Portugal mais uma vez de luto!

Guitarra que te tocava cigarra fantoche grilo enrolado sobre as formas de teu irreal tranquilo génio além de quanto som de quanta alada visão era o único! o teu tom que elevava o coração agora a tua guitarra vai procurar tuas mãos que nunca mais a agarram ficamos orfãos! irmãos!

Marília

Lembro-me de ti Carlos Paredes, numa noite de música no Teatro Lethes de Faro, em 1977. Era verão, e estavam presentes mais dois vultos da Cultura Portuguesa, o José Gomes Ferreira, esse vulto de ancião inesquecível, de cabeleira branca, como se a lua o tivesse coroado, com seu ar humano e bom, e o Adriano, o nosso inesquecível e terno Adriano! de vocês três já nenhum volta a animar nenhum sarau, nenhuma noite de Cultura, de música, de poesia. Queria dizer-te tudo o que me vai por dentro neste momento em que nos deixaste! e o que me vai por dentro não se traduz em palavras, soam lágrimas que caem no silêncio duma solidão infinita!

Ai meu amigo, que quando morre um Artista, como tu, como eles, a nossa pobreza cresce tanto, que mesmo o grito que nos sobrevoa o rasgão aberto para sempre, não tem força para dizer o que é sinto-me vazia! Vazia e esmagada por dentro! Porque morreste e porque não tiveste a vida que os que te amavam, os que se desalteravam com tua música, teriam querido para ti! mas sabes? claro que sabes! Nós meu querido amigo, somos, uns, fazedores de versos, outros, inventores de música e de mãos que a desferem, mas em nossas mãos onde brota Arte, não cresce nunca a vileza do ouro e do dinheiro. Por isso nossa vontade solidária, embora grande, nesse campo é tão fraca! é que nunca podemos dar a um amigo nada mais que o nosso coração!que o nosso apreço! e embora isso seja importante,e indispensável, não sustenta um homem, uma mulher, uma família! entregaste tuas mãos onde poisava a magia da música, a tarefas que te traziam o direito indispensável de sobreviver! e assim foste vivendo, mas sempre com esse manacial de sons que desaguavam na tua guitarra, a dar a cor aos teus dias e aos nossos!

Poetas, músicos pintores, escultores, artistas, a colorir e a perfumar a vida; numa época gelando, a trazer no criativo invento, o calor que falta à humana necessidade de acreditar.

Por todos os que estão, que permanecem contra ventos e marés, que sobrevivem numa Arte que traz nela os alicerces da vida, não vamos mais calar nossa crença: a Arte tem um papel fundamental, na transformação das mentalidades, na transformação da sociedade, porque tem que semear pelo mudo, a certeza de que o ser humano, traz nele a solução de todos os seus problemas.

Morreu Carlos Paredes, e aqueles que o ignoraram, que lhe negaram o direito de ser aquilo que realmente era, um músico com o direito de viver de sua música, vão até começar, seu cortejo de fúnebres lamentações! Não nos deixemos enganar!

Carlos Paredes, se tivesse podido viver de sua música talvez ainda hoje estivesse vivo.

Pelo direito a viver, pelo direito ser o músico que foi, (sempre estes verbos no passado a que me não faço!!) desgastou-se muito mais que o necessário!

E agora? Agora nosso pranto, nossa dor, não o trazem à vida. Vamos continuar a escutar-lhe a Guitarra, a saborear-lhe os sons como se nada fosse conosco? qual o futuro Paredes, qual o futuro abandonado? Para que tudo mude não nos calemos nunca mais !

Pela sua grata e generosa memória e por quantos Paredes nos venham a nascer e a morrer em Portugal! Para que tudo mude, não silenciemos nunca, denunciando toda e qualquer forma de hipocrisia!

Honra à sua grata memória Viva a Arte Viva Portugal !

Agora, que se lhe façam homenagens! Mas nunca nada pode apagar a ofensa dos que governam Portugal ignorando quase, o Génio ao abandono! Quando governos de nosso Portugal vão olhar seus artistas com o respeito que merecem? Quando sua dignidade vai começar a ser honrada e enaltecida? é preciso que venha a morte? Que palavras encontrar num momento destes, quando ficamos tão mais pobres na nossa Cultura! Eu não tenho mais palavras! Agora deixo lugar às minhas lágrimas de poeta, de ser humano e de cidadã cada vez mais pobre!

Adeus Amigo! até à curva do caminho onde quem sabe nos espera a tua Guitarra, as tuas mãos de música e nossos poemas! Até sempre companheiro! Até à Música e à Poesia.

Marília Gonçalves

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