Violência demente

As cenas horríficas em Londres hoje, onde 41 mortes e 700 feridos foram confirmados, cifras que tendem a aumentar com o passar do tempo, são uma lembrança fria da pura loucura que faz parte da vida quotidiana de hoje, no ano 2005.

A tendência de empacotar as notícias em rótulos fáceis de digerir são perigosos nesse momento que é um hiato, um cruzamento no nosso progresso como espécie. Dizer que os terroristas são uns covardes e uns cabrões, uns incultos e incivilizados, sabe bem, sabe tão bem quanto defender a culinária nacional contra um grupo de estrangeiros que dizem que o prato nacional é desenxabida ou insossa.

No entanto, em momentos desses, temos de chegar ao cerne do assunto e ver a questão dum ponto de vista objectivo, global e impessoal, para chegarmos à verdade.

Primeiro, o terrorismo é a forma mais covarde e demente de aplicar a força, porque escolha como alvos pessoas inocentes que tentam seguir suas vidas quotidianas e não toma em conta sua idade, género, raça ou religião e em nenhuma religião ou sociedade se pode justificar ceifar vidas inocentes duma maneira tão injusta e com tamanha brutalidade.

Se as pessoas (?) que cometeram os crimes de hoje são islamistas, como justificar a inclusão de muçulmanos entre os vítimas? No Qu´ran, onde é que justifica a matança de mulheres e crianças? Esses não são libertadores, nem a causa deles vale mais nada do que desprezo porque um herói, um combatente, um militante, um soldado, nunca se esconde atrás da morte de civis. Quem mata mulheres e crianças é um covarde, um criminoso, um assassino, um demente e um traidor a qualquer causa.

Porém, o terrorismo não é nada de novo. Terroristas judeus lutaram contra os militares britânicos na Palestina há 60 anos. Terroristas irlandeses, alguns apoiados pelo NORAID, muito popular em Nova Iorque, projectaram civis ingleses e não só através das montras nas Ilhas Britânicas durante uma década de violência, muito antes do bin Laden ter virado as mesas contra os interesses dos EUA – e depois dos EUA terem apoiado e ajudado o terrorismo fundamentalista islâmica em Afeganistão contra as Forças Armadas Soviéticas.

Agora que o cachorro morde a mão daquele que o alimentava e os que cospem para o vento aprendem que o que semeia, colhe, vemos que todas as formas de terrorismo produzem o mesmo resultado.

Seja quem for o perpetrador e seja onde for que perpetra seus actos de maldade, o assassino é sempre a acção que provoca a reacção, o desafiador à autoridade, procurando testar as regras.

As regras foram expressas por milhões de pessoas antes do ataque bárbaro, terrorista, assassina e cruel contra os civis e infra-estruturas do Iraque pelas forças armadas dos EUA e uma mão cheia de aliados sedentos pelo protagonismo. Foram muitas milhões que marcharam contra a guerra, apoiados pelas formações políticas da esquerda, enquanto os partidos da direita ou foram covardes demais para tomarem uma posição contra, ou então apoiaram de facto a chacina de uma centena de milhar de pessoas.

Mas as autoridades desse clique de protagonistas, levados a cometer um acto de matança pela elite neo-conservador que gravita a volta da Casa Branca, não quiseram ouvir. Nessas páginas da PRAVDA.Ru, cinco meses antes do ataque contra o Iraque, lançámos o aviso que quem queria ligar o Iraque ao terrorismo internacional iria criar um problema que não existia antes.

O terrorismo internacional não existia no Iraque antes da invasão e essa invasão deu a luz verde a qualquer pessoa com tendências extremistas vangloriar-se numa onda de vingança. Como se pode responder a essa pergunta:

Qual é a diferença entre o assassínio dum civil londrino ou nova-iorquino por um fanático islamista e o assassino dum civil iraquiano em Bagdade por um piloto norte-americano ou britânico?

Perpetrar actos de chacina, como se viu hoje, não coloca bem o que está mal e há que realçar que qualquer morte dum ser humano é uma tragédia, seja quem ou onde for; há que realçar que um acto de assassínio é assassínio, pura e simplesmente, seja rotulado por libertação, terrorismo ou danos colaterais.

A verdade é que o terrorismo internacional existe e vai ficar por algum tempo, consegue golpear onde e quando quer e o ataque de hoje foi uma mensagem clara aos líderes dos G8: estamos aqui, estamos vivos.

E a seguir?

O ataque de hoje é mais um sinal do poder do indivíduo contra o estado e por isso, se o estado utilizar os seus recursos (de estado) contra o indivíduo, não resulta, porque pode lançar um exército ou dois ou três em Londres mas lutar contra quem ou o quê?

Algures, num determinado ponto da linha da hierarquia, tem de haver uma reunião, abrindo um processo de diálogo para estabelecer qual é o jogo, quais são as regras e quem são os jogadores.

Quanto mais sofisticados as autoridades, mais sofisticados tornar-se-ão os terroristas e assim começa o espiral de violência, por isso o acto de combater o terrorismo não é a solução final. A solução final é aquela que corta definitivamente a única linha de alimentação dos terroristas internacionais – operacionais que têm vontade de participar nesses actos de violência, mesmo quando isso envolve o suicídio.

Esses indivíduos se juntam à causa porque recebem mais dinheiro nesse tipo de actividade do que estarem parados no desemprego, ou porque simplesmente gostam da violência e utilizam qualquer causa para atingir seus fins dementes. Ou porque são dementes, ponto final.

Tirar a causa duma organização terrorista e o quê é que resta? Um bando de criminosos. Tratar as questões sociais subjacentes, examinar a causa de forma objectiva e decidir quais os pontos que podem ser levados à mesa de discussão num processo de diálogo (mesmo que seja em segredo) parece ser uma abordagem realista.

Os que estão envolvidos em actos terroristas, sejam aqueles que colocam bombas em transportes públicos, sejam aqueles que deitam bombas em civis de aviões militares, têm de saber que a humanidade não aceita mais violência deste tipo. É perfeitamente inaceitável que um ser humano não possa viver seu dia-a-dia sem segurança. Não foi por isso que milhões de pessoas lutaram durante tantos anos.

A liberdade não pode existir quando as pessoas não sentem a segurança de seguir as suas vidas diárias. No nome da Humanidade, se pede a todos esses perpetradores de mortandade de resolverem suas diferenças. Não foi esse o início do terceiro milénio com que todos nós sonhámos.

Timothy BANCROFT-HINCHEY PRAVDA.Ru

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