Fazer sentido da loucura de Israel

Que Ariel Sharon segue a linha dura de política israelense, não haja dúvida. Sabra e Shatila foram uma prova viva disso. Porém, também não é louco e não iria propositadamente colocar em perigo a existência do Estado de Israel. Por quê, então, provocaria a ira dos palestinianos e do mundo islâmico em geral, contrariar a opinião pública mundial e destruir a Mapa de Estrada do Médio Oriente, e simultâneamente o processo de paz, por encomendar o assassínio de Ahmad Yassin?

Ariel Sharon pode seguir a linha dura mas não é um extremista zionista. Com cada acção que faz, lembrará da noite de 4 de Novembro de 1995, quando o primeiro-ministro Yitzhak Rabin foi assassinado – por um destes extremistas. Não foi um acto individual. As sondagens na altura mostravam que somente 18% da população de Israel apoiava seu plano de paz. Três meses antes do assassínio, houve um sinal precursor desta falta de popularidade, quando 40.000 adeptos de futebol o vaiaram num estádio de futebol. O factor Rabin terá sido presente em todas as decisões tomadas pelo Knesset nos últimos dez anos.

É o que acontece quando um Primeiro-ministro de Israel começa a ser demasiado conciliatório perante os palestinianos – leva um tiro, ou perde os membros do seu governo.

Em segundo lugar, Ariel Sharon é jogador importante na cena durante muito mais tempo que alguns comentadores imaginam. Como Ministro para a Agricultura e os Assentamentos, sua “Visão de Israel no Fim do Século” foi publicado em 1977, quando o Partido Likud assumiu o poder. É esta a Mapa de Estrada de Sharon: duas linhas de assentamentos israelitas de norte a sul ao longo dos lados oriental e occidental da Cisjordânia ocupada, com um complexo de estradas ligando os colonos, fixando estes numa base permanente nas terras palestinianas.

Enquanto a Mapa de Estrada de Sharon é tangivel e concreta, nem o Acordo de Oslo (1993), nem a Mapa de Estrada do Quarteto (ONU, Federação Russa, União Europeia, EUA), o são, porque falta-lhes os pormenores específicos para serem facilmente implementadas. Ambos os planos são uma via média localizada algures entre as posições dos extremistas zionistas e islamistas, satisfazendo nenhuma destas facções, porque criam erradamente um reconhecimento de facto que Israel tem o direito de reter algumas (não todas) povoações na Cisjordânia.

Este território foi anexado como troféu de guerra em 1967, juntamente com a Faixa de Gaza, os Montes Golã e Jerusalem Oriental. O problema com um troféu de guerra é quanto tempo pode ser retido até que o status quo que existia antes, se repõe. O Primeiro-ministro da Autoridade Palestiniana, Mahmoud Abbas (Abu Mazen) contava com uma taxa de popularidade de 3% antes da sua demissão em 2003, devido à sua posição demasiado conciliatória aos EUA e Israel.

Ariel Sharon sabe que a ocupação dos territórios ocupados é errada e ilegal. Por isso, Israel começou a primeira fase da Mapa de Estrada Sharon em 2000, quando se retirou do sul do Líbano. Contudo, com os guerrilheiros de Hezbollah a seguirem o retiro, a cantarem e celebrarem a vitória, foi visto como sinal de fraqueza nunca mais a ser repetida no futuro.

Foi na sequência desta necessidade de salvar a face mas tambem de produzir alguma movimentação que se enquadra o assassínio de Sheikh Ahmad Yassin. A segunda fase da Mapa de Estrada de Sharon é retirar as tropas israelenses da Faixa de Gaza, mas ao mesmo tempo, soletrar uma mensagem clara a Hamas – que os líderes desta organização são considerados como um alvo legítimo e serão atacados, assim desfazendo os receios que Israel será outra vez acusado de demonstrar fraqueza – o factor Rabin.

Este retiro irá criar um sentido de alívio na comunidade internacional, que responderá com pressões sobre a Autoridade Palestiniana para ceder um pouco e aceitar uma ocupação parcial da Cisjordânia. Porém, a Mapa de Estrada de Sharon, ou qualquer outra que recusa a reconhecer a noção básica que qualquer tipo de ocupação é inaceitavel, só pode servir de combustivel para mais ataques terroristas quer no Médio Oriente, quer fora.

Al Qaeda respondeu com celeridade ao assassínio de Yassin, afirmando que “o tirano desta era, os EUA e seus aliados, irão sofrer ataques de vingança”. Demorou-se tanto na resolução do conflito no Médio Oriente que a questão se radicalizou e internacionalizou. Não surpreenderia agora se cada acção por Israel fosse reflectida em ataques terroristas contra alvos civis nos Estados Unidos da América e os países que apoiaram o ataque contra o Iraque, para fazer compreender a comunidade internacional que a ocupação das terras de palestina não é negociavel.

Mais, enquanto a comunidade internacional exprimiu seu horror contra o ataque de Sharon, tambem esqueceu que um mártir que morre pela sua causa – libertar as suas terras do invasor – pode ser visto como herói e guerrilheiro num lado da fronteira mas no outro lado, seus actos são vistos como terrorismo e assassínio, por aqueles que perdem seus familiares.

O problema fica mais complexo no mundo de hoje, onde o regime de Bush tenta impor uma visão global limitada, em tons de preto e branco, sobre a comunidade internacional. É a área cinzenta no meio onde a verdade normalmente se encontra e onde jaz a opinião pública de todas as partes. Uma minoria da população de Israel apoia os extremistas zionistas. Uma minoria dos palestinianos são islamistas fanáticos que querem eradicar o Estado de Israel.

Até que sejam abordados os principios fundamentais, nomeadamente que Israel não pode continuar a ocupar terras que não lhe pertencem – e nunca pertenceram – Israel e a comunidade internacional continuarão a ser as vítimas da injustiça. Contudo, como Israel é suposto a implementar tal política de se retirar totalmente é um enigma – o factor Rabin.

Possivelmente, quanto menos interferência da comunidade internacional, melhor. Assim permitiria a aqueles que residem na região, que vivem e sentem as verdades fundamentais de perto numa base diária, a traçarem um plano de paz faseado mas com calendário concreto, ao mesmo tempo desenvolvendo laços culturais e comerciais e colocando as pedras de toque para a iniciação duma fase de desenvolvimento sustentavel das duas comunidades, vivendo lado a lado em paz.

Timothy BANCROFT-HINCHEY PRAVDA.Ru

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