Lituânia: um novo parceiro para o Brasil

Por Luiz Machado (*)

Quando o presidente lituano Valdas Adamkus esteve no Brasil, dias atrás, proferiu uma palestra na FAAP, em São Paulo. Falou sobre as relações entre Brasil e Lituânia (que vêm desde o século XVII), sobre o período de ocupação da União Soviética no país e sobre o momento atual. O país alterou suas estruturas políticas e econômicas e cresce 8% ao ano. Adamkus também falou sobre o acordo assinado com o presidente Lula, para estreitar as relações entre os dois países.

"Quando visito países estrangeiros, procuro não apenas discutir assuntos políticos nos gabinetes das instituições
governamentais, mas também encontrar representantes das comunidades acadêmica e cultural, além dos jovens.
Acredito que nada pode ser mais favorável à aproximação de nossos dois países, situados em partes tão distantes do
mundo, do que a abertura de contatos pessoais diretos."
Valdas Adamkus


Uma das vantagens de estar vinculado a uma instituição de ensino há muito orientada para o processo de internacionalização reside no grande número de oportunidades de contato com personalidades ou instituições consagradas mundialmente. É, sem qualquer favor, o que ocorre com a FAAP, que oferece a seus diretores, professores e alunos amplas e variadas chances de travar tais tipos de relacionamento, seja por meio de participação em eventos no exterior, seja através da realização de inúmeras atividades no Brasil com a presença de convidados estrangeiros.

Assim é que em quase 30 anos (Ufa! Como o tempo passa) de vínculo com a FAAP, tive o privilégio de participar de muitos cursos, seminários, congressos e workshops em diversos países do exterior, além de ter tido a chance de ministrar palestras em países como África do Sul, Argentina, Colômbia,

Equador, Inglaterra, México e Portugal. Sem contar as possibilidades de ver e ouvir, no Brasil, nomes tão expressivos como os de George Bush e Bill Clinton (ex-presidentes dos Estados Unidos), Vaira Vike-Freiberga (presidente da Letônia), Raúl Alfonsin (ex-presidente da Argentina), Júlio Sanguineti (ex-presidente do Uruguai), Henry Kissinger (ex-secretário de Estado dos Estados Unidos e ganhador do Prêmio Nobel da Paz), além de verdadeiros ícones do mundo da moda como Christian Lacroix, Pierre Cardin e Oscar de la Renta.

Dentro dessa tradição, no último dia 17 de julho, tive mais uma oportunidade dessa natureza, assistindo à palestra proferida pelo presidente da Lituânia, Valdas Adamkus, como parte das atividades de seu giro por alguns países da América do Sul.

Antes de me referir à palestra em si, não posso deixar de registrar uma série de paralelos entre esta palestra e a da presidente da Letônia, Vaira Vike-Freiberga, realizada em meados de 2007. Além dos dois países se situarem às margem do Mar Báltico e de terem amargado um longo período sob o domínio da União Soviética, os dois mandatários têm em comum o fato de terem vivido várias décadas longe de seus respectivos países durante a fase de dominação soviética.

Um pouco da vida de Valdas Adamkus

Nascido em Kaunas no dia 3 de novembro de 1926, Valdas Adamkus integrou, durante a Segunda Grande Guerra, o movimento de resistência pela independência da Lituânia. Em 1944, foi com seus pais para a Alemanha. Depois de completar seus estudos secundários no Ginásio Lituano local, ele estudou na Faculdade de Ciências Naturais da Universidade de Munique. Em 1949, emigrou com seus pais e irmãos para os Estados Unidos, fixando-se em Chicago, onde trabalhou inicialmente numa fábrica de auto-peças e depois como desenhista numa firma de engenharia. Casou-se em 1951 com Alma Natautaité, que o acompanhou em sua palestra na FAAP. Em 1960, formou-se em Engenharia Civil pelo Illinois Institute of Technology.

De 1958 em diante, Adamkus pertenceu a diversas entidades que reuniam imigrantes lituanos de orientação liberal e foi um ativo organizador de ações de protesto contra a ocupação da Lituânia.

Paralelamente a isso, Adamkus passou a trabalhar, nos Estados Unidos, na área de proteção ambiental, permanecendo nessa atividade de princípios da década de 70 até 1997. Com a experiência adquirida nessa atividade, deu assistência a instituições ambientais dos Países Bálticos, orientando-as na aquisição de literatura especializada, equipamentos e softwares necessários aos seus projetos.

Detentor de diversos títulos acadêmicos tanto em universidades da Lituânia como dos Estados Unidos, Valdas Ademkus recebeu uma carta de agradecimento do presidente Bill Clinton quando, em 1997, renunciou a seu cargo na administração da U. S. Protection Agency (EPA), a fim de retornar definitivamente a seu país.

Eleito presidente da República da Lituânia nas eleições realizadas a 4 de janeiro de 1998, Adamkus

tomou posse no dia 26 de fevereiro do mesmo ano para um mandato de cinco anos, ao longo do qual promoveu a idéia da rápida modernização da Lituânia e trabalhou consistentemente pela sua implementação.

Não conseguindo se reeleger nas eleições de 2002, vencidas por Rolandas Paksas, Adamkus permaneceu ativo nas questões de política interna e externa e ministrou palestras em conferências internacionais.

Em 2004, com o impeachment de Rolandas Paksas, Valdas Adamkus disputou novamente as eleições para a Presidência da República, sendo eleito no dia 27 de junho para um novo mandato de cinco anos.

A palestra

Em sua palestra para empresários, membros da comunidade lituana e alunos e professores da FAAP, o presidente Valdas Adamkus iniciou falando rapidamente sobre aspectos geográficos da Lituânia. Observou que embora olhando para o mapa Brasil e Lituânia tenham alguns contornos geográficos semelhantes, o território da Lituânia, que ocupa a região do Báltico, juntamente com a Letônia e a Estônia, corresponde a aproximadamente um quarto do território do estado de São Paulo. No entanto, lembrou, houve um tempo em que o território da Lituânia se estendeu do Mar Báltico ao Mar Negro formando um Estado multicultural juntamente com poloneses, ucranianos, bielorussos, tártaros e judeus vivendo em harmonia.

A seguir, o presidente Adamkus salientou que as relações entre os povos da Lituânia e do Brasil não são recentes. Elas tiveram início no século XVII quando os primeiros lituanos começaram a chegar na América Latina. Atualmente, a comunidade lituana no Brasil é de aproximadamente 250 mil pessoas, com algumas bastante proeminentes, como é o caso do artista plástico Lasar Segall.

O hiato indesejado dessa relação deveu-se à Cortina de Ferro, que fez com que por longas cinco décadas não apenas a Lituânia, mas também os outros países bálticos fossem apagados do mapa político de mundo, dificultando os contatos comerciais com outros países e regiões e trazendo profundas conseqüências para o desenvolvimento. “Nosso país esteve sob ocupação por metade do século XX, mas o Brasil jamais reconheceu ou justificou as ações repressivas do regime soviético nos países bálticos”, afirmou Adamkus.

Dando prosseguimento à sua fala, o presidente afirmou que os tempos hoje são outros, bem mais promissores. Depois de restabelecer sua independência há pouco mais de dezessete anos, a Lituânia passou por rápidas transformações tanto na sua estrutura política como na econômica, e abriu seu mercado para o comércio e para os investimentos internacionais. "Graças a isso", disse com indisfarçável orgulho, "nosso crescimento anual é superior a 8% e nosso ambiente é competitivo e plenamente favorável à realização de negócios".

Na sequência, Valdas Adamkus disse que a Lituânia é hoje um ativo e ambicioso membro da União Européia, sendo também integrante da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Confirmou que seu país apóia a ambição da Ucrânia e da Geórgia de também pertencerem à União Européia e à OTAN, e tem procurado aprofundar a integração com outros países do leste europeu tais como Moldávia e Bielorrússia.

Na parte final de sua palestra, o presidente Adamkus destacou a importância do acordo assinado com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o objetivo de estreitar as relações entre os dois países e delineou as linhas mestras do que ele considera fundamental para que nossas sociedades e nossos países tenham doravante um relacionamento bastante próximo:

1. “Acredito que nada favorece mais as relações entre países do que o contato direto entre as pessoas. Atualmente, os brasileiros podem viajar sem qualquer restrição para a Lituânia a fim de estudar, de participar de eventos acadêmicos e culturais ou para fazer negócios. Eu tenho plena confiança de que o Brasil irá remover os obstáculos burocráticos remanescentes, em especial a exigência de visto, para que também os lituanos possam vir para o Brasil a fim de desfrutar de suas belezas naturais e de conhecer mais de perto seus autores favoritos como Jorge Amado, Paulo Coelho e Monteiro Lobato, sem falar no especial interesse pelo carnaval e pelo futebol".

2. “Espero poder encorajar os representantes de nossas comunidades empresariais para explorarem novos nichos de negócios e níveis de cooperação entre regiões tão distantes. Empreendedores lituanos devem buscar novas oportunidades no Brasil, no Mercosul e no restante da América Latina, enquanto os brasileiros podem usar a Lituânia como plataforma para desenvolver seus negócios na União Européia e nos países do leste europeu".

3. “Creio firmemente no poder da cultura para abrir portas e facilitar a mútua compreensão dos povos. Gostaria muito de ver mais eventos culturais e um maior número de performances de artistas brasileiros na Lituânia, assim como espero que os brasileiros possam descobrir melhor as riquezas da moderna cultura lituana e do nosso espírito nacional. E, 2009, Vilna, nossa capital, será transformada na Capital Européia da Cultura, o que representa uma excelente oportunidade para visitar a Lituânia e conhecer melhor nosso país e nosso povo”.

4. “Gostaria de lembrar que é nossa responsabilidade deixar para as gerações futuras um mundo seguro e próspero. Nem o Brasil, um dos países emergentes mais destacados do mundo, nem a Lituânia, um pequeno país do norte da Europa, podem viver apenas para o presente. Nós precisamos nos preocupar com o futuro de nossas crianças e preservar nossas riquezas naturais, o clima e as fontes de energia para o futuro.”


Referências e indicações webgráficas

http://www.president.lt/family/
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Este texto foi publicado originalmente em http://www.lucianopires.com.br.
A publicação deste artigo no site do COFECON foi autorizada pelo autor.
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(*) Economista, formado pela Universidade Mackenzie em 1977. É Vice-Diretor da Faculdade de Economia da Fundação Armando Alvares Penteado - FAAP, na qual é Professor Titular das disciplinas de História do Pensamento Econômico e História Econômica Geral.

http://www.cofecon.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=1492&Itemid=102

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
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