Dep. Adelmo Leão: Boicote do Governo Federal à Comissão de Fiscalização Financeira e Controle

Desde o dia 10 de novembro,  deputados integrantes da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC) têm denunciado que parlamentares do PMDB, PSDB, DEM, PP, PSB e PTB têm boicotado os trabalhos do colegiado. Entre eles, o deputado federal Adelmo Leão do PT de Minas Gerais, quem concedeu esta entrevista comentando a atuação da Comissão e o desprezo do governo em exercício por ela.

 

Desde que Michel Temer assumiu a Presidência da República, integrantes dos partidos aliados ao governo não têm comparecido às reuniões a fim de evitar quorum. Nas poucas vezes que registram presença, negam convites para que agentes públicos envolvidos em escândalos, ou não, prestem contas na Comissão sobre as ações do Poder Executivo. 

 

"O que se percebe é que há uma completa desconsideração dos objetivos da comissão, que são apuração e transparência", reclama o deputado Adelmo Leão. E acrescenta, sem rodeios, que o governo tem se blindado em relação à transparência: "Há uma mensagem sendo passada pelo Governo: ele não quer ser fiscalizado".

 

Ao apontar ações do Poder Executivo que podem ser consideradas abusivas, segundo o entrevistado com o intuito de favorecer as elites e o mercado financeiro, o petista garante que o governo tem violado indiscriminadamente a Constituição. "Precisamos que a sociedade saiba, sem interferências parciais e compradas, quem está lutando para que as denúncias sejam apuradas, quem faz de tudo para tornar pública a atuação dos agentes do Governo, quem trabalha e cumpre com as funções para a qual foi eleito e quem se esconde atrás de boicotes e arranjos", afirma o deputado, ao mesmo tempo que incentiva o debate sobre as ações governamentais nos mais diversos setores midiáticos e espaços públicos.

 

A seguir, a íntegra da entrevista.

 



Edu Montesanti: De que maneira tem se dado esse boicote, e quando se iniciou?

 

Deputado Adelmo Leão: O Governo tem maioria na comissão, de maneira que as estratégias são a avalanche de rejeições aos requerimentos, e o boicote. 

 

Os membros do Governo têm votado sistematicamente contra requerimentos relativos ao pedido de informações, de audiências, convocação ou mesmo convites a seus integrantes. Há uma blindagem do Governo, que impede a tomada de informações acerca das práticas governamentais e de seus agentes.

 

Já o boicote é feito quando os parlamentares governistas e vice-líderes de seus respectivos partidos políticos acompanham a abertura das reuniões para debates mas não registram presença. O que se percebe é que há uma completa desconsideração dos objetivos da comissão, que são apuração e transparência.

 

Como, exatamente, têm sido as reuniões da comissão?

As reuniões da CFFC têm sido esvaziadas. A base de apoio do governo de Temer não comparece às reuniões da comissão, que, sistematicamente, precisa ser cancelada por falta quórum.

 

 

 

 

Por que, na avaliação do senhor, isso tem ocorrido?

Há uma mensagem sendo passada pelo Governo: ele não quer ser fiscalizado. Assim, há a clara manifestação do descompromisso do Governo com a transparências dos seus atos. 

 

A Comissão de Fiscalização Financeira e Controle tem importante papel na estrutura democrática do país e tem sido calada, por repetidas vezes. O Governo poderia encabeçar ações de fiscalização, receber requerimentos e contribuir com as ações relevantes da Comissão; mas com a maioria que tem no colegiado, prefere furtar-se de dar informações e inviabilizar os trabalhos. 

 

O que tem acontecido é o bloqueio de ações de extrema importância para a população. O Governo se mostra interessado em blindar-se de fiscalização, em esconder suas ações, demonstrando um desleixo com um dos mais caros pressupostos republicanos, isto é, a prestação de informações e a responsabilização dos gestores.

 

Quais ações do Poder Executivo podem ser consideradas abusivas nestes sete meses, desde que o presidente Michel Temer assumiu o poder?

Diversas medidas do governo ilegítimo de Temer podem ser consideradas abusivas, entre as quais destaco:

 

- Proposta de Emenda à Constituição 241 na Câmara dos Deputados, e 55 no Senado depois, a qual estipula que, por 20 anos a partir de 2017, as despesas do governo federal, inclusive em áreas como saúde e educação, sejam corrigidas apenas pela inflação do ano anterior, comprometendo uma geração inteira com menos investimentos. 

 

Ocorre que os direitos do povo, garantidos pela Constituição Federal de 1988, sequer foram assegurados da forma que se devia à população. A efetivação desses direitos estava em curso no Brasil. A dignidade da população vinha sendo garantida aos poucos, com trabalho junto ao povo mais necessitado, o que se tornou prioridade pela primeira vez na história do Brasil, recompensa essa que não pode ser suprimida dos governos dos últimos anos. 

 

Por isso, vê-se o ódio aos pobres proliferar, culminando em medidas que colocam em risco todo o progresso determinado pela bandeira nacional. A PEC quer o fim daquilo que nem mesmo chegou de forma completa;

 

- Envolvimento de diversos membros do Governo com ilícitos- Romero Jucá, Geddel Vieira Lima, Eliseu Padilha, Henrique Alves, Bruno Araújo, apenas para exemplificar. O que dizer ainda da conivência do Supremo Tribunal Federal à condição de réu de Renan Calheiros? Juntos, Renan e STF se tornaram vassalos do Poder Executivo para instalar a perversidade da PEC da morte (PEC 241/55).

 

- Entrega do petróleo na camada pré-sal brasileira ao capital estrangeiro. Privatização e desnacionalização do patrimônio nacional de relevância estratégica para o país. Sem o aval das urnas, quer-se impor à população brasileira o Estado mínimo em detrimento do Estado de bem-estar social;

 

- Fim de diversos programas sociais como o Ciência sem Fronteiras, Luz para Todos, desfiguração dos programas Mais Médicos, do FIES, do Minha Casa, Minha Vida entre outros, e proposta de revisão do direito universal à saúde que figura na Constituição. Segundo o ministro da Saúde, o "SUS não caberia no Orçamento".

 

- A Empresa Brasil de Comunicação - EBC, passa por uma situação das mais absurdas. Ela passou a ser um meio de comunicação de governo, beirando as raias do fascismo em que as informações eram maquiadas, suprimidas, alteradas para servir a interesses escusos dos detentores do Poder. 

 

Inclusive, há relatos e processos judiciais que revelam a ingerência governamental e perseguição política pois, apesar de a legislação garantir mandato de 4 anos ao presidente da EBC, ele foi exonerado;

 

- Por fim, a Reforma da Previdência é uma das maiores crueldades já vistas na história desse país. Trata-se de um corte muito duro para trabalhadores e pensionistas, enquanto, mais uma vez, ela não tocará em grupos privilegiados como a classe política e militares. Com essa medida, o Governo enriquece o mercado financeiro novamente, pois empurra boa parcela da população para planos de previdência privada, e desguarnece os mais carentes. 

 

O que se intenta é reduzir a pó conquistas tão caras à democracia brasileira, como a dignidade da pessoa humana que está no artigo 1º; a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a erradicação da pobreza, da marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais, presente no artigo 2º. 

 

Ignora ainda, direta e frontalmente, a vedação contida no artigo 150 de utilizar tributo com efeito de confisco, pois se apropria da contribuição da sociedade instituída com a exclusiva finalidade de custear a seguridade social para outros fins, obrigando, com isso, o trabalhador a ter que contribuir durante 49 anos de sua vida laboral ativa sem receber a devida e justa contrapartida. 

 

Assim, reduz-se a pó a Constituição Cidadã e se constrói a nova Constituição - A Constituição do Retrocesso.

 

Quais medidas deveriam ser tomadas a fim de mudar esses quadros, tanto de impedimento à atuação da Comissão, quanto dos abusos financeiros do Executivo?

Acredito que a única forma de tornar a Comissão atuante novamente, é mostrar à sociedade os abusos que estão acontecendo. Precisamos dar visibilidade a essa situação, que é grave, pois ameaça a atuação de uma das mais importantes comissões da Câmara dos Deputados. 

 

A atuação por meio de outras comissões, junto a outros órgãos estatais e, principalmente, junto à sociedade civil é salutar para a sobrevivência dessa importante Comissão. 

 

Precisamos publicar dados relativos às ações governamentais nos mais diversos setores da mídia, promover debates nas escolas, nos centros de educação, nas associações, onde quer que a população esteja pois é preciso que a sociedade deixe de ser mera expectadora das tentativas de mudança, e passe a ser agente da própria transformação.

 

Eu mesmo, junto a outros companheiros, tive diversos requerimentos que não sobreviveram, seja por boicote ou por rejeição em bloco. Pedimos esclarecimentos a diversas autoridades do Governo, afinal, a função da CFFC é fiscalizar, tomar conhecimento de fatos considerando todos os lados e argumentos. Ocorre que o Governo não aceita prestar esclarecimentos. Estão escondendo suas atuações. A sociedade não deve aceitar nenhuma forma de boicote ao dever constitucional de transparência.

 

Foram requeridas as presenças de secretários, ministros, especialistas envolvidos em escândalos, ou não. A sociedade merece ouvir o que esses agentes públicos têm a dizer sobre sua função pública, e sobre a gestão dos interesses da sociedade. Mais que isso: qualquer autoridade pública tem o dever de prestar as informações que o povo requer. Nós, parlamentares, queremos debater com eles, mas isso nos tem sido sistematicamente negado.

 

Precisamos que a sociedade saiba, sem interferências parciais e compradas, quem está lutando para que as denúncias sejam apuradas, quem faz de tudo para tornar pública a atuação dos agentes do Governo, quem trabalha e cumpre com as funções para a qual foi eleito e quem se esconde atrás de boicotes e arranjos.

 

A Comissão de Fiscalização Financeira e Controle é importante demais para sofrer os abusos que vem sofrendo. Chega de retrocesso. Nós dizemos um ressonante "sim" à transparência inerente às boas práticas da administração pública.

 

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
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