O “furacão Obama” e o desafio dos Negros brasileiros em 2008

S. Paulo - O ano de 2008 começou sob o impacto do “furacão Barack Obama” que, surpreendendo os que ainda duvidavam de seu carisma e poder de mobilização, venceu com folga, as prévias no Estado de Iowa, as primeiras das primárias que decidirão quem será o candidato do Partido Democrata, depois da devastação da Era Bush, nas eleições americanas de novembro.


O senador pelo Estado de Illinois, deixou para trás, num distante terceiro lugar, a ex-primeira dama Hillary Clinton, que ainda aparece como favorita na disputa no âmbito nacional, apesar do crescimento de Obama. “Nós estamos escolhendo a esperança em vez do medo. Estamos escolhendo a unidade, não a divisão, e enviando uma poderosa mensagem de que a mudança está chegando para os Estados Unidos”, disse ao celebrar a vitória.


A vitória de Obama na primeira prévia americana, com o voto majoritário dos jovens e das mulheres, em um Estado cuja população é 93% branca, é emblemática. Não é o fim da disputa para ver quem será o candidato do Partido Democrata, mas apenas o começo. O Estado tem apenas 57 dos 2.500 que indicarão o vencedor na Convenção Nacional do Partido Democrata, em agosto. È inegável, no entanto, que pode representar uma tendência para os negros em todo o mundo, inclusive no Brasil, onde, este ano, também teremos eleições.


O “furacão Obama” nos diz que é possível e necessário – respeitadas as nossas naturais divergências, seja de que tipo forem – construir pontos de unidade em favor do combate sem trégua à desigualdade racial, que permeia o nosso país de cima abaixo, e explica o oceano da desigualdade social em que estamos afundados.


As eleições municipais deste ano serão um bom momento para avançar. É fundamental que em todos os 5.561 municípios brasileiros se lancem candidatos (as) negros (as) para as Câmaras municipais e Prefeituras. É preciso sair do discurso que constata para a prática que transforma. É preciso transformar reflexão em ação, sem o que a Abolição que este ano fará 120 anos, não será concluída.


Em todas as cidades brasileiras há negros e negras, dignos, trabalhadores, honestos. Gente que de sol a sol sofre as humilhações cotidianas do racismo e da discriminação; que enfrenta as desvantagens do verdadeiro apartheid que divide o Brasil em dois: de um lado, 49,7% da população branca beneficiária das vantagens de 350 anos de escravismo e de 120 de racismo; de outro 49,5% negra, penando a desvantagem de ser negra e pobre, ganhando menos, morando mal e morrendo precocemente, seja pelas balas da Polícia, seja pelas condições de vida precárias que encurtam o seu tempo de vida.


Os 92 milhões de afro-brasileiros, homens e mulheres, que sofrem essa desvantagem podem e devem começar a reagir com a arma do voto, em todas as cidades, em todos os Estados, em todo o país.


Para isso é fundamental que comecemos, desde já, a preparar em todo o país, candidaturas negras a vereador e a prefeito, comprometidas com o fim da desigualdade. No Rio, o ator negro Jorge Coutinho, presidente do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Estado do Rio de Janeiro (SATED-RJ) saiu na frente para disputar as prévias no PMDB. Quer ser candidato para falar e fazer política para a maioria negra, como ele, vítima da desvantagem.


O exemplo pode ser seguido em cada cidade deste país. Em todos os Estados. Obama, que pode virá o primeiro presidente negro do país mais poderoso da terra, é o sinal de que podemos. Barack, nome africano, que significa bendito, deve se transformar numa senha de que todos podemos começar a mudar a realidade de miséria e opressão que atinge a maioria negra neste país. Afinal, se um negro como nós, pode se tornar o Presidente da Nação mais poderosa da terra, porque um negro brasileiro não pode se tornar vereador ou prefeito de qualquer grande, média ou pequena cidade do país?


Da nossa parte, na Afropress, estamos lançando uma campanha para apoiar candidatos e candidatas negras e anti-racistas. Trata-se de uma Campanha Nacional pela Participação Negra na política. Independente de partidos, independente de posições políticas ou crenças religiosas.


A base da campanha é ser negro e anti-racista e assumir o compromisso com três pontos: a defesa do Estatuto da Igualdade Racial e da mobilização pela sua aprovação junto ao Congresso; a defesa das Ações Afirmativas em todos os setores de atividade, incluindo a Educação, a mídia e o mercado de Trabalho; e a defesa da nacionalização do Feriado de 20 de Novembro, em todo o país.


Assumidos estes três pontos, o espaço da Afropress estará à disposição para o apoio, a fim de que tenhamos em Outubro nas eleições deste ano, uma avalanche de novos prefeitos e vereadores negros, comprometidos com a Causa da Igualdade Racial e com o combate à perversa desigualdade social, que é sustentada e mantida por séculos de racismo e discriminação.


Que cada negro e cada negra neste país, desperte dos efeitos de séculos de opressão e transforme a participação política numa arma para as mudanças que há séculos vem sendo adiadas. Nós, a exemplo de Barack Obama, também podemos!

São Paulo, 6/1/2008
Dojival Vieira
Jornalista Responsável
Email:[email protected];[email protected]

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
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