Avigdor: um fascista entre nós

por Lejeune Mirhan*

Esteve entre nós brasileiros uma figura asquerosa, nefasta, um fascista e racista, que atende pelo nome de Avigdor Liebermann. Ele é o Chanceler de Israel, na coligação governista mais conservadora e direitista em 61 anos de existência. Pertence a um partido político que defende a subordinação dos palestinos ao estado de Israel, que estes jurem fidelidade e subserviência ao estado judeu! Pois, essa figura, passou pelo Brasil em um giro pela América Latina nos dias 21 e 22 de julho. Sobre essa visita é que quero falar hoje.

Omerttá: o pacto de silêncio da mídia

Todos nós sabemos que na máfia italiana, em especial na Sicilia existe um conceito chamado de omerttá. É um pacto de silêncio feito entre os mafiosos, em especial os que são presos. Não podem nunca abrir a boca, contar nada. Devem se calar para proteger a organização criminosa. O rompimento desse pacto do silêncio implica na morte, na execução sumária ou mesmo, se preso, em mortes na família.

A chegada de Liebermann ao Brasil foi cercada do maior silêncio, do maior sigilo jamais visto com a visita de um chefe de estado ao nosso país. Mas – atentem bem – ele não é chefe de estado. É um ministro de um governo apenas. As informações foram as mais desencontradas possíveis. Parece que – de forma proposital – a grande mídia escondeu ao máximo essa viagem para que manifestações de repúdio não fossem organizadas em nenhuma capital, em especial SP e Brasília.

Um silêncio profundo. Até se ele iria primeiro para Brasília para ser recebido por Lula e viria à Sampa primeiro e depois DF. Passamos – eu e várias outras pessoas – o dia 21 de julho, terça, o dia todo, desde cedo, na Internet, sites de notícias e de pesquisa na rede, procurando algo que nos indicasse a agenda dessa pessoa em nosso país. Nenhuma linha.

A primeira notícia, porém, nos chega ás 16h38, dando conta que Liebermann já tinha chegado a Sampa, sido recebido pelo governador Serra, almoçado na FIESP com empresários e a mesma noticia dava conta que ele havia chegado a Cumbica, Guarulhos, ás 6h30. Ora, dez horas se passaram e nenhum site noticioso deu uma linha sequer da sua agenda, cercada do maior mistério. Não posso conceber que jornalistas não cobriram a sua chegada desde o aeroporto e esperaram dez horas para fazer a primeira nota para a Internet, para os jornais on line.

Isso sem falar no aparato de segurança mobilizado pelo governo brasileiro em seu favor. Se os esquemas da polícia federal mobilizam de dois a quatro agentes para proteger chefes de estado – veja bem, chefes de estado – para Liebermann a PF destacou 15 agentes federais, nove carros da comitiva oficial, sendo que dois blindados. Mas a chefia das operações ficou à cargo do Shabak, Serviço de Inteligência e Segurança de Israel (diferente do Mossad, Serviço Secreto).

Agentes desse órgão de espionagem e repressão de Israel chegaram já desde o domingo – fala-se em pelo menos quatro – que vasculharam todos os locais onde ele cumpriria agenda em SP e DF. Na véspera, segunda, dia 20, chegaram outros quatro. Ou seja, o governo brasileiro e toda a mídia, tinha conhecimento do roteiro, da visita, dos locais de reuniões etc. Mas, sistematicamente, esconderam isso dos brasileiros. E o que é pior: é uma clara violação de nossa soberania, entregar a segurança de um ministro estrangeiro, à agentes policiais de outro país como foi o caso. Uma verdadeira aberração diplomática.

Essa figura, além de asquerosa e perniciosa, anti-semita (pois é, ser contra palestinos, que também são semitas, é ser anti-semita!), vai ficando cada vez mais isolado e criando problemas cada vez maiores ao primeiro Ministro Benjamin Netanyahu, conhecido como Bibi. Ele vem sendo investigado por diversos órgãos na sua própria terra, Israel, por fraude e lavagem de dinheiro.

Possíveis objetivos da visita

Não se sabe ao certo. A grande mídia e a própria entrevista que o chanceler concedeu no dia 22 de julho, após a visita ao presidente Lula, o discurso oficial é de que ele viria para “alertar o Brasil sobre a aproximação com o Irã”, ao qual, como os EUA, Israel considera “terrorista”. E isso vale para os países da América Latina que ele pretende visitar depois do Brasil. Tudo cortina de fumaça.

Isso é dizer uma coisa para esconder outra. Mostrar o Irã como o maior perigo hoje é tática de Israel para não negociar com os palestinos o direito inalienável de seu Estado. Não há um pais no mundo hoje que não apoie essa proposta, da solução de dois estados. Na verdade, Israel veio para esse giro para quebrar o profundo isolamento político e diplomático a que estão submetidos desde a posse de Bibi há alguns meses.

Até os Estados Unidos já ordenaram que cessassem as ampliações e as construções de novas moradias e assentamentos nos territórios ocupados. Há dezenas de resoluções da ONU nesse sentido. Mas, Israel não cumpre nenhuma. E não há força política hoje no mundo que os obrigue a tanto. Nem a retórica e o discurso de Barak Obama. Aliás, se mostrando cada dia mais um governo de retórica do que de ações práticas e concretas.

De meu ponto de vista, há outros objetivos na “missão” do chanceler racista e fascista. Um deles seria contatar líderes da comunidade e empresários, de origens judaicas ou não, par que invistam em Israel, que enviem recursos para lá, pois a economia israelense vem sofrendo muito mais do que a maioria dos países, coma crise econômica.

Por fim, acho também que houve pedidos expressos para que o Brasil se empenhe em aprovar no Senado a proposta de Tratado de Livre Comércio do Mercosul com Israel. Tal tratado tem apoio mais explícito da Argentina e há pedidos do governo desse país para que o Brasil aceite o acordo. Todas as entidades representativas da sociedade brasileira condenam a assinatura desse acordo. Um dos poucos pontos de unanimidade entre estas entidades.

O governo Lula

Não me cabe dizer o que o governo Lula deve fazer ou não fazer com relação ao Estado de Israel. O pouco que sabemos é que o presidente desse país, Shimon Peres, chega ao Brasil em novembro e que Lula visitará Israel até o final do ano. Sabemos bem a força e as pressões que fazem os judeus sionistas em todo o mundo sobre todos os governos. Isso vale para os Estados Unidos como vale para o Brasil. Sabemos até mesmo a força que possuem na mídia em geral, grande imprensa, partidos políticos, parlamento no país. Assim, entendo até como natural que Lula receba essa figura controversa que, apesar de tudo, representa um governo legítimo eleito.

O Estado de Israel comercializa pouco com o Brasil. Não chega a dois bilhões de dólares. Os países árabes, com mais de 300 milhões de habitantes, comercializam cinco vezes mais, mas esse é um movimento que cresce a cada dia. O mais importante nesse processo é que o Brasil deixou claro a sua posição ao chanceler. De que apoia com firmeza a criação do Estado palestino e que não aceitará nenhuma pressão para que alguém de fora venha nos dizer como devemos nos relacionar com o Irã, um país amigo do Brasil, com quem temos boas relações e interesses comerciais.

Agora diversos outros países e chefes de estado e de governo se recusaram a receber o polêmico chanceler. Barak Obama foi um deles, tal qual Nicolas Sarkozi, na França. Claro que não podemos comparar a força desses países com a do nosso país. No caso dos Estados Unidos, quem recebeu Avigdor foi a secretária de Estado, Hilary Clinton. A coletiva que deram juntos foi emblemática. Ela falava uma coisa ele desdizia de outro lado, contestando a posição da chefe da diplomacia estadunidense, que ficou muito irritada com isso. Ao término do evento, Hilary acabou tropeçando e caindo, quebrando o braço. Nos bastidores dizia-se que Liebermann a havia empurrado. Hoje a sua figura é tão controversa que o governo de Netanyahu resolveu ele próprio representar Israel na Assembleia da ONU em setembro, tamanha a rejeição mundial a essa pessoa.

Essa visita de Liebermann ocorre em momento delicado e especial. No mundo e no Oriente Médio. O clima segue tenso na região, pois não há perspectivas de paz. Os palestinos nem negociam mais, pois não há propostas concretas de solução para os seus problemas e suas reivindicações mais do que justas. A colonização esta em franca atividade. Agora mesmo o ex-primeiro Ministro, Ehud Barak, escreveu artigo no The Washington Post (1) defendendo abertamente a continuidade dos assentamentos e afirma que sempre teve apoio dos Estados Unidos para essas atitudes.

Acho que a diplomacia brasileira adotou uma posição extremamente pragmática ao receber persona tão não grata como essa controversa figura, que chegou a defender o uso de armas nucleares contra os palestinos na Faixa de Gaza nos ataques de dezembro e janeiro passado. E isso deve ter sempre limites. Essa atitude pode irritar parceiros muito mais importantes e estratégicos, como os países árabes e ficarmos isolados da imensa comunidade árabe e seus descendentes no Brasil.

Também quero registrar que lamento que apesar do pacto de silêncio da mídia acerca da agenda da visita, nós, participantes de entidades representativas de partidos políticos e de todos os segmentos sociais no Brasil não tenhamos conseguido fazer sequer uma manifestação, ainda que pequena, de protesto contra essa visita.

Nota

(1) “Discussão sobre assentamentos é inútil”, publicada domingo no Estadão do dia 19 de julho, domingo, página A18.

*Lejeune Mirhan, Presidente do Sindicato dos Sociólogos do Estado de São Paulo, Escritor, Arabista e Professor Membro da Academia de Altos Estudos Ibero-Árabe de Lisboa, Membro da International Sociological

Texto: Lejeune Mirhan/Vermelho /

http://www.patrialatina.com.br/editorias.php?idprog=861637a425ef06e6d539aaaff113d1d5&cod=4566

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
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