Conversações em Cuba: Negociações sobre a paz na Colômbia

Não se pode pactuar um modelo de justiça em que o Estado e os determinadores fiquem impunes.

La Habana, Cuba, sede dos Diálogos de Paz, 25 de julho de 20015

O debate sobre a paz, realizado nesta semana no Congresso da República, não somente foi oportuno e necessário como também refletiu uma vez mais que o atual intento por colocar ponto final a mais de 50 anos de guerra ocupa o interesse prioritário da agenda nacional, ao mesmo tempo em que refletiu um leque variado de posições dos distintos partidos políticos, deixando em evidência que -exceto as forças da extrema-direita comandadas pelo senador Uribe Vélez- todos apoiam os esforços feitos em Havana para conseguir um grande acordo de paz.

Que o ex-presidente Uribe e sua bancada tenham disparatado contra o processo de Paz com o desgastado sofisma de que em Colômbia não há um conflito armado interno não nos surpreendeu, nem nos desvelou: sabemos muito bem que ele e seus alfis fazem e farão até o impossível para evitar que as futuras gerações de colombianos e colombianas vivam e desfrutem de um país em paz.

No entanto, depois de ouvir com atenção as intervenções da maioria dos porta-vozes de cada bancada, nos assalta uma preocupação que hoje queremos compartilhar a partir desta tribuna: apesar de apostar na paz, muitos deles falaram com um grande desconhecimento das origens, da natureza e da história do conflito. Boa parte deu como um fato que não se firmará um acordo final de paz se não há cárcere para a guerrilha, cujos máximos dirigentes -segundo se afirmou- deverão pagar algum tipo de penalidade.

Pensamos que estas são versões recicladas da leitura unilateral e equivocada que o governo vem fazendo sobre a origem e os propósitos do processo que se empreendeu desde o ano de 2012 em Havana.

Na afirmação de que os chefes guerrilheiros deverão pagar algum tipo de condenação se esconde a tese segundo a qual as FARC são as responsáveis por estas décadas de conflito armado e que a verdade sobre o mesmo só se conhecerá uma vez seja firmado o acordo de paz e se produza o desarmamento da guerrilha.

Segundo essa tese, devemos entender que,

Os falsos positivos foram culpa das FARC-EP?

Os 6 milhões de deslocados foram culpa das FARC-EP?

Os mais de 6.500 massacres cometidos pelo paramilitarismo são culpa das FARC-EP?

As milhares de pessoas torturadas e desaparecidas foram responsabilidade das FARC-EP?

Toda a violência de gênero ocorrida durante o conflito é culpa das FARC-EP?

Toda a participação de menores no conflito é culpa das FARC-EP?

O despojo de terras em Urabá, Chocó, Sul de Bolívar, Córdoba Cesar, Magdalena meio, a Altillanura, Cauca, Vale do Cauca, que soma mais de seis milhões de hectares, é culpa das FARC-EP?

Então, devemos crer que os paramilitares já pagaram suas culpas e que em Colômbia não há paramilitares?

Só bandos criminosos narcotraficantes, um dos quais é as FARC-EP?

Os representantes da classe dirigente, os partidos políticos, o empresariado, os terra-tenentes e as multinacionais não assumirão nenhuma responsabilidade?

Devemos assinalar que para falar de justiça é necessário conhecer toda a verdade. Não se pode pactuar um modelo de justiça em que o Estado e os determinadores fiquem impunes.

À presente legislatura corresponde a responsabilidade de tratar temáticas de indiscutível importância, em momentos de particular dificuldade para o país. Ao debate do fim do conflito e das políticas públicas originadas dele, há que somar a iminência de uma crise econômica sem precedentes, com o barril de petróleo a menos de 60 dólares, o ouro a 1.200 dólares a onça, as exportações em descenso ou estancadas, os hospitais fechados ou quebrados e uma crise econômica internacional cada vez mais aguda.

Nessas condições, um governo debilitado, que descumpre com as organizações sociais e se nega a verdadeiras mudanças, deverá enfrentar-se não só com um parlamento dividido como também com a resposta popular nas ruas.

É por isso que hoje, quando estamos mais perto do que nunca da possibilidade de um encerramento da expressão armada do conflito, pensamos que desde o parlamento se deve atuar com suma responsabilidade, sem apelar para velhos truques midiáticos para distorcer o sentido do processo de paz, vendendo a velha ideia de que a guerra tem sido protagonizada por uns bons, muito bons, que foram atacados por uns maus, muito maus, sobre os quais deve recair todo o peso da lei.

Nesta hora transcendental se necessitará de partidos políticos e lideranças parlamentares à altura dos desafios do momento, plenamente conscientes da transcendência de suas decisões e comprometidos com o supremo objetivo da paz.

Poderíamos coincidir com o Dr. Humberto de la Calle em que hoje é mais possível vislumbrar cenários de paz certa do que antes.

Não obstante, o chefe negociador do governo pouco ajuda a concretizá-los ao insistir em interpretações que já se tornaram costume na delegação do governo e que em nada correspondem com a realidade, a saber:

- O primeiro, que o tema da agilidade das conversações é assunto que incumbe somente à guerrilha. Isto, o sabe muito bem quem conheça de perto o que acontece na Mesa, não é certo. No transcurso das conversações temos dado conta de presteza e interesse por conseguir rápidos avanços. Tem sido precisamente o governo quem tem adiado debates urgentes, atuando com displicência em numerosas ocasiões e tornando complexos pontos que seriam de fácil consenso, com um pouco de sentido comum.

- O segundo, havendo expressado nitidamente nossa posição acerca do tema da deixação de armas, a insistência em equiparar essa deixação com a entrega destas à contraparte não é mais que uma falácia. Sabe muito bem o chefe negociador do governo da Colômbia que o firmado no Acordo Geral de Havana não é a entrega das armas à contraparte. Não se consegue um acordo definitivo simplesmente repetindo milhares de vezes suas próprias teses ante as câmeras.

- O terceiro, denominar "pendentes ilegítimos" ou "pendentes fictícios" as ressalvas e temas pendentes que as FARC-EP mantemos frente aos acordos dos pontos 1, 2 e 4.

Estigmatizando as questões que a contraparte considera determinantes nos pontos referidos, o governo não consegue que as abandonemos, pelo contrário: ratifica nossa convicção em que sua discussão é vital para a firma de um Acordo Final.

O país pode ter a certeza de que nas FARC-EP já tomamos a decisão de buscar o fim do conflito. Em Cuba e em Colômbia nossa luta é pela paz.

Porém, nossa determinação, que tem sido consultada com com toda a base guerrilheira, não se debe confundir com um sinal de rendição ou de sometimento. Se o estabelecimento segue pensando que se trata disso, a paz continuará sendo uma quimera.

DELEGACIÓN DE PAZ DE LAS FARC EP.

Equipe ANNCOL - Brasil

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