O exemplo chinês

Mauro Lourenço Dias (*)

SÃO PAULO – O fluxo de comércio exterior do País deve retroceder neste ano a um patamar pouco inferior ao registrado em 2007. A estimativa foi feita em meados de junho por técnicos da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), que previram queda tanto nas exportações quanto nas importações, mas com superávit na balança. A três meses do final de 2009, não há por que imaginar que essa previsão não venha a se concretizar.

Em números redondos, a expectativa é que as exportações fechem entre US$ 146 bilhões e US$ 163 bilhões e as importações, entre US$ 124 bilhões e US$ 146 bilhões, com um superávit comercial entre US$ 17 bilhões e US$ 21 bilhões. Não se deve, porém, imaginar que o superáv it comercial é o que mais interessa nas atuais circunstâncias. E que isso seja motivo suficiente para comemorações.

Até porque o superávit será obtido porque houve uma queda maior tanto nas exportações como nas importações. Além disso, o que realmente importa (sem trocadilho) é a corrente de comércio (ou seja, importações mais exportações), que, afinal de contas, sinaliza a geração de atividade econômica. E essa, infelizmente, também foi revisada para baixo, o que significa que haverá maior perda de empregos nos números finais deste ano.

É claro que o superávit econômico é importante para o País, mas já o foi mais em outros tempos, quando o Brasil sofria com falta de divisas e apresentava alto grau de vulnerabilidade externa. Felizmente, essa etapa já foi superada. Hoje, a preocupação maior é gerar atividade econômica, o que se dá apenas com uma corrente de comércio cada vez mais forte. Mas, para este ano, infelizmente, a previsão é que haja uma queda para US$ 271 bilhões, ou seja, uma redução de 27% em relação a 2008, que registrou um fluxo comercial de US$ 371 bilhões.

É de assinalar também que o superávit comercial vem se sustentando basicamente porque o País continua a exportar commodities, cujos preços pouco têm melhorado em relação ao que se esperava anteriormente. Nada contra commodities, pois, sem esse tipo de produto na pauta de exportação brasileira, a situação seria ainda crítica. Mas não é preciso ser especialista em comércio exterior já saber que commodities geram poucos empregos, além de serem produtos sujeitos à rápida variação de preços, o que significa riscos a médio prazo.

Em contrapartida, são os produtos manufaturados que geram emprego e, dessa maneira, estimulam também o mercado interno. Mas, por esse lado, não há condições favoráveis que permitam esperar por um aumento significativo das exportações de manufaturados para 2010. Afinal, não se vê nenhuma movimentação por parte do governo federal no sentido de procurar eliminar as barreiras levantadas por um câmbio muito valorizado, que compromete a competitividade e faz com que o País perca mercados, por carga tributária escorchante e por problemas de infraestrutura rodoferroviária e portuária.

Por outro lado, a China começa a surgir como o maior parceiro comercial do País. Nada contra chineses. Pelo contrário. Sem a China hoje, a situação do comércio exterior brasileiro seria ainda pior. Mas deve-se lembrar que a China importa mais de 80% de produtos primários e exporta essencialmente produtos industriais, que vêm competir no mercado interno e até desalojar os produtos fabricados no Brasil das prateleiras de países vizinhos e outros.

Sem contar que a China também investe firmemente na África tanto na produção de alimentos quanto na exploração de minérios, o que indica que pretende diversificar seus fornecedores. Em outras palavras: em breves anos, o Brasil também pode ser desalojado como fornecedor de commodities para os chineses.

O que fazer? Em momentos difíceis como esse, o poeta Manuel Bandeira (1886-1968) costumava recomendar que se tocasse um tango argentino. Esta poderia constituir uma boa tirada literária, uma boutade, mas nunca uma solução. Portanto, o que é preciso é o governo sair a campo. E, quem sabe, levar o BNDES a rever a sua política de financiamento e investir mais nos setores que precisam produzir e exportar manufaturados, gerando divisas e empregos.

Afinal, se os chineses vêm dando exemplo ao mundo de como elevar a sua corrente de comércio a números estratosféricos é porque o governo de seu país fez de sua política comercial externa uma prioridade. Esse é o caminho.

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(*) Mauro Lourenço Dias é vice-presidente da Fiorde Logística Internacional, de São Paulo-SP, e professor de pós-graduação em Transportes e Logística no Departamento de Engenharia Civil da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

E-mail: [email protected] Site: www.fiorde.com.br

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