Desmemoriados e aloprados

* Murilo Badaró – Presidente da Academia Mineira de Letras

Sempre ouvi dizer que os brasileiros não têm memória. Não fora o trabalho de alguns iluminados historiadores, a pesquisar os episódios que deram causa à Independência, à República e à edificação do país, a exemplo de José Murilo de Carvalho que biografou com competência a figura de Dom Pedro II, pouco ou nada se saberia dos construtores da nacionalidade.

Inicio esta crônica com tais palavras a propósito da carta que o ex-presidente Itamar Franco dirigiu ao Ministro Marco Aurélio Melo, protestando contra uso abusivo do horário de propaganda eleitoral pelo partido dos tucanos, descumprindo ostensivamente os postulados da lei que permite às agremiações usarem tempo gratuito na tv e no rádio para exposição de seus planos.

No citado programa, os tucanos fizeram referências inverídicas que causaram desconforto ao presidente Itamar Franco, ao se atribuírem a autoria da lei dos medicamentos genéricos e ao Plano Real. Um “verdadeiro estelionato histórico”, acentuou Itamar. Tendo recebido dele a notícia da carta dirigida ao presidente do TSE, sugeri-lhe um pedido do direito de resposta, pois as alegações tucanas, ao distorcerem a verdade histórica, provocaram danos em sua imagem, pelo que era cabível a postulação através de advogado. Ficou de pensar no assunto.

Fosse eu, no seu lugar, não demoraria em postular meu direito de resposta, pois o Plano Real foi criado por ele e não por Fernando Henrique Cardoso, que nem mais era Ministro da Fazendo quando do seu lançamento, elaborado por técnicos sem qualquer filiação partidária e também ministros de diversos partidos que compunham seu governo. Instituído por Itamar quando presidente e referendado pelo então Ministro Rubens Ricupero. Seria inverdade negar a participação de FHC quando da construção técnica do plano.

Mas os desmemoriados de hoje recusam a Itamar a verdadeira autoria. Suum cuique tribuere, a cada um o que é seu, diz o velho princípio do direito romano. Pela mesma forma, o programa dos medicamentos genéricos, hoje considerado como um plano atribuído aos tucanos, foi totalmente elaborado no governo Itamar, quando era ministro da Saúde o senador Jamil Haddad, do PSB do Rio de Janeiro.

Discute-se no governo e na imprensa como se tudo houvesse começado a partir do governo FHC. O importante é que ambos, FHC e Lula, tiveram juízo suficiente para manter os dois programas, que respondem hoje pelo controle da inflação e a popularidade presidencial. A desmemória de alguns timbra também em negar a FHC o mecanismo hoje apelidado de Bolsa-Família, nada mais, nada menos do que a recauchutagem do programa da bolsa-escola, bolsa-gás e outras medidas protecionistas, com modificações sofisticadas, que estão levando a construir no país uma casta de desocupados a soldo dos contribuintes brasileiros.

O “aloprado” da semana é o Ministro-Chefe da Secretaria de Direitos Humanos Paulo Vanucchi, com sua amalucada proposta de revogação da Lei de Anistia, com a qual foi possível encerrar um período extremamente doloroso da vida nacional e a cessação de hostilidades que impediam a paz entre brasileiros.

Ninguém prestou atenção ao desajuizado ministro e à sua proposta. Ele foi além, certamente com o objetivo de merecer espaços na imprensa que o seu inútil ministério jamais conseguiria, propondo a convocação dos brasileiros apontados pela justiça italiana para deporem no Brasil. Estranha proposição, que insiste em proclamar a não prescrição de eventuais delitos praticados por militares, para estes energúmenos ainda inesquecíveis.

Como conciliar a apalermada propositura ministerial com a imprescritibilidade dos delitos de seqüestro, assalto, assassinatos, classificados de hediondos, praticados por seus colegas de ministério e companheiros de partido, absurdamente premiados com suculentas indenizações. Terá ele força para fazê-los depor? O Sr. Vanucchi ganhou a palma do aloprado do ano. (e-mail [email protected] blog: murilobadaro.blogspot.com)

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