Guerra geopolítica contra a Venezuela (1/2)

Desde o governo do falecido presidente Hugo Chávez, a Venezuela é o mais brilhante farol, no Hemisfério Ocidental, a favor de uma nova ordem multipolar. Embora o Brasil seja muito maior e muito mais rico, alguns países latino-americanos mostraram-se temerosos da crescente influência dos brasileiros, acreditando que o discurso pró multipolarismo seria apenas slogan para justificar o avançosoft de Brasília sobre mercados e recursos regionais; e para ocupar a posição no continente que historicamente sempre foi de Washington. 


A Venezuela é portanto modelo muito mais atraente para a América Latina, porque é claramente motivada por considerações de caráter político, e a língua e a história comuns, como ex-colônias espanholas, dão a todos os países latino-americanos um grau de familiaridade e conforto, com a Venezuela, que não experimentam plenamente com o Brasil.

A riqueza em recursos naturais com que a Venezuela conta torna-a capaz de expandir sua influência por toda a região, o que está institucionalizado na constituição da Aliança Bolivariana, ALBA. Por essas mesmas razões, a Venezuela é alvo direto dos ataques do unipolarismo norte-americano, já há vários anos, e de continuada tentativa assimétrica para produzir ali uma Revolução Colorida - e a campanha anti-Venezuela movida pelos EUA também têm dimensões geopolíticas bem concretas. 

Três países (Cuba, Colômbia e Guiana) estão sendo usados como agentes avançados de desestabilização, para influenciar contra a Venezuela, e cada um deles tem papel específico no projeto estratégico dos EUA. Tomados em conjunto, o relacionamento dos EUA com cada um desses é a base de um tipo de coalizão de contenção contra Caracas, que, se deixada sem resposta, podem, no conjunto, levar ao desmembramento da ALBA e ao estacionamento de unidades norte-americanos (de solo e navais) bem próximas das fronteiras venezuelanas.

O artigo começa por apontar como cada um desses três estados está sendo usado pelos EUA para conter a Venezuela; na primeira parte, mostra, antes como Cuba e Colômbia estão sendo contidas. A segunda parte começa por expor em detalhes o papel da Guiana em tudo isso e, na sequência, resume as consequências estratégicas da emergente contenção trilateral da Venezuela. Por fim, o artigo oferece um conjunto de recomendações políticas a serem seguidas com urgência por Caracas, se deseja sobreviver à iminente intensificação de pressões estratégicas e militares contra o país.

Cuba usada para causar confusão entre os aliados da ordem multipolar 

Ao final de um ano que já trouxera surpresas políticas como o golpe da EuroMaidan, a Reunificação da Crimeia e o crescimento do chamado Estado Islâmico (ISIL), o presidente Obama anunciou que EUA e Cuba haviam trabalhado em negociações secretas, para restabelecer relações diplomáticas. Na ocasião, eu mesmo alertei a opinião pública, principalmente os pró-Cuba, para que não abrissem mão da mais extrema cautela e não se pusessem a apresentar o 'evento' como uma vitória de Cuba. Na ocasião, lembrei  que os EUA não tomaram aquela decisão no vazio, e que havia claras motivações políticas ali, especificamente, o interesse em dividir a ALBA e desestabilizar os demais estados-membros (especialmente Nicarágua e Venezuela). Ainda mais a fundo, investiguei as consequências estratégicas daquele movimento e mostrei que Raul Castro corria o risco de pôr a perder toda a Revolução Cubana; na conclusão, escrevi que, na essência, Cuba rendia-se sem luta, depois de meio século de valente resistência, que fizera daquele país ator lendário na consciência do mundo.

Todo o episódio foi apresentado como uma vitória de Cuba contra os EUA, mas a realidade sempre foi o exato oposto disso. Os EUA engoliram satisfeitos a 'perda', para assim estrategicamente desarmar o resto dos estados multipolares do Hemisfério Ocidental, que foram induzidos a crer que, se Cuba, um dos líderes globais da resistência política contra os EUA, podia assinar um acordo com os EUA... por que outros não poderiam? A atmosfera prematura de celebração e a absurda proclamação, feita por Raul, de que "Obama é homem honesto", induziu muita gente na região a esquecer que o primeiro golpe de Obama foi realmente contra  Manuel Zelaya de Honduras em 2009; e de como os EUA exploraram a catástrofe do Haiti em 2010, para ocupar o país indefinidamente. Contudo, porque o ato foi assinado por dois governos soberanos, o resto do mundo, mesmo quem tivesse tido suspeitas geoestratégicas sobre o movimento de Raul Castro, e rapidamente tivesse identificado o ridículo da retórica 'pró-Obama', foram forçados a distribuir declarações de apoio que ecoaram o sentimento reacionário global.

Que mané 'povos do mundo'?! Nada aí parece confiável. Sinceramente [NTs]
https://twitter.com/teleSURtv/status/623311184679190529/photo/1


O passo que os EUA deram na direção de Cuba visou a três objetivos, dois dos quais já foram alcançados:

- Criar confusão ideológica

Washington conseguiu semear confusão entre estados multipolaristas na região, os quais foram forçados a reavaliar o compromisso ideológico com a oposição aos EUA, quando Cuba anunciou, repentinamente, que estivera em negociações top-secret justamente com aquele inimigo, já há vários anos. Países como a Venezuela passam a ter de considerar caso a caso as circunstâncias em que venham a assinar algum acordo com os EUA, se houver ocasião. Terão de esperar que haja ameaças explícitas? Ou só depois de um golpe de 'revolução colorida' já ter sido tentado em Caracas? E se se configurar pesada guerra econômica? O que interessa ver aqui é que, se, antes, a ideia sempre fora encarar os confrontos o mais possível, usando Cuba como inspiração, todo o paradigma mudou, quando Havana abriu negociações com Washington e, agora, opera uma rendição negociada de tipo que não só parece ideologicamente possível, mas talvez até admirável [ou, mesmo, recomendável!].

- Empurrar a Venezuela para uma posição de 'concessões'

Continuando na trajetória do primeiro objetivo, os EUA querem pressionar a Venezuela a ponto de o país ser forçado a aceitar algum acordo de rendição semelhante ao firmado com Cuba, que evidentemente será falsamente propagandeado como 'derrota' para Washington. A Venezuela, estrategicamente vulnerável, por efeito da posição ideológica e geopoliticamente comprometida de Cuba pelo 'acordo' que Raul aceitou, parece até já ter dado passos iniciais nessa direção. 

Segundo matéria da Reuters não por acaso distribuída no mesmo  dia  em que Obama anunciou a data do reatamento de relações diplomáticas EUA-Cuba, o presidente Maduro manifestou-se também, no meio de uma agressiva campanha pró Revolução Colorida,  sobre a designação da Venezuela como "ameaça à segurança nacional dos EUA" e sobre uma tentativa fracassada de golpe, com atentadoplanejado contra a vida do presidente. O presidente obviamente não tentou negociar de uma posição de força; mas iniciou o diálogo, porque, afinal, se Cuba dialogou em circunstâncias pode-se dizer de menor pressão, por que a Venezuela não poderia negociar em situação muito mais grave? Falta ver até onde irá esse processo e se Caracas eventualmente aceitará fazer concessões geopolíticas como forma de 'pagamento de segurança' ao Tio Sam, ou se tudo isso não passa de tática para ganhar tempo. 

Importante destacar aí que esse desenvolvimento não seria sequer imaginável, se Cuba, antes, não tivesse capitulado (no mínimo, no plano simbólico) ante os EUA.

- Fabricar uma crise nas relações Venezuela-Cuba 

Se a Venezuela não aceitar as demandas dos EUA, o mais provável é que os EUA tentem fabricar uma crise entre Caracas e Havana, numa aposta para separar os dois aliados ideológicos à moda do racha entre China e soviéticos, agora para o século 21. Os dois estados estão alinhados dentro da ALBA, mas se emergir alguma fonte de fricção entre eles, talvez derivada da rendição de Raúl aos EUA ou de diferenças que surjam em torno das FARCs, o bloco poderá ser dividido, mais ou menos como aconteceu no mundo comunista, entre China e soviéticos. Dado que a ALBA é muito menor, mais fraca e modelo de integração menos rígido que o bloco comunista, é razoável supor que uma divisão provocada entre dois grandes atores rapidamente possa abalar a aliança, abalando também, ou derrubando, de vez, os governos aliados do multipolarismo que há hoje na Nicarágua, no Equador e na Bolívia. Para que isso aconteça, alguma modalidade de desacordo tem de surgir entre Venezuela e Cuba. Com Cuba tomando o lado dos EUA, nem que seja pela furiosa ânsia por assinar o acordo diplomático, deve-se prever que Cuba dê o primeiro passo para abalar as relações bilaterais, quando eventualmente surgir a hora.


* * *


Em geral, a avaliação, por Cuba, da ameaça que seria a Venezuela, é de natureza estritamente estratégica e não inclui qualquer componente militar, embora não se deva de modo algum subestimar o potencial de desestabilização do pivô para a ilha. A cooptação de Cuba pelos EUA é o relacionamento latino-americano que tem efeitos mais imediatos sobre a segurança nacional da Venezuela, embora indiretamente, uma vez que já está sendo levada para conversas secretas com Washington, depois de ter sobrevivido a um série de Revoluções Coloridas, golpes e tentativas de assassinato. 

A única razão pela qual a Venezuela aceitaria conversar com os EUA depois de tais afrontas à sua soberania (para nem falar da intensa guerra econômica feita contra o povo venezuelano), e sob risco de mostrar-se em contradição com sua orgulhosa retórica anti-EUA, seria no caso de o acordo com Cuba ter mostrado, antes, que é ação aceitável, para países partidários da ordem multipolar, exauridos por tantas dificuldades, jogar a toalha - desde que os EUA, claro, ajudem-nos a sair com honra da negociação; a chamar o resultado de 'vitória'; e a manter, depois, o mesmo 'clima' de antes. 

No futuro, se a Venezuela não se render (o que o país não parece inclinado a fazer), pode descobrir-se envolvida numa competição regional pouco amistosa com seu antigo mentor ideológico, incitado pelos EUA, no que pode levar a, no mínimo, umas poucas baixas nas fileiras dos defensores do multipolarismo (e.g. Equador, Nicarágua) na região.

Criar um casus belli para a Colômbia

A Colômbia funcionou como procurador do "Liderar pela retaguarda" dos EUA, já há décadas, e nada sugere que esse relacionamento seja alterado em prazo curto ou médio. O mais provável é que só se fortaleça, e o ímpeto para isso é a guerra geopolítica dos EUA contra a Venezuela. Sabe-se que os dois vizinhos andinos não têm o que se possa chamar de  história recente de relações cordiais entre eles (embora tenha havido movimentos recentes de aproximação). Em 2008, quase foram à guerra, quando a Colômbia montou operação de forças especiais contra as FARCs no Equador, país aliado da Venezuela. O que se vê é que, sim, já há entre os dois países certa atmosfera de hostilidade e desconfiança que pode ser explorada. Embora os EUA possam com certeza usar a Colômbia como base para operações de desestabilização contra a Venezuela (alocação de forças especiais, guerra de informações, etc.), o verdadeiro potencial do país revela-se mais claramente tão logo o conflito das FARCs seja afinal resolvido.

Nesse ponto, surge uma superposição nos movimentos dos EUA em Cuba e na Colômbia. As conversações de paz das FARCs estão acontecendo em Havana, a qual acaba de pivotear-se rumo aos EUA. Resultado dessa virada na política externa da ilha, é que Washington respondeu e removeu Havana da lista dos 'Estados que patrocinam terrorismo'. A questão é que os EUA oficialmente designam as FARCs, com as quais Cuba teve laços no passado, como organização terrorista, embora reconheçam que Havana não lhes deu qualquer apoio material, motivo pelo qual Cuba foi excluída da tal lista. Está em andamento aí um interessante tango diplomático, porque os EAU removeram Cuba da lista de 'estados terroristas' não só como pré-requisito para o reatamento de relações bilaterais (e para dar a Cuba uma 'vitória' simbólica), mas também na  expectativa de retribuição, elas por elas, com Havana na função de sinceramente pressionar o grupo para que cheguem a um acordo de paz histórico. 

Com EUA, Colômbia e Cuba todos pressionando na direção da paz, cresce a possibilidade de um acordo histórico, o qual, por ter demorado demais, embora teoricamente pareça interessar a todos (inclusive à Venezuela), pode levar a consequências de longo termo negativas, para Caracas.

Eis o plano de quatro etapas, anti-Venezuela, que os EUA gostariam de ver implantado depois de Colômbia e FARCs chegarem a um acordo:

1. Implantação de forças militares colombianas junto à fronteira da Venezuela 

Desde 2002, as FARCs perderam partes extensíssimas do próprio território, e agora ocupam apenasvários nichos distribuídos sem qualquer conexão pelo país. Ainda assim, a existência do grupo e sua campanha recentemente  renovada contra o governo (mesmo à luz das negociações de paz em curso) criam uma situação de menos segurança que a desejável para todo o país, e reduz portanto significativamente o foco militar ao longo da fronteira venezuelana. Mas se as FARCs forem neutralizada, nesse caso os militares colombianos poderão concentrar-se mais na segurança externa do país. Assim sendo, é provável que os militares colombianos fortaleçam suas posições ao longo da fronteira e reforcem áreas estratégicas. No evento de hostilidades futuras contra a Venezuela, os colombianos teriam considerável vantagem e a balança do poder penderia a seu favor, especialmente se Caracas tiver de enfrentar ameaça simultânea pelo front da Guiana (a ser comentado adiante). Ironicamente, essa mudança de situação poria a Venezuela na mesma posição em que a Colômbia esteve em 2008, quando enfrentava dois inimigos (Venezuela e Equador) e à beira de entrar em guerra contra ambos.

2. Mais bases dos EUA

Os EUA já têm um punhado de bases na Colômbia, mas depois de resolvido o conflito com as FARCs, provavelmente expandirão sua rede de bases. A 'justificativa' ostensiva para esse desdobramento poderia ser ajudar o governo colombiano a 'reforçar o controle' sobre as áreas antes rebeladas (derivação do argumento norte-americano para fornecer ajuda militar a Kiev), e não imposta que a presença militar seja permanente, transitória, ou parte de algum programa 'de treinamento' (outra vez, como na Ucrânia). Na essência é tudo exatamente igual. Os EUA não se retirarão da Colômbia exatamente como jamais farão as malas e deixarão a Alemanha, e como continuam sempre a andar para o leste, rumo à Rússia, desde o fim da Guerra Fria na Europa - é exatamente o que farão em relação à Venezuela depois da guerra das FARCs na Colômbia. 

A combinação de deslocamentos militares dos EUA e colombianos e em cooperação íntima, todos esses, ao longo da fronteira da Venezuela levará a situação de segurança a deteriorar-se por ali, o que gerará oportunidades tentadoras para que esses mesmos militares encenem ali um ataque sob falsa bandeira.

3. Colômbia passa a exigir agressivamente a propriedade da Península Guajira e da correspondente área marítima 

Como estão as coisas hoje, a Colômbia controla a vasta maior parte da Península Guajira, com a Venezuela administrando apenas uma pequena fatia ao longo do Lago Maracaibo. Mas, porque controla as ilhas Los Monjes (ilhas rochosas, não habitáveis) na entrada do lago para o Caribe, a Venezuela pode garantir a soberania sobre toda aquela área rica em petróleo, e que é a base de toda a indústria venezuelana de petróleo; e o Golfo da Venezuela, que a conecta com o mundo exterior. A Colômbia cria caso nessa região desde os 1950s , e a disputa ressurgiu mais uma vez, depois que o presidente Maduro assinou o Decreto n. 1.787 de 26 de maio, que cria Zonas de Operação de Integral Defesa Marítima e Insular [uma delas, a Zona Operativa de Defensa Integral Marítima e Insular Occidental (Zodimainoc)] ao longo das fronteiras marítimas com a Colômbia e com a Guiana. Agora, Bogotá irritou-se por ter perdido, por causa de sua relação com a Venezuela, a oportunidade de passar a controlar a rota comercial marítima mais crítica do país vizinho; é perfeitamente possível que a Colômbia tente transnacionalizar a crise, trazendo os EUA para a disputa, como seu aliado. 

Esse é um desenvolvimento que com certeza faria aumentar a pressão geopolítica sobre a Venezuela, e pode até levar os EUA a reforçar suas locações de operação avançada em Aruba e Curacao. Além disso, a 4ª Frota pode até decidir hospedar-se 'temporariamente' nas supermodernas instalações navais colombianas em construção na Tierrabomba, bem perto de Cartagena e com capacidade operacional para a Península Guajira.

4. Empurrar as FARCs para a Venezuela

O passo final do plano ideal de quatro etapas dos EUA na Colômbia seria fazer os militares colombianos 'empurrar' unidades renegadas das FARCs para dentro da Venezuela, preferivelmente num momento em que o país esteja em processo de desestabilização por efeito de alguma Revolução Colorida. Pretextos não faltam - unidades rebeldes das FARCs seriam acusadas de estar operando do outro lado da fronteira e explorando as dificuldades domésticas da Venezuela, o que daria à Colômbia a 'justificativa' necessária para pôr-se a efetuar ataques 'cirúrgicos' em território do país vizinho. Se parece idêntico ao que aconteceu no Equador em 2008, é porque é, de fato, idêntico. Com a Venezuela muito mais fraca do que antes, esses ataques contra a soberania do país poderiam tomar o rumo leste, com a intenção de alterar decisivamente o equilíbrio de poder dentro da Venezuela, a favor dos 'revolucionários coloridos'. Elaborando um pouco mais sobre esse cenário, pode acontecer que os militares colombianos 'rastreiem' os supostos combatentes das FARCs até a Península Guajira, e a intervenção militar resultante, naquele ponto, poderia levar a um fato consumado, com a Colômbia no controle também desses disputados territórios. Esse desenvolvimento levaria a uma mudança de fronteiras marítimas (principal objetivo) que daria à Colômbia o controle sobre o ponto de acesso primário até as críticas reservas venezuelanas de petróleo, o Lago Maracaibo.

Por causa dos benefícios geopolíticos concretos que esse cenário traria, deve-se inferir que qualquer ação anti-FARCs do outro lado da fronteira venezuelana só seria tentada pela Colômbia no caso de a situação doméstica estar em deterioração na Venezuela; ainda mais provavelmente, se se configurar situação de Revolução Colorida parcialmente bem-sucedida. 

De fato, nem é preciso que haja combatentes das FARCs do outro lado da fronteira. Se o aparelho de comunicação da Colômbia (auxiliado pelas redes de comunicação internacional dos EUA, como aCNN) conseguir coordenar uma avançada 'comunicacional' que acompanha a escalada de uma campanha de Revolução Colorida na Venezuela, já conseguiria criar os 'pretextos plausíveis' para, no mínimo, ameaçar intervir no país vizinho. E bastaria isso para encurralar os militares venezuelanos, incapazes de cuidar, ao mesmo tempo, da defesa das cidades onde haja maiores tumultos, e das fronteiras, para impedir qualquer possível avanço sobre seus territórios. 

Implica que, mesmo que a Colômbia jamais entre em território venezuelano, a mera ameaça dessa invasão, no contexto de Revolução Colorida em construção ou já em andamento, poderia bastar para gerar suficiente desequilíbrio que favorecesse as forças anti-Venezuela. A operação de mudança de regime estaria afinal completa com a implantação, na Venezuela, de um governo pró-Colômbia/EUA, que cuide de alterar as fronteiras marítimas e terrestres a favor da Colômbia/EUA.


* * *


A ameaça que vem da Colômbia é clássica ameaça de natureza militar, e visa a conter fisicamente a Venezuela. Por mais que as consequências possam ser severas, praticamente todo o plano para desestabilizar a Venezuela depende integralmente da guerra das FARCs. Quanto mais o conflito se arrastar, mais tempo terá a Venezuela para construir defesas adequadas contra essa intriga político-militar, o que significa que, por mais que a Venezuela seja favorável a um acordo pacífico, a Venezuela simultaneamente obtém alguma vantagem com o prolongamento do conflito. 

Por mais que os EUA possam aprofundar seu envolvimento militar na Colômbia se a guerra das FARCs intensificar-se, podem mesmo assim não conseguir projetar a força coordenada que planeja projetar contra a Venezuela, se o conflito doméstico na Colômbia não estiver totalmente resolvido. 

Além disso, dado que se espera que as forças norte-americanas manterão seu envolvimento na Colômbia depois da guerra, e acabe a guerra como acabar, é melhor - do ponto de vista estratégico da Venezuela - que os EUA continuem ocupados com as FARCs pelo maior tempo possível, antes de passarem a dar total atenção à Venezuela. Mesmo que um tratado de paz seja assinado amanhã, ainda demorará algum tempo para que o governo restabeleça pleno controle em todas as regiões da Colômbia. Isso significa que o cenário acima exposto, de desestabilização anti-Venezuela, é cenário para o qual é preciso preparar-se em futuro próximo (o mais cedo possível), mas é também cenário cujas consequências ainda não se estão configurando - embora, evidentemente, tudo isso possa mudar no caso de inesperada escalada na disputa pela Península Guajira e na disputa marítima correlata [Continua].

 

13/7/2015, Andrew Korybko, Vineyard of the Saker (Parte 1) 


Guerra geopolítica contra a Venezuela: a Guiana (2/2)
13/7/2015, Andrew Korybko, Vineyard of the Saker (Parte 2) [em tradução]

 

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
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