Berzoini: diminuir desemprego é tarefa difícil, mas não impossível

Para o ministro, a meta é criar o máximo de emprego possível, um objetivo que não é somente de sua pasta, mas do governo como um todo. Leia a seguir a entrevista publicada no último domingo (7) pelo jornal "O Estado de S. Paulo".

Terminamos o primeiro ano do governo Lula com uma taxa alta de desemprego e queda na renda do trabalhador. E agora?

A fase mais dura no combate ao descontrole financeiro que ocorreu no final de 2002 e começo de 2003 já passou. Temos condições objetivas para o crescimento econômico. Isso, na verdade, cria um ambiente propício para a retomada do emprego. No entanto, o crescimento por si só, de maneira geral, não resolve a questão do emprego.

Como o governo vai agir?

Vamos dirigir o investimento público para as áreas que mais geram emprego. É o caso da construção civil. O orçamento do Fundo de Garantia é de R$ 7,5 bilhões este ano, ante R$ 5 bilhões no ano passado. No ano passado, executamos 98% do Orçamento, com as liberações concentradas no último quadrimestre. Essa é uma medida concreta, cujo resultado prático vai se apresentar ao longo do ano. Além disso, teremos a maior oferta de crédito dos bancos públicos: Banco do Brasil, Caixa, BNDES, todos estão com orçamentos de crédito maiores do que em 2003. O Banco do Brasil, por exemplo, está com um projeto de desenvolvimento regional sustentável. Vai atuar, por meio de seus gerentes, como articulador de arranjos produtivos locais para melhorar a eficiência, reduzir o desperdício, melhorar o padrão de financiamento.

Há muita queixa por parte do empresariado de que o custo de contratação é muito elevado. O presidente Lula até tocou nesse ponto, dizendo que a indenização de 40% do FGTS poderia ser discutida. Como está essa discussão?

Acho que o custo do trabalho no Brasil, comparativamente com outros países, é baixo e não constitui obstáculo para a geração de emprego. Mas não temos preconceitos contra mudanças nas regras de encargos trabalhistas. Eu próprio, na Previdência, defendi de maneira acentuada que poderíamos reduzir o financiamento da Previdência via folha de pagamento e carregar para outras bases tributárias. Se analisarmos quanto custa a hora do engenheiro da Embraer, comparado com a do engenheiro da Bombardier, veremos que não é aí que está colocada a dificuldade para o Brasil exportar mais ou ocupar o mercado interno com seus produtos.

Pode-se depreender que o governo não tem pressa?

Não queremos fazer esse debate sob a ótica do custo, mas sob a ótica da modernização das relações de trabalho. Que significa, inclusive, o governo não assumir publicamente uma posição. Nossa proposta é o Fórum Nacional do Trabalho, que vai colocar frente a frente trabalhadores e empregadores para discutir suas posições. O governo vai funcionar como indutor desse trabalho, ajudando técnica e politicamente. Não vejo nenhuma viabilidade de aprovar uma reforma trabalhista que não tenha sido fruto de acordo entre empresário e trabalhador.

Vai ficar para 2005, mesmo?

É virtualmente impossível aprová-la em 2004. Os debates começam neste ano e esperamos que eles avancem. Mas 2004 é um ano de eleição municipal, o Congresso Nacional perde muito ritmo de votação no segundo semestre. Então, se conseguirmos aprovar a reforma sindical este ano, já será uma grande vitória.

O desemprego é um problema também na Europa e lá se discute a questão da regulamentação do emprego. Isso diz alguma coisa para o governo?

No Brasil, a regulamentação não é tão grande assim, se comparada com a européia. Acho que há muito o que organizar e simplificar, mas seria injustiça tratar a questão do emprego no Brasil como um problema de excesso de regulamentação. O problema é que o Brasil passou 20 anos crescendo pouco, menos do que deveria. Particularmente nos últimos oito anos, o maior fomentador do desemprego foi a abertura econômica irresponsável. Passamos quatro anos de populismo cambial, e nisso, a indústria têxtil foi dizimada. O fundamental é combinar uma boa política industrial e de crédito, e acredito que vamos chegar ao final deste ano com um padrão de financiamento da economia brasileira como não se teve nos últimos 15 anos. A taxa básica cairá, os bancos públicos serão cada vez mais capazes de emprestar com segurança, prudência e agressividade no mercado de crédito, e o spread bancário - que é talvez um foco de resistência do setor financeiro privado, até pela indução dos bancos públicos - deve cair também.

Por que o presidente Lula falou que a única coisa que ele considera sagrada são os 30 dias de férias? Ali, ele sinalizou que poderá abrir mão de muita coisa.

Acho que foi um comentário numa situação específica, ou seja, ele estava comentando de maneira bastante leve, numa conversa com jornalistas. Esse é um debate que este governo tem muito cuidado em fazer, até por sua origem e da maioria de seus integrantes. Acreditamos não ser necessariamente uma questão prioritária para nós realizar uma reforma trabalhista pela ótica do custo e sim pela modernização das relações. Nesse sentido, a reforma sindical é um passo importante, porque, à medida que se fortalece a confiabilidade da negociação coletiva, reduz-se a importância do aparato regulatório. Sem fazer desse avanço uma experiência concreta, fica difícil para qualquer sindicalista, qualquer trabalhador, abrir mão das conquistas da Constituição de 88, inclusive salário-maternidade, licença-paternidade, adicional de férias, adicional noturno. São conquistas importantes dos trabalhadores e não são hoje o principal motivo do desemprego.

É possível chegar a uma taxa de desemprego menor do que 10% neste ano?

Acho que é uma tarefa difícil, dado o atual índice de desemprego. Mas não é impossível. Não projetamos meta. A meta é criar o máximo de emprego possível. E esse não é um objetivo do ministério só, é do governo como um todo.

Por que o emprego não responde de imediato à melhoria do quadro econômico?

Setores que têm alto grau de automação têm pouquíssima capacidade de gerar mais emprego quando há crescimento da economia, porque o grau de participação da mão-de-obra na produção é pequena. Há ainda empresas que preferem aumentar a quantidade de horas extras ou trabalhar com banco de horas. Então, quando há crescimento não necessariamente há resposta. No entanto, há setores que não comportam automação, como o comércio, a construção civil. O agronegócio tem tido um crescimento expressivo.

Isso explica por que o desemprego é maior nos grandes centros?

O emprego formal está crescendo mais no interior do que onde a questão do desemprego se torna mais aguda, que são as regiões metropolitanas. Por exemplo: em janeiro, tivemos a geração de cem mil empregos formais. Eles foram criados especialmente no interior. No Estado de São Paulo, houve uma variação positiva de 0,5%. Quando destacamos só a região metropolitana, cai para 0,39%. O emprego surge mais forte no interior do que na capital, em parte pelo bom desempenho da agricultura. Só de empregos no setor agrícola, tivemos um saldo positivo de 11 mil empregos em janeiro, um desempenho superior ao da indústria de papel, têxtil, química.

A política econômica foi responsável pelo agravamento do desemprego?

Ninguém ignora o efeito dos juros no mercado de trabalho. O governo tinha plena consciência de que, embora não desejando esse resultado, ele acabaria acontecendo. Reverteu-se só no fim do ano, quando tivemos queda para 10,9% no índice de desemprego. Essa geração de empregos em janeiro demonstra que começamos o ano numa velocidade importante. Os dados de arrecadação da Receita Federal também demonstram o aquecimento na economia. A arrecadação no FGTS também teve um crescimento importante em janeiro, decorrente inclusive da queda do volume de resgates, ou seja, temos uma velocidade menor nas demissões. Os juros, quando chegaram a 26,5%, significaram um freio na economia. Acredito que o quadro de 2004 é de reversão do que tivemos em 2003, que levou a um pessimismo natural de uma situação de juros altos e a inflação ainda alta.

Tem uma parcela da população para quem o emprego é inatingível, por falta de qualificação ou por causa da idade. Fazer políticas específicas para eles vale a pena?

Acho que sim, mas sempre com uma consciência muito grande da limitação desse tipo de política. Por exemplo: o Primeiro Emprego. Não é só uma política de geração de emprego, porque sabemos que ninguém emprega por causa de uma subvenção econômica, mas porque precisa de mão-de-obra para produzir riqueza ou prestar serviços. Então, esse é um programa que busca compensar um dado da realidade, que é: o desemprego é mais grave entre os jovens de 16 a 24 anos. A pretensão do governo não é solucionar esse problema, dada sua dimensão, mas mobilizar a sociedade para que possamos ter canais de indução do emprego para essa faixa etária. A faixa acima de 40 anos tem o Plano Nacional de Qualificação, um instrumento limitado mas importante para melhorar o grau de empregabilidade dessa população. Mas o fato é que, quando há demanda, essas pessoas voltam ao mercado de trabalho.

Partido dos Trabalhadores

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