Há algum parvo a governar Lisboa?

Lojas de conveniência fechadas às vinte-e-duas horas, a única esquadra de polícia na freguesia de Avenidas Novas fechada. Há algum parvo a governar Lisboa? Há um consenso geral que em Portugal e especialmente em Lisboa, as autoridades existem apenas para dificultar a vida aos cidadãos.

Portugal, União Europeia, terceiro milénio. País das maravilhas, onde é impossível resolver qualquer assunto por telephone, ou porque ninguém atende antes de cair a chamada, ou porque o número "não foi atribuído" ou porque depois de uma viagem a dizer "sim" ou a teclar "1", agradecem a chamada e beep beep beep beep beep. Depois fica a saber que pagou a chamada e bem cara.

O Internet deixa de funcionar. Telefona-se ao providenciador de serviço, ou service provider, o ridículo termo (estrangeiro) em uso. Depois de uma longa espera, resolvem o problema, e pagou um preço de ouro pela demora. Fica a impressão que as companhias cortam o serviço de propósito, ficando à espera dos clientes pegarem no telephone para reclamar (e pagar a chamada) e lá no escritório estão todos nos postes de trabalho, assim: "OK rapazes estamos prontos? OK Interrompindo o serviço, 3...2...1...zero! OK é agora!"

A conta de eletricidade aumenta mês após mês, ano após ano, sem qualquer regra. Fez-se a Conta Certa, pagando 65 Euro (a palavra não tem plural, vejam qualquer nota) por mês, sugerido pela companhia. Vem no final do ano uma conta exorbitante. "Ai o preço da electricidade aumentou. Melhor agora pagar 80 por mês". No final do ano vem centenas de Euro extra para pagar, na mesma. "Melhor agora aumentar para cem Euro". Cem Euro? Num país onde o salário mínimo é 557 Euro? Como é que a conta aumenta de 65 Euro por mês até 100, pelo mesmo uso?

Portugal, onde o salário médio ronda os mil Euro (por baixo) e o preço médio para arrendamento de um apartamento em Lisboa é 810 Euro. A taxa de desemprego, oficial, é de 11,1 por cento da população, portanto um milhão, cento e quarenta mil, oitocentos e quarenta e três pessoas, mais aqueles que estão desempregados e não contam porque não estão nas estatísticas.

Portugal, onde ninguém é responsabilizado por nada, a não ser que é um pobre sem possibilidade de contratar um advogado do topo, neste caso o Sistema cai por cima do coitadinho. Seja porque as Finanças enviaram uma conta ao endereço errado e ele não a recebeu mas é multado na mesma, ou porque pressionou o botão num semáforo e ficou com o cérebro frito mas ninguém é responsavel. Pois, foi a culpa dele, o idiota, não deveria ter tocado no equipamento, o que esperava? Que funcionasse?

Agora no capital do Império, Lisboa. Há algum parvo a governor esta cidade, ou quê? Aumentaram-se em flecha os casos de roubo e agressão nas Avenidas Novas, de repente. Por quê será? Será porque fecharam a única esquadra de polícia que lá havia? Nãaaaaaaaaaaooooooooooo! Que tolice! Deve ser o vento, não?

A aquela loja de conveniência que estava aberta até às duas de manhã, onde ia comprar umas coisitas para o pequeno-almoço no dia seguinte quando chegava a casa depois do turno da tarde? Fechado. O coitado do rapaz que lá trabalhava disse que esse negócio faz dinheiro entre as dez da noite e duas de manhã, mais vale agora fechar as portas. Ai espera, terá sido por causa dos lobbies dos supermercados? O Pingo Doce, o Continente, o Mini Preço? O Pingo Doce, campeão de colocar preços nos lugares errados, depois quando pagar a conta tem umas sorpresas interessantes; o Continente, onde trocam os preços durante o acto da compra, de maneira que aquela garrafa de vinho que estava marcada a 2,60 quando entrou agora dez minutos mais tarde está marcado a 4,56; o Mini Preço, onde três vezes comprei comida em fantásticas condições, tão fantásticas que curou-se a prisão de ventre, e onde tem de esperar horas para pagar pois a fila chega a 34 pessoas. Nesse caso que influência têm estas cadeias na governação da cidade? Quem é o responsavel por esta decisão? Quais os seus laços a esses lobbies?

Não, a razão, dizem, nada tem a ver com esses supermercados... é por causa dos bares, dizem. Ora, em Portugal acham as desculpas e razões mais lúdicras para os eventos mánicos que cá acontecem. Lembrem-se quando há uns dezassete anos atrás a cidade de Lisboa ficou sem luz, e a desculpa foi que uma ave tocou numa linha de alta tensão? "Foi uma cegonha!"

Os bares? Então o rapaz tem de fechar a porta e eu tenho de andar durante o meu horário de trabalho nas três cadeias onde jurei que Deus me cegasse se colocasse os pés alguma vez mais nestas lojas, por causa dos bares, cheios de p*tas e cabrões?

Então os residentes das Avenidas Novas ficam sem policiamento adequado, mas que se lixem, querem lá saber. Se quiser resolver o problema, pegue no telephone (ponta-pé no cú)! O leva o caso ao tribunal e em vinte anos alguém vai enviar uma carta ao endereço errado, mas é a sua culpa (paulada na cabeça). E as lojas de conveniência estão fechadas às vinte-e-duas horas da noite, f*dendo a vida de quantas famílias, atirando centenas de pessoas ao desemprego, se entrarem nas estatísticas, e retirando à Câmara milhões de Euros de rendimentos, pois estas lojas fazem uns 200 Euro por noite, sete dias por semana. Faziam. Quanto vão perder em impostos pagos? E esse dinheiro, quem vai pagar à Câmara?

Adivinhem!

Mas nada vai mudar. Se eu dissesse que era estrangeiro residente em Portugal, diriam "Quem não está bem, muda-se!" ou "Vai-te embora para a sua patrinha!" Frases estúpidas de ocasião, mantas para esconder a porcaria debaixo do tapete, a boa maneira portuguesa a resolver problemas sem aceitar a responsabilidade, e fazer algo que preste.

"Vejam a EXPO. E aquela porcaria, como se chama? Ah sim, a Via Verde. E mais? Cristiano Ronaldo! Olhem o Mourinho! Ah aquele arrogante que ganhou dezenas de milhões a ser despedido pelo Chelsea duas vezes. Mas o que espera? Portugal é um país pequeno! Quando se é grande, dá ponta-pés nos rabos dos outros; quando se é pequinino, leva-se ponta-pés no rabo! É assim! E sempre será!"

EXPO é um belo exemplo, assim como o acto de pensar como gente grande em 2004, construíndo estádios de futebol para fazer uma lição, nos dois casos, de excelência na organização e uma lição em mercantilização, ou marketing, política. Via Verde, não brinquemos, foi outro exemplo também e não hajam dúvidas que o Cristiano Ronaldo é um excelente capitão da seleção portuguesa, um exemplo na sua vida pessoal e professional, e o currículo de Mourinho é ímpar. Mas há muito mais a fazer.

Sabem como são escolhidos em Portugal muitas pessoas que tomam as decisões? Identificam o/a candidato/a antes de anunciar que o lugar está disponível. Escreve-se a especificação da função a partir do currículo desta pessoa, que foi escolhida por causa das ligações aos grupos de pressão, ou lobbies, e por aí fora. Depois só aquela pessoa tem os requerimentos para aquela função. E daí as decisões como vemos hoje, fechar as lojas de conveniência às 22.00 (quando em outros lugares estão abertos 24 horas por dia, chamam-se lojas de CONVENIÊNCIA) e fechar a única esquadra numa zona com grande concentração de pessoas.

Portugal é um país médio em termos europeus, não é pequeno. Em termos da zona económica exclusiva, Portugal tem uma das maiores áreas do mundo. Por isso tirem o discurso do coitadinho da agenda e metem-no onde pertence. Mas tem de haver gente competente a tomar as decisões.

Para já, exijo que seja aberta uma esquadra nas Avenidas Novas, em Lisboa, e que sejam criadas as condições para as lojas de conveniência abrirem as horas que bem entenderem, prestam um serviço público bem maior do que o autor do despacho a condená-las. Se Portugal tem agora uma hipótese com o aumento em turismo, basta agora dois ou três turistas serem atacados na zona das Avenidas Novas para a história alastrar...e adeus à galinha dos ovos de ouro.

Portugal é um país da primeira categoria, com um povo na mesma altura e uma governação péssima.

JP

Cartas ao Editor

 

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
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