O Brasil e o Mercosul
Milton Lourenço (*)
O dia 26 de março de 2011 marcará a passagem do 20º aniversário da assinatura do Tratado de Assunção que assinalou a criação do Mercosul. Duas décadas depois, a pergunta que se impõe é esta: para que serve o Mercosul? Levando-se em conta os números, já não serve para muita coisa, até porque, independente do acordo, Brasil e Argentina, em razão das circunstâncias geográficas, estariam destinados a se tornar grandes parceiros comerciais.
É verdade que, em outros tempos, o acordo representou uma parcela significativa do comércio externo entre os seus países-membros. Em 1998, os demais países do Mercosul - Argentina, Uruguai e Paraguai - absorviam 17,4% das exportações brasileiras. Dez anos depois, essa faixa era de 8,9%. Hoje, não passa de 7%. E não foi porque o Brasil estaria preferindo exportar para outros mercados - antes fosse -, mas porque a Argentina, o parceiro que realmente conta nesse acordo, tem optado por comprar mais da China e de outros países.
Para piorar, depois que as presidentes Dilma Rousseff e Cristina Kirchner trocaram elogios mútuos e promessas de apoio incondicional em Buenos Aires, a Argentina tratou de ampliar de 400 para 600 os itens de uma lista de produtos que serão atingidos por um sistema de licenças não automáticas. Por esse sistema, o governo argentino impede ou, no mínimo, retarda a entrada em seu território de produtos que supostamente afetariam seu parque industrial.
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Essa lista adicional inclui autopeças, telefones celulares, têxteis, vidro, produtos químicos, motocicletas, automóveis, peças de bicicletas, papel, papelão, equipamentos eletrônicos e eletrodomésticos. É de perguntar: é assim que o Mercosul pretende se consolidar como união aduaneira? Quando muito, não passa de uma área de livre comércio, que volta e meia deixa de ser livre em razão das barreiras que os argentinos sempre tratam de levantar.
É claro que ninguém quer que o Brasil venha a estremecer suas relações com aquele que é hoje o seu principal parceiro comercial, mas uma relação mais madura e de respeito mútuo não faria mal a nenhuma das partes. Afinal, o respeito a tratados, acordos e contratos é o que marca a atuação de nações civilizadas.
Se não é para respeitar o Tratado de Assunção, por que o Brasil é obrigado a continuar sem poder fechar acordos com outras nações ou blocos sem a aquiescência do Mercosul? Por que continuar a fazer papel de bobo nessa relação, se a Argentina tradicionalmente tem se colocado contra o Brasil na OMC e em outros fóruns mundiais?
Portanto, está na hora de os quatro sócios sentarem à mesa para discutir a reformulação do Mercosul, que poderia redundar num retorno do acordo à zona de livre comércio, que seria mais compatível com a integração alcançada pelos países-membros. Afinal, nesse caso cada sócio ficaria desimpedido para negociar isoladamente seus acordos comerciais. Tal como fazem Chile, México e outros países latino-americanos.
É isto que o novo governo brasileiro deveria propor aos seus sócios, jogando às claras, em vez de seguir a política do governo anterior, que sempre se omitiu ou agiu de maneira tíbia e complacente em nome da preservação de uma liderança no continente que nunca existiu.
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(*) Milton Lourenço é presidente da Fiorde Logística Internacional e diretor do Sindicato dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística do Estado de São Paulo (Sindicomis) e da Associação Nacional dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística (ACTC).
E-mail: fiorde@fiorde.com.br Site: www.fiorde.com.br