O eleitor de Trump nasceu no cinema

Em 1993, Joel Schumacher identificou aquele que seria, 23 anos depois, o eleitor típico de Donald Trump nas eleições presidenciais norte-americanas.

Mas, quem é Joel Schumacher e como ele fez isso?

Até hoje em atividades, Schumacher é um diretor de cinema norte americano, adepto de uma linguagem cinematográfica rude, direta e um tanto quanto permeada por ideias, diríamos assim na falta de um qualificativo melhor, patrióticas.

Seus filmes mais conhecidos são o Cliente, com Susan Sarandon e Tommy Lee Jones e Batman Eternamente (Batman Forever) com Val Kilmer, mas foi em Um Dia de Fúria (Falling Down), com Michael Douglas e Robert Duvall, que Schumacher faz seu melhor trabalho e mesmo sem querer, traçou o perfil psicológico daquele que seria o eleitor típico de Trump em 2016.

Michael Douglas faz no filme o papel de William Foster, um homem branco, de meia idade, estressado, que está desempregado, em processo de divórcio e que neste dia de fúria, está impedido por decisão judicial de visitar a filha no seu aniversário.

O filme começa com o personagem preso num enorme engarrafamento dentro de um túnel, criando um clima de claustrofobia, que, de certa forma vai acompanhá-lo até o final.

Abandonando o carro, Foster vai partir sozinho numa caminhada por uma cidade, que nem de longe lembra aquelas que o cinema sempre mostrou como típicas dos Estados Unidos.

Nesse percurso, como um Ulisses, da Odisseia de Homero, ele vai enfrentado mil perigos na tentativa frustrada de voltar ao seu lar. 

A saga que o cinema americano criou com seus filmes de caubóis, tem agora uma leitura diferente na identificação dos inimigos.

Em vez dos índios e dos bandidos do passado, ele agora vai   extirpando na sua caminhada, aquilo que para os wasp - o acrônimo para branco, anglo-saxão e protestante- têm sido a perdição dos Estados Unidos: os imigrantes, os delinquentes juvenis e o consumismo irresponsável, estimulado pela propaganda sempre enganosa.

As cenas em que destrói uma pequena loja de um imigrante coreano, porque ele pratica preços abusivos e não consegue se expressar corretamente em inglês e na que apavora os representantes da classe média americana num fast food, são antológicas.

Na época, Schumacher estava mostrando ao mundo um novo tipo de cidadão americano, bem diferente daquele que o cinema apresentava até então, vivendo sempre uma idílica "american way life" 

Esse americano, que as recentes eleições mostraram que hoje predomina no País, é um fascista em potencial, ressentido com as injustiças do sistema, do qual diz ser vítima e que atribui às causas externas, quase sempre os outros, seus problemas.

Quando os críticos execraram o filme por glorificar as transgressões da lei, Kirk Douglas, na época mais famoso ainda que seu filho, foi à imprensa para defender o trabalho: "o personagem de Michael não é o herói, nem o mais novo ícone urbano. Ele é o vilão e é também a vítima. São muitos os elementos da nossa sociedade que contribuíram para a sua loucura"

A Korean American Coalition, uma associação de defesa dos imigrantes coreanos, protestou pelo tratamento que o filme das minorias e a Warner Brothers cancelou o lançamento do filme na Coréia do Sul após ameaças de boicote.

(Nesse último fim de semana uma notícia sobre a suposta morte de Schumacher apareceu no facebook, no dia19, mas já foi desmentida como mais um trote que seguidamente aparecem nas redes sociais sobre pessoas famosas)

Marino Boeira é jornalista, formado em História pela UFRGS

 

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