Europa responde ao referendum grego: "É uma triste decisão"

Na sequência do anúncio pela Grécia, ontem, da "opção nuclear", quando, em dramático discurso após a meia-noite, o primeiro-ministro grego Tsipras anunciou que a Grécia conduzirá um referendum no próximo domingo, 5 de julho, o mesmo governo grego deixou bem claro como o governo grego quer que os gregos votem. 

Primeiro, foi o ministro grego de Energia, Panagiotis Lafazanis, presidente do movimento Plataforma da Esquerda do SYRIZA, que disse, em comentários à televisão estatal ERT TV, que um voto "não" pelo povo grego em 5 de julho "abrirá o caminho para um novo futuro para o país", acrescentando que "o dilema sobre os quais os gregos se manifestarão é "se vivem melhor, ou não. O povo grego sabe bem das dificuldades de um novo recomeço, estamos prontos a suportar o novo esforço nacional."

Em seguida, foi a vez do ministro da Saúde e da Segurança Social Dimitris Stratoulis, a repetir, na mesma ERT-TV, que os gregos estão tendo a oportunidade de decidir o caminho adiante e "estou otimista" que darão como resposta um "retumbante" não, às exigências "provocativas" dos credores do país. "A única questão é a que estão sendo posta ao povo no referendum." Ficou mais claro quando disse que "os gregos têm de votar se o país deve converte-se, ou não, em colônia dos credores." 

Bem, se se formula assim a pergunta do referendum, nesse caso, sim, é bem clara a direção em que os gregos votarão.

Como se podia esperar, os partidos da oposição grega, exceto o "Aurora Dourada", de inspiração nazista, manifestaram horror ao referendum. O principal líder da oposição conservadora Antonis Samaras acusou o governo radical de esquerda de Tsipras de pregar uma saída do país da Eurozona e da União Europeia. "O Sr. Tsipras levou o país a um impasse absoluto" - disse ele. - "Entre um acordo inaceitável e sair da Europa."

Por quê? Porque sabem que, apesar da cartada do referendum, que é claramente uma tentativa de último recurso, de Tsipras, para salvar sua carreira política, entregando a decisão diretamente ao povo, se o resultado da votação for "Sim" ao resgate proposto, nesse caso o SYRIZA está fora e é preciso convocar novas eleições.

Quanto à razão pela qual Tsipras viu-se forçado a chutar direto ao gol, arriscando tudo, é simples: no coração do fracasso da negociação em curso na Grécia está a incapacidade do povo grego para decidir o que deseja: segundo recentes pesquisas, 80% dos gregos querem ficar na Eurozona e manter o euro como moeda; o problema é que também 80% dos gregos quer o fim do arrocho [não é 'austeridade': é arrocho]. As duas condições são mutuamente exclusivas. Não é surpresa pois que Tsipras não esteja recebendo nenhum sinal da sociedade sobre como proceder, considerada a plataforma com a qual foi eleito.

Assim sendo, e tudo isso posto, a questão era como a Europa responderá a esse anúncio chocante e pós-hora fatal (metaforicamente e também literalmente, porque 5/7 vem depois de esgotado o prazo de 30 de julho, para o qual a Grécia precisaria já ter acordo assinado com os credores). Convenientemente, só se ouviu comentário relevante hoje, quando o ministro das Finanças da UE reuniu-se mais uma vez em Bruxelas, para finalizar o acordo grego, que agora está claramente voltando à discussão, e, em vez de concluir acordo, teve de responder sobre reações europeias à proposta do referendum

Eis algumas das respostas chave:

Primeiro, o ministro finlandês das Finanças Alexander Stubb que disse aos repórteres que "basicamente estamos fechando as portas a quaisquer outras negociações". O ministro finlandês estava em Bruxelas, para uma reunião de ministros das Finanças da Eurozona, e acrescentou que o Eurogrupo opõe-se a qualquer programa de prorrogação. Disse também que o "Plano B está virando Plano A. Não podemos prorrogar ainda mais o programa. Não há coisa alguma a discutir sobre a mesa. Teremos de ver o que o próximo passo implica para a Grécia."

Perguntado sobre se a Europa imporá controles sobre os capitais na Grécia, depois das cenas dramáticas que mostravam longas filas nas caixas de atendimento automático dos bancos na Grécia, depois do discurso de Tsipras, ele disse que "Não estamos em condições de decretar feriado bancário na Grécia, nem nos compete anunciar controles sobre capitais na Grécia".

Depois foi a vez da antiga nêmese de Varoufakis, Dijsselbloem, que disse que os gregos "parecem ter tomado a posição negativa quanto à última proposta das três instituições e basicamente rejeitou as propostas." 

"É decisão muito triste, porque a porta em nossas mentes ainda estava aberta para concluir as conversações" - Dijsselbloem também disse a jornalistas em Bruxelas. "E agora, dada a decisão deles, estão propondo fazer um referendum, mais uma vez dando conselhos errados ao povo grego. Essa situação é muito triste."

"Vamos saber do ministro grego hoje se tudo isso é bem assim, embora acreditemos que sim, é bem assim, e depois falaremos sobre as consequências que advirão."

Claro que nenhuma resposta seria possível antes que o ministro das Finanças alemão Schauble jogasse o usual balde de água gelada na cabeça dos gregos e foi o que ele fez. Disse que "nós já não temos base alguma para qualquer negociação."

"Viemos hoje realmente para tentar negociar posição unificada com a Grécia, mas o governo grego, se entendo corretamente, pôs fim unilateralmente às negociações. Temos de ver que situação é essa. O programa expira dia 30 de junho. Sabemos da situação com os bancos gregos. É questão de conversas entre a Grécia e o Banco Central Europeu. Mas também discutiremos isso. Mas no momento temos de discutir tudo, e por isso concordamos em nos reunir nessa tarde." 

Sobre perguntas sobre Plano B: "O que significa Plano B? Que a Grécia abandonou as negociações, a mesa de negociações. Quer dizer que estamos numa situação na qual o programa termina 3a-feira, porque não há negociação sobre coisa alguma."

Houve rápido interlúdio cômico, quando alguém perguntou ao ministro de Finanças esloveno Peter Kazimir o que esperava de Yanis Varoufakis, e o ministro respondeu "mais lições de moral". Em seguida Kazimir deixou claro que, se o governo grego rejeitar a proposta, o que efetivamente já foi feito, com a convocação do referendo, nesse caso "o programa está acabado".

Mas o maior problema da Grécia foi formulado como segue por um funcionário da UE não identificado, citado por Bloomberg, que disse que os ministros de Finanças da Eurozona dificilmente prorrogarão o programa de ajuda à Grécia, com o primeiro-ministro Alexis Tsipras considerando um referendum. Acrescentou que "algumas nações não aceitarão qualquer prorrogação".

O ministro das Finanças belga Van Overtveldt confirmou exatamente isso, ao dizer que "não temos três semanas; só três dias. Isso é algo de que todos e o governo grego devem ter em mente. Perderam tanto tempo nas últimas semanas, e agora chegamos ao ponto em que só restam três dias. Não podemos prorrogar seja qual for o procedimento, nem que queiramos, por 30 de junto está próximo, já está aí. 30 de junho é o fim do programa. Teremos de decidir tudo hoje." Infelizmente, já não é possível, dados os eventos que a Grécia pôs em movimento.

Perguntado sobre uma possível prorrogação do programa grego para depois de 30 de junho, Van Overtveldt disse: "Não me parece possível".

E assim chegamos ao gigantesco problema que o povo grego terá de enfrentar e o modo como o referendo está proposto: porque acontece cinco dias depois do 30 de junho, quando expira o programa de resgate distendido; por isso, não haverá nenhum programa real para servir como "referência", especialmente depois que a Europa deixou claro, hoje, que a menos que haja acordo hoje - o que já parece impossível -. não haverá qualquer programa oferecido no dia 5 de julho.

Para orientação, segue aqui o que os gregos estarão votando, segundo a proposta do gabinete do primeiro-ministro, postada no website do Parlamento. 

"O povo grego fica aqui convocado a decidir se aceita um rascunho de acordo apresentado pela Comissão Europeia, pelo Banco Central Europeu e pelo Fundo Monetário Internacional, na reunião do Eurogrupo realizada dia 25 de junho e que consiste de dois documentos: 

- O 1º documento é intitulado "Reformas para Completar o Atual Programa e adiante"; e

- o 2º documento é intitulado "Análise Preliminar da Sustentabilidade da Dívida."

Os cidadãos que rejeitam a proposta das instituições votam "Não Aprovado" / NÃO 

Os Cidadãos que aceitam a proposta das instituições votam "Aprovado" / SIM.


Há alguns momentos, Varoufakis foi citado, dizendo que pediria uma extensão de algumas poucas semanas no prazo para pagamento da dívida, para acomodar o referendum

O resumo da ópera: se o Eurogrupo diz "Oxi" ["Não"], nesse caso colapsa completamente o gambito grego - que aposta em que, para a Europa, o custo-oportunidade de uma Grexit é mais alto que ceder às demandas dos gregos. 

Se o Eurogrupo nega o pedido de Varoufakis, simplesmente não poderá haver referendum algum, porque a "proposta das instituições" já não estará sobre a mesa. Assim sendo, a única questão é se o Banco Central Europeu também encerrará a Assistência Emergencial à Liquidez [orig. ] à meia-noite de 30 de junho, acrescentando insulto à injúria e levando ao colapso os sistema bancário grego, dias antes de um referendum cujo propósito já não existirá. 

Mas isso seria suicídio para o projeto europeu, porque põe em movimento o processo de saída da Grécia da Eurozona ("Grexit"). Com isso a "União Europeia" passa a não ser mais que "DES-união", como dirão os teóricos do jogo grego, e a crise será levada, da Grécia, para Itália, Espanha e Portugal, no que, para aqueles teóricos gregos, é o pior resultado possível para o Banco Central Europeu? 

Bem, não é exatamente assim.

Relembremos o postado da semana passada "Goldman's "Conspiracy Theory" Stunner: A Greek Default Is Precisely What The ECB Wants" [Teoria da Conspiração e Suspense, de Goldman: calote grego é exatamente o que o Banco Central Europeu quer], que sugerimos que todos leiam ou releiam, especialmente os que pensam que o Banco Central Europeu e portanto a Troika cederão, no último segundo, às demandas gregas. 

Porque uma Grexit, pelo menos de acordo com Goldman, pode ser exatamente o que Mario Draghi sempre quis desde o início. A única questão é sobre quem recairá a culpa pela 'queda' grega. Convenientemente, com o anúncio do referendum, parece que a Grécia piscou no jogo da culpa e, agora, a Europa poderá dizer que a culpa é exclusivamente dos gregos , que eles próximos excluíram-se da Eurozona - o que será como dar luz verde ao Banco Central Europeu para expandir seu "alívio quantitativo à liquidez", esmagar o euro e - supostamente - gerar mais crescimento para a Europa, com a Grécia entregue à própria sorte, fora da união monetária. 

E tudo isso, evidentemente, se os gregos votarem "Não" no referendum. E se votarem "Sim" - possibilidade bem real, consideradas as pesquisas recentes, pode talvez já ser tarde demais, o que gerará crise política, mais dificuldades, novas eleições e miséria sem fim fora da Eurozona. Assumindo que a Troika aceite a Grécia de volta, evidentemente sem o Syriza no poder, claro. 

Aconteça o que acontecer, se insistirem, os gregos só terão eles mesmos para culpar, seja qual for o resultado. Mas a tragicomédia grega, que já se arrasta agora por mais de cinco anos, talvez chegue ao fim. *****

27/6/2015, Tyler Durden, Zero Hedge

 

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
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