Carta dos caciques Munduruku

Carta dos caciques Munduruku

Telma Monteiro

04/10/2019


Chefes Mun­du­ruku, Itai­tuba, Pará - Foto:Telma Mon­teiro

Preâm­bulo

Já es­crevi muito sobre os Mun­du­ruku e com eles es­tive em muitas oca­siões. Em todas elas a ameaça às suas terras e in­te­gri­dade foram ob­jeto de pre­o­cu­pação e rei­vin­di­ca­ções. Neste mo­mento em es­pe­cial, os Mun­du­ruku estão ame­a­çados mais uma vez, agora pelo go­verno Bol­so­naro, como com­prova o ma­ni­festo que eles di­vul­garam e que re­pro­du­zimos adi­ante.

Quero, ainda, deixar aqui um trecho de uma po­esia sobre os Mun­du­ruku e sua li­gação com o rio Ta­pajós.

Da pro­fa­nação do ter­ri­tório sa­grado dos Mun­du­ruku até o véu mís­tico for­mado por cen­tenas de cân­ticos e rimas que ecoam nas pe­dras e nas águas dos rios. A pressão dos en­go­li­dores de flo­resta aca­bará se per­dendo nos es­ca­ni­nhos da his­tória. O si­lêncio des­cerá sobre o lugar sa­grado e a ino­cência se dis­si­pará nas es­pumas. Ritos e ce­rimô­nias Mun­du­ruku não serão mais ou­vidos e eco­ados com o mur­múrio das águas do rio Ta­pajós, po­de­roso e belo.

Carta dos ca­ci­ques Mun­du­ruku

Aje­buyxi gu ekawen tup: o papel dos ca­ci­ques

Nós, do povo Mun­du­ruku, es­tamos ma­ni­fes­tando pelo des­res­peito que das au­to­ri­dades do nosso povo. Os pa­riwats ga­rim­peiros e po­lí­ticos estão ex­plo­rando a nossa casa e o nosso ter­ri­tório, agindo com suas men­tiras, sem nos con­sultar.

Somos 14 mil Mun­du­ruku, um só povo e o nosso ter­ri­tório é único. Ka­ro­sa­kaybu e nossos an­te­pas­sados que dei­xaram de he­rança para cui­darmos, vi­vermos e cri­armos nossos fi­lhos. Não apoi­amos as leis e pro­jetos que nos ame­açam.

A nossa luta não é de agora, é muito an­tiga. Can­samos de ouvir os pa­riwat falar que somos in­ca­pazes, e por isso, sempre mos­tramos a nossa ca­pa­ci­dade. São os nossos an­te­pas­sados que nos ajudam a pro­teger o nosso ter­ri­tório.

Es­tamos aqui ma­ni­fes­tando e pe­dindo so­corro, porque os pró­prios po­lí­ticos e ve­re­a­dores estão nos ma­tando, aju­dando a po­luir nossos rios, di­a­lo­gando com go­verno em nome do nosso povo. Não acei­tamos que ne­nhum ve­re­ador fale nem sobre re­gu­la­ri­zação de ga­rimpo e mi­ne­ração nas nossas terras e nem sobre o pro­cesso de in­de­ni­zação das Itīn'a Wuy jugu (urnas fu­ne­rá­rias do povo Mun­du­ruku). Ne­nhum ve­re­ador está au­to­ri­zado a falar em nome do nosso povo Mun­du­ruku.

Temos o nosso pro­to­colo de Con­sulta, de acordo com a 169 da OIT e antes de qual­quer in­tenção que afete a vida do nosso povo tem que con­sultar os ca­ci­ques, ca­cicas, li­de­ranças, pajés, pro­fes­sores; até nossas cri­anças têm de ser ou­vidas. Não acei­tamos reu­niões em Bra­sília só com pa­riwat. Qual­quer de­cisão im­por­tante tem que ser to­mada dentro do nosso ter­ri­tório.

Cadê os pro­jetos de lei vol­tados para o povo Mun­du­ruku?

Nós não ne­go­ci­amos a vida e o di­reito do nosso povo. Exi­gimos res­peito. Não que­remos que se re­pita o que já acon­teceu no go­verno pas­sado em Ja­ca­re­a­canga, que nós Mun­du­ruku ma­ni­fes­tamos para de­fender nossos di­reitos e con­se­guimos re­verter a de­missão de 70 pro­fes­sores Mun­du­ruku.

Por isso, co­mu­ni­camos a po­pu­lação de Ja­ca­re­a­canga que, são nossos pa­rentes que de­pendem dos rios, peixes, roças, caças e da flo­resta para viver.

Es­tamos can­sados de não sermos es­cu­tados. Can­sados de es­perar os po­lí­ticos tra­zerem as in­for­ma­ções. Sa­bemos que o go­verno atual está ame­a­çando nossos di­reitos, nosso ter­ri­tório, nossa vida.

Que­remos uma au­di­ência ur­gente com os ve­re­a­dores junto ao Mi­nis­tério Pú­blico Fe­deral, para que possam ouvir o que temos para falar.

Vamos con­ti­nuar lu­tando na de­fesa dos nossos di­reitos e da vida do nosso povo!

Ja­ca­re­a­canga, 2 de ou­tubro de 2019.

http://www.correiocidadania.com.br/2-uncategorised/13894-carta-dos-caciques-munduruku

 

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