeiro Bournier.

Coutinho escreveu um documento, depositado nos cofres da Academia Brasileira de Letras, para ser aberto 50 anos após o acontecimento, em 2021, portanto.
A história tem dessas coisas: as ditaduras acreditam poder esconder as patas depois de cometer crimes, e as patas sujas de sangue um dia reaparecem. É momento de resgatar a memória, revelar a verdade, fazer justiça. Sem condescendência com os criminosos.


http://www.patrialatina.com.br/editorias.php?idprog=6ddbcfc5780466b4939637df65b65c3d&cod=12946

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