A Amazônia já está internacionalizada

O Projeto de Lei 4776/2005 é a concretização do projeto de internacionalização da Amazônia?

Aluízio – É. No entanto, a questão da internacionalização da Amazônia é muito relativa. Hoje não se internacionaliza como antes, com guerras. Hoje o capital tem uma plasticidade tamanha que uma guerra é internacionalizada por meio do controle das economias dos países em desenvolvimento.

E aqui na Amazônia o núcleo estratégico da economia regional está todo nas mãos do capital multinacional. Todos os grandes projetos minerais, que são logísticos para os interesses da acumulação mundial, estão nas mãos da Alcan Alumínio do Brasil, uma empresa canadense, e da Vale do Rio Doce, uma multinacional brasileira que joga 10 milhões de toneladas de bauxita metalúrgica por ano no mercado mundial, bem como da Albras, da Alunorte que é controlada pela Nikon Amazon Aluminum Corporation junto com a Vale do Rio Doce e que joga alumínio primário para o mercado mundial, abastecendo estrategicamente o mercado japonês com quase 400 mil toneladas por ano de alumínio primário. O Carajás, que é controlado também por capital japonês, e que vomita por ano aproximadamente 90 milhões de toneladas de minério de ferro. A Alumar, em São Luiz, no Maranhão, controlada pela Alcoa, norte-americana, e pela Shell, filha da Billington holandesa.

Sem contar outros projetos que existem pela região, todos nas mãos do capital multinacional. Do ponto de vista do contexto da Amazônia hoje, como o senhor analisaria o PL 4776/2005?

Aluízio – A questão do controle das florestas está presa a dois problemas seriíssimos. Um é o endividamento externo brasileiro. Agora, por exemplo, o governo está falando que não vai renovar o acordo com o FMI, mas o problema é que cumprimos as determinações do FMI de fazer o superávit primário e entregar uma quantidade brutal de juros aos credores da dívida externa. Então, nosso endividamento externo é um terrível fator de subsunção porque foi a partir da exploração das condições de nosso endividamento que nos impuseram os preços da bauxita da Mineração Rio do Norte e do alumínio primário da Albras e da Alunorte. Foi ainda na época do Delfim Neto, em negociações no Japão, que os japoneses impuseram ao Brasil um preço que foi uma mistura do preço do mercado internacional com o preço do mercado interno japonês. Isso foi imposto por causa do endividamento brasileiro e da nossa submissão às condições desse endividamento. Do mesmo modo, a negociação dos preços da bauxita da Mineração Rio do Norte. Eles calculavam que a bauxita devesse ser vendida no mínimo por 33 dólares para remunerar o capital investido à taxa normal de juro no mercado mundial, e ela passou a ser vendida por 23. Dadas essas condições, quem se beneficia disso são os sócios que compram a bauxita da mineração a um preço abaixo do custo de produção. Até quatro meses atrás estávamos entregando à Albrás uma energia que custa 24 dólares para produzir um megawatt no Tucurui por 15, com um prejuízo de 37,5% sobre o custo de produção. Como o Brasil é um país cujas tarefas produtivas na divisão internacional do trabalho é a de empacotar e mandar para fora uma quantidade gigantesca de recursos naturais e como temos uma enorme defasagem científica e tecnológica em relação aos grandes países, essa fragilização por efeito do nosso endividamento nos impõe condições altamente desvantajosas que fazem com que nós ingressemos no esquema do exportar ou morrer. Exportar é o que importa, quer dizer, nós somos um país essencialmente exportador. Isso está afetando a floresta amazônica? Aluízio – O que está se devastando hoje na Amazônia com a invasão da soja é um negócio terrível. Então, a questão das florestas está intimamente associada a isso. A nossa floresta, hoje, no estado do Pará, o que resta de floresta é o mínimo. Naquela região da Terra do Meio a floresta já está toda devastada. A área que acompanha o trajeto da Belém-Brasília e a PA-150, aqui do Estado do Pará, praticamente não tem mais floresta. Então o que resta de floresta, que é essa área que fica entre o Xingu e o Tapajós e também na parte conhecida como Calha Norte, que era onde os militares queriam desenvolver o projeto Calha Norte, está sendo atacada hoje violentamente pelos sojeiros, madeireiros, fazendeiros. E o Ibama e os órgãos oficiais não fazem nada. Está havendo uma devastação brutal. Então, a questão da entrega das florestas em regime de exploração é um negócio terrível porque o prazo de concessão (previsto no PL 4776) é enorme e permite que sobretudo o grande capital avance em cima disso.

Acho que é uma questão de segurança nacional. E nada está sendo feito no sentido de impedir isso aí. Além do mais, mexer com floresta, como a Jarí já fez isso, a Jarí tem projeto de manejo florestal, mas ele destruiu nada menos do que 115 mil hectares para implantar uma monocultura florestal lá para produção de celulose. A Jarí tem um espaço de 115 mil hectares aberto dentro da floresta. Além do mais, isso veio acompanhado de um negócio terrível, não havia cobro para isso e a notícia que se tem por parte dos engenheiros florestais que acompanhavam os trabalhos de desmatamento é a de que eles deram em cima de gigantescos cemitérios indígenas porque aquilo ali era uma área de ocupação imemorial dos índios Aparaí, e a ordem era a de que eles destruíssem o último farelo desses cemitérios para não deixar evidência nenhuma, porque aquilo estava atrapalhando a plantação da gmelina arbórea, que era a base para fabricação da celulose do projeto Jarí. Quer dizer, nós destruímos evidências extraordinárias da nossa história, da nossa história anterior à colonização, por força desse estilo de ocupação da região. A entrega das florestas se aproxima do modelo das PPPs (Parceria Público-Privado)? Aluízio – Sim, o Estado garante a entrega do patrimônio social, ele tem o poder da entrega desse patrimônio, ele se declara dono do patrimônio em nome do interesse coletivo e entrega isso para o segmento privado. É uma coisa absurda!

Mas é isso que sempre aconteceu na Amazônia, sobretudo a partir da ditadura militar, que foi quando isso se intensificou ainda mais, e agora, como a nossa dívida externa não permite ser abatida, o que pagamos por ano são exclusivamente os serviços da dívida, para que consigamos nos manter em estado de suspensão animado sem sermos pressionados pela cobrança dela, sacrificamos nossa natureza. O que está acontecendo agora é isso, é a entrega da natureza regional e o sacrifício do que restava de Amazônia no estado do Pará para garantir o aporte do capital que não temos e de que precisamos desesperadamente, segundo o modelo capitalista que seguimos, e que por isso mesmo permite que façamos esse tipo de sacrifício. No Pará, o que resta de floresta está sendo sacrificado. Então o que está acontecendo é uma tentativa do governo Lula de legalizar um negócio que já existia na prática: a entrega do nosso patrimônio florestal à livre ação de devastação por parte do pessoal que lida com isso. Para que, então, esse projeto já que a floresta já está dominada e devastada? Aluízio – O problema é que muitos deles não têm, digamos assim, os documentos de garantia de propriedade. Com uma concessão dessas eles se tornam virtualmente proprietários durante todo o tempo em que durar a concessão. Que vai ser de mais de 50 anos. E nunca mais eles saem de lá porque esse projeto também prevê a possibilidade de renovação. O último regime de concessão de que eu tenho notícia, aliás, não é o último e sim o primeiro que já terminou, foi o da ICOMI – Indústria e Comércio de Mineração, do grupo Bethlehem Steel – no Amapá, que tirou de lá 37 milhões de toneladas de manganês e bateu as botas, foi embora e deixou o Amapá numa miséria pior do que a que existia antes do começo da exploração mineral. O manganês do Amapá talvez tenha sido o primeiro marco da imposição dessa nova idade de contribuição da Amazônia à economia mundial capitalista. E o manganês começou a ser explorado no Amapá a partir da década de 1950, depois de ele ter sido descoberto, entre aspas, na década de 1940.

Imediatamente, como isso significava o começo da guerra fria e, portanto, a determinação dos EUA como império de controlar com rédea curta toda e qualquer riqueza que eles considerassem estratégicas para as necessidades de segurança deles, sobretudo projetos deles de guerra contra aquilo que eles chamavam de comunismo, o Brasil foi obrigado a entregar o manganês do Amapá a uma empresa norte-americana, a Bethlehem Steel, uma das duas grandes controladoras do aço no mundo. São duas as controladoras do aço no mundo: a Bethlehem Steel e a United States Steel, ambas norte-americanas. E esse manganês foi entregue nas mãos da Bethlehem Steel. Quem assumiu isso foi um testa-de-ferro brasileiro que, aliás, foi um dos maiores conspiradores do golpe de 1964, um indivíduo chamado Augusto Trajano de Azevedo Antunes. Esse indivíduo entrou como testa-de-ferro por meio do grupo Caemi, que era de propriedade dele e que depois passou para os netos mediante uma empresa chamada ICOMI. E o governo Dutra fez com que, ao arrepio das propostas que tinham surgido aqui na região para que o manganês fosse explorado por uma empresa estatal, mandou que o manganês fosse entregue a uma empresa privada a partir de uma licitação de fantasia e a ICOMI levou. Ler mais na fonte: ADUNB www.adunb.org.br

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