Dores de crescimento

Em razão da questão cambial, as exportações pelo Porto de Santos caíram quase 3% no primeiro semestre em relação a período idêntico de 2005 e só não seguem no mesmo ritmo porque vem ocorrendo um aumento nas vendas de produtos agrícolas.

Milton Lourenço (*)

Em razão da questão cambial, as exportações pelo Porto de Santos caíram quase 3% no primeiro semestre em relação a período idêntico de 2005 e só não seguem no mesmo ritmo porque vem ocorrendo um aumento nas vendas de produtos agrícolas. Já as importações apresentaram crescimento de 6% no primeiro semestre e continuam com tendência de alta.

O resultado disso é que a movimentação de contêineres pelo Porto de Santos cresce de forma acentuada, com aumento de 10% tanto nas exportações como nas importações. Com os resultados levantados pela Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), estima-se que, até o final do ano, 76,5 milhões de toneladas serão movimentadas.

Em 2005, foram escoados pelo Porto de Santos 2,2 milhões de TEUs (unidade equivalente a um contêiner de 20 pés), o que equivale a 38% do movimento de contêineres no País. Prevê-se que esse número chegue a 4,2 milhões em 2010, o que significa que a movimentação deve praticamente dobrar em menos de cinco anos.

Diante desse quadro, o que se pode esperar para os próximos anos em termos de infra-estrutura? Afinal, é líquido e certo que o ritmo da atividade do comércio exterior, nos últimos tempos, vem superando largamente o dos investimentos portuários. E que a cada dia se aproxima o momento-limite que os especialistas já chamam de caos logístico.

Isso, porém, não significa que tenhamos de assumir uma atitude passiva diante da inexorabilidade dos fatos. Pelo contrário. Enquanto tivermos voz e espaço, vamos continuar a alertar para o risco de estrangulamento que correm não só Santos como os demais portos brasileiros, de Santarém (PA) ao Rio Grande (RS).

Em todos, são comuns as deficiências logísticas. Ao contrário do que se vê nos EUA e Europa, em nossos portos, as cargas nunca saem diretamente dos trens para os terminais, mas chegam, isso sim, em conta-gotas, em cima de caminhões, sempre exigindo operações intermediárias, que só oneram os custos portuários.

Em alguns, há também a questão da pouca profundidade, que se vem agravando por falta de dragagem, impedindo a atracação de navios de grande porte. Em Santos, por exemplo, por falta de um trabalho contínuo de dragagem, o calado foi reduzido de 14 metros para 12 metros e, em determinados pontos, até para menos, em razão da sedimentação que ocorre dia-a-dia com o lançamento de lixo tóxico nas águas.

No entanto, por suas características naturais, Santos vem se tornando um hub port (porto concentrador de cargas), o que significa que a tendência é que mais e mais navios devem fazer escala no cais santista. Por enquanto, os problemas, de um modo ou de outro, são superados, mas o tempo de espera dos navios começa a aumentar, gerando novos custos. Se não houver investimentos, vão crescer e afugentar cargas e navios.

A Codesp acaba de contratar um estudo para apontar as características naturais do canal do estuário que só deverá ficar pronto ao final do ano. Esse estudo deverá mostrar os pontos tecnicamente viáveis para o alargamento do canal, o que permitirá à empresa traçar um novo caminho de navegação para as embarcações. Como se sabe, na medida em que se aprofunda o canal, é preciso também fazer o seu alargamento porque, caso contrário, o sedimento localizado nas margens acaba caindo e assoreando novamente o estuário.

Esse não é o único problema. Antes, fosse. Faltam armazéns para estocar a safra, faltam ferrovias e rodovias bem conservadas para garantir o escoamento; falta agilidade alfandegária na liberação das mercadorias; e, nos últimos tempos, começam a faltar contêineres.

De cada grupo de dez contêineres que saem dos nossos portos, apenas três retornam carregados. É um problema provocado pelo aquecimento do comércio mundial, mas que, no Brasil, torna-se mais grave por causa do aumento das exportações de carga geral.

Por isso, muitas empresas têm sido obrigadas a trazer do exterior contêineres vazios, o que significa maiores custos. Para piorar, a concorrência com os fabricantes chineses de contêineres levou as poucas indústrias brasileiras que se aventuraram no segmento a desistir de tudo.

O que dizer de tudo isso? A princípio, não podemos lamentar que assim seja. Pior seria se fosse o contrário, ou seja, se a infra-estrutura estivesse pronta e modernizada e não tivéssemos movimentação de cargas. Então, estaríamos no pior dos mundos. É melhor imaginar que vivemos hoje as dores de crescimento da sociedade brasileira. Se não constitui uma solução, é pelo menos um consolo.

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(*) Milton Lourenço é diretor-presidente da Fiorde Logística Internacional, de São Paulo ( www.fiorde.com.br ). E-mail: [email protected]

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
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