Opinião: Brasil - A farsa de sempre

No Senado, deu-se o esperado no caso das denúncias contra seu presidente, Renan Calheiros; isso já era evidente segunda-feira, com a Casa lotada num dia em que a presença de parlamentares é rara. A autodefesa do parlamentar acusado foi um sucesso de público, visível na extensa fila de cumprimentos formada por seus solidários pares.

Não durou sequer uma semana o stress parlamentar causado pelas denúncias da revista Veja.

O espírito de corpo falou mais alto, trovejou na declaração do corregedor da Casa, Romeu Tuma (DEM-SP), - “não quero condenar, mas absolver”. Eis aí, nesta declaração, um inusitado, mas previsível, caso de pré-julgamento favorável. Não bastasse tudo isso, o presidente do Conselho de Ética, senador Sibá Machado (PT-AC), em ação análoga à de advogados que lançam mão de recursos protelatórios, enviou à Mesa do Senado, presidida pelo próprio Calheiros, a representação dos senadores José Nery (PSOL-PA) e Chico Alencar (PSOL-RJ) contra o presidente da Casa. Com esta ação de tão zelosos investigadores fica retardado, senão abortado, o processo no Conselho de Ética.

No âmbito da Operação Navalha, o capo Zuleido Veras já foi libertado e disse que não irá entregar ninguém, e assim, o escândalo da vez empreende a costumeira jornada rumo ao esquecimento, interrompido vez ou outra por um lembrete na imprensa. É assim, vivemos de recordações, invariavelmente amargas.

Não é uma inverdade que os facilitadores das falcatruas de sempre se vendem barato em comparação ao gigantesco prejuízo suportado pelo país, que se reflete na subtração de serviços essenciais à população, especialmente às suas parcelas mais carentes. Segundo estudo da Federação das Indústrias do Estado de S. Paulo (FIESP), divulgado pela ONG Contas Abertas, o custo médio anual da corrupção no Brasil é de R$ 26 bilhões. Um mar de dinheiro tragado pela burocracia, e pela ineficiência do judiciário em tornar efetivas as punições previstas em leis, cujas brechas pavimentam o seguro caminho da impunidade.

Mas como se há de esperar que a mão da Justiça se mostre de fato pesada quando o Supremo Tribunal Federal concede a liberdade a assassinos confessos, autores de crimes bárbaros, como o que esquartejou a namorada? A decisão da Corte se baseou em jurisprudência que estabelece a proibição de prisão preventiva que não esteja baseada em fatos concretos, como se uma confissão não o fosse. O crime foi praticado há quatro anos, mas o julgamento ainda não aconteceu.

Nossas leis são prolixas, um emaranhado em que se confundem o famoso “revogam-se as disposições em contrário” com decretos, portarias, instruções normativas, etc. Mais de setenta impostos, taxas e contribuições infernizam a vida dos empresários e demais cidadãos, além de dificultar sobremaneira a fiscalização, facilitando a vida dos que, pela prática da sonegação, lhes fazem concorrência desleal.

Trocando em miúdos, as leis tributárias servem exatamente para garantir a prosperidade dos que se pautam pela conduta criminosa, de resto avalizada pela expressiva parcela daqueles que vêem com naturalidade a prática largamente disseminada da não emissão de nota ou cupom fiscal, da venda de serviços com duas opções à escolha do contratante: com e sem recibo.

Em quê essa atitude conivente se distingue daquela corrupção mais, digamos, tradicional? Talvez esse cipoal legal seja conveniente a muito mais gente do que supõe o senso comum, e se nada mudou até hoje, se as reformas necessárias não andam, é porque o clamor popular ainda peca pela falta de substância, embora por muito menos do que isso que está aí, há catorze anos, um presidente foi deposto. Mas eleger um só culpado e nele concentrar as energias é fácil, o problema se torna complexo quando o inimigo é difuso, como o são os atuais do Estado brasileiro.

Os obstáculos ao avanço em todos os sentidos, se por um lado são sobejamente conhecidos de tantos quantos acompanham mais atentamente o noticiário, aparecem camuflados para a maior parcela da população. E aí, subtraídos os que se aproveitam da situação, os acomodados, os alienados e os que não têm condições de compreender as razões de nossas seculares mazelas, sobra, talvez, muito pouca gente para exigir mudanças tão necessárias quanto profundas.

Luiz Leitão

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