RESULTADOS DAS ELEIÇÕES PARLAMENTARES NA RÚSSIA: NADA DE INESPERADO

Nos resultados das eleições para a Duma de Estado da Federação Russa não houve nada de inesperado e sensacional. Praticamente todas as principais tendências - o fortalecimento das posições do partido do poder "Rússia Unida", um maior debilitamento tanto dos comunistas como da oposição de direita e o aumento da votação "contra todos" eram previsíveis (e foram preditos) muito antes das eleições.

Examinemos os resultados das eleições mais pormenorizadamente e procuremos separar neles aquilo que está ligado aos factores profundos e duradouros e aquilo que se deve às circunstâncias casuais.

Fortalecimento do partido do poder. Este é um fenómeno absolutamente legítimo e a sua escala até poderia ser mais considerável. (A "Rússia Unida" obteve 37 por cento dos votos, ou seja, pouco mais do que obtiveram nas eleições de 1999 a "Unidade" e a "Pátria - Toda a Rússia", dois partidos que naquela época manifestavam a pretensão ao papel de partidos do poder.)

O apoio prestado ao partido do poder não podia deixar de crescer, pois o considerável eleitorado tradicionalista, que anteriormente tinha votado a favor dos comunistas considerando-os como velho e "verdadeiro" poder em oposição do poder impostor de Eltsin, viu agora tal poder na autoridade presidencial de Putin. A votação a favor da "Rússia Unida" não é uma opção entre algumas alternativas, mas sim uma manifestação completa e ritual da lealdade ao Presidente. Este partido, partido dos "servidores do soberano", cresce especialmente nas regiões pouco urbanizadas e nas camadas pobres e rurais, de nível de instrução relativamente baixo, ou seja, nas camadas de consciência tradicionalista.

Uma maior erosão do eleitorado comunista é simplesmente o lado oposto dos êxitos da "Rússia Unida". Os comunistas foram não tanto o partido que lutava contra o poder como o partido do velho poder, partido de uma espécie de protesto tradicionalista que encarava as transformações realizadas no país no fim dos anos 80 e início dos 90 como uma época de perturbações que devia terminar dentro em breve. Mas actualmente o eleitor comunista convenceu-se de que se fortalece o "verdadeiro poder". Por isso, o seu protesto tradicionalista desaparece.

Claro que a derrota dos comunistas deve-se parcialmente aos esforços emprenhados pelas autoridades. Os canais estatais da televisão faziam diariamente uma propaganda anticomunista à qual os comunistas não podiam responder. Mas isso já não podia exercer uma influência substancial sobre o seu eleitorado, pois a sua erosão se teria processado até mesmo sem quaisquer esforços das autoridades.

O Partido Liberal-Democrático da Rússia (PLDR) e a "Pátria" são fenómenos relativamente semelhantes. Ambos estes partidos estão relacionados com a tradição muito profunda e antiga do povo russo e com os traços entranhados do carácter russo. Estes partidos são acentuadamente antielitistas e, simultaneamente, "leais ao czar e às autoridades". Estão constituídos pelos representantes do povo que pede ao czar: "entrega-nos ou executa os boiardos traidores". Para o poder presidencial russo eles desempenham um poder importante canalizando o protesto social não só para uma direcção segura para o poder máximo mas também para o lado em que este protesto pode ser usado para um maior fortalecimento deste poder.

O surgimento e o êxito do partido "Pátria" estão directamente relacionados com o desejo do Presidente Putin de impedir o aparecimento da oposição dos grandes proprietários, encontrar uma alternativa mais "decente" e menos escandalosa ao PLDR de Vladimir Jirinovski e tirar uma parte dos votos aos comunistas. Não restam dúvidas de que o plano de formação deste partido foi elaborado no Kremlin ou, em todo o caso, foi aprovado pelo Kremlin e resultou bem sucedido.

A derrota dos partidos de direita - União das Forças de Direita e "Iabloko" - está directamente relacionada com o aumento da votação "contra todos". Se o protesto "popular" contra o poder enfraquece à medida que este último adquira os traços do poder autoritário privado de alternativas, traços tradicionais para a Rússia, na mesma medida cresce o protesto das camadas mais "modernistas", instruídas e abastadas da população, concentradas nas grandes cidades e, antes de mais nada, nas duas capitais. O número de votantes contra todos ultrapassou o número de pessoas que votaram a favor de cada um dos dois partidos de direita - União das Forças de Direita e "Iabloko". Este foi de facto o eleitorado das forças de direita que optaram por uma forma de protesto diferente e mais radical.

De um modo geral, todos os processos, que se reflectiram nos resultados das eleições para a Duma de Estado, podem ser resumidos a um grande processo. O poder revolucionário dos "democratas" de 1991 adquire os traços do poder autoritário russo. Isso reconcilia-o com as camadas populares tradicionalistas, mas gera alienação no seio dos sectores mais avançados que estão concentrados nos grandes centros urbanos e se encontram numa proximidade imediata do poder.

RIA "Novosti"

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