Ardis e fraudes na venda da TVA mostram que a CPI é urgente

Com o artifício da “Reunião Prévia”, controle da operadora de TV é, de fato, da Telefónica - A CPI requerida por mais de um terço da Câmara dos Deputados para investigar a venda ilegal da empresa de TV a cabo TVA pelo grupo Abril à Telefónica é um instrumento que poderá revelar ao país os mecanismos utilizados pelo grupo Abril para esconder quem são os seus verdadeiros donos.

A CPI requerida por mais de um terço da Câmara dos Deputados para investigar a venda ilegal da empresa de TV a cabo TVA pelo grupo Abril à Telefónica é um instrumento que poderá revelar ao país os mecanismos utilizados pelo grupo Abril para esconder quem são os seus verdadeiros donos.

Após o conselheiro diretor da Anatel, Plínio de Aguiar Júnior, apontar que a transação da venda da TVA escondia um acordo de acionistas chamado de “Reunião Prévia”, que transforma a Abril em laranja da multinacional e burla a lei brasileira que impede o controle de estrangeiros sobre as operadoras de TV por assinatura, reforçaram-se as suspeitas de que o mesmo mecanismo, além da utilização de empresas de fachada, pode estar sendo usado pelo grupo para infringir também a lei que proíbe estrangeiros de deterem mais de 30% do capital de empresas jornalísticas.

Ao vender a TVA para a Telefónica, o grupo Abril procurou manter formalmente a composição acionária no limite da legislação. Pelo acordo, a Telefónica (Telesp S.A.), através da Navytree, ficou com 86,7% do capital total da Comercial Cabo (TV a Cabo em São Paulo), com 19,9% das ações com direito a voto (ordinárias), e 91,5% do capital total da TVA Sul (TV a Cabo em Curitiba, Foz do Iguaçu, Florianópolis e Camboriú), com 49% das ações com direito a voto - além de 100% da Lightree, prestadora de serviços de MMDS (microondas). A lei do Cabo (Lei nº 8.977, de 6 e janeiro de 1995) permite que estrangeiros possuam até 49% das ações com direito a voto.

No entanto, o conselheiro verificou que devido à “Reunião Prévia”, as deliberações do Conselho de Administração e da Assembléia Geral da TVA – as decisões sobre os rumos do grupo - dependerão das resoluções tomadas numa reunião precedente onde participam e votam todos os acionistas (da Telefónica e do grupo Abril) independentemente de possuírem ações com direito a voto ou não.

Ou seja, o conselho de administração da TVA, em que grupo Abril detém formalmente a maioria das ações com direito a voto, não manda nada, pois as decisões são realmente tomadas na “Reunião Prévia”, onde a Telefónica possui a maioria das ações. O conselheiro da Anatel destaca que assim a múlti terá o “poder de dirigir, de forma direta ou indireta, interna ou externa, de fato ou de direito, individualmente ou por acordo, as atividades sociais ou o funcionamento da empresa”, uma vez que a “Telesp possuirá 86,7% do capital total da prestadora. A Telesp será, portanto, a grande fonte de recursos financeiros da prestadora, inclusive nas situações de necessidade de aporte de capital”.

Outro detalhe que chamou a atenção de Plínio de Aguiar foi o fato de que as “partes não se olvidaram do cuidado de mencionar que as ações poderão ser vendidas apenas se e tão somente quando a legislação e outras normas de caráter regulatório permitirem a aquisição pela Navytree (Telefónica)”. Por que as ações nas mãos do grupo Abril não podem ser vendidas para outro que não seja a Telefónica? Por que a Telefónica não pode vender suas ações para o Abril? Tal cláusula é mais um indício de que o grupo Abril é um cítrico da Telefónica. Se a legislação for alterada, quanto custará aos espanhóis as ações que estão em nome da Abril? Um real? Isso precisa ser esclarecido pela CPI.

Como destacamos no início, o caso TVA é apenas a ponta do iceberg do grupo Abril, que possui um histórico de denúncias apontando que ele se utiliza de intrincadas composições acionárias para esconder “sócios” estrangeiros. Até 2002, a legislação brasileira proibia que grupos ou pessoas de outros países tivessem participação em empresas de comunicação. FHC alterou a legislação, permitindo que 30% do capital total pudesse pertencer a estrangeiros. Ressalte-se que o percentual só não foi maior porque FHC não encontrou espaço na sociedade para tanto. A Lei nº 10.610, de 20 de dezembro de 2002, diz ainda que “as empresas efetivamente controladas, mediante encadeamento de outras empresas ou por qualquer outro meio indireto, por estrangeiros (...) não poderão ter participação total superior a trinta por cento no capital social, total e votante, das empresas jornalísticas e de radiodifusão”.

Neste ponto, a venda de 30% do grupo Abril para o conglomerado sul-africano Naspers - grupo que foi um dos pilares do regime do apartheid – é mais um capítulo obscuro e recheado de suspeitas de ilegalidades.

Como mostrou a TV Bandeirantes, a transação com a Naspers foi feita através de empresas de fachada para esconder a origem dos verdadeiros acionistas. “A Band teve acesso aos contratos milionários firmados entre a Naspers e a Editora Abril. Os detalhes que a empresa brasileira tanto quis esconder agora vêm à tona. Os contratos são redigidos em inglês. Parte da transação foi feita com investidores norte-americanos que já possuíam ações da editora. Mais de US$ 170 milhões sequer passaram pelo Brasil.

O dinheiro foi depositado em bancos dos Estados Unidos. No restante dos negócios,os sócios brasileiros também receberam cifras altas. Mas o que chama atenção no contrato é a cláusula que concede o controle da Abril para quem tiver mais de 50% das ações. A lei brasileira determina que, além de deter mais da metade das ações, a pessoa tem que exercer efetivamente esse poder, o que não fica claro no contrato”, ressaltou a reportagem.

A reportagem exibiu uma entrevista com o advogado Walter Vieira que disse achar “estranho que um grupo estrangeiro que compre um ativo tão importante, como são 30% do capital social da editora Abril, adquira também, junto com esse patrimônio, direitos políticos, como os de eleger membros do conselho de administração da Abril e ainda outros que estão num acordo de acionistas que é mencionado em todos os documentos a que a Band teve acesso, mas que continua desconhecido para as autoridades do Brasil”.

A transação contou com a participação de uma empresa chamada MIH Brasil Participações, possuidora de um emaranhado de endereços, telefones e CNPJ falsos. No contrato, a MIH informou o CNPJ que pertencia à outra empresa, a Curundéia. Na Receita Federal, descobriu-se que a Curundéia tem, na verdade, três donos: A MIH (UBC) Holdings BV, a Myriad International Holdings BV, as duas com sede fora do Brasil, e a Brian Vincent Forssman. A assessoria para fechar o negócio também é reveladora. No negócio, a Abril foi assessorada pelo banco JP Morgan e o Naspers, pelo Citigroup.

Que o grupo dos Civita sempre defendeu interesses dos monopólios estrangeiros não é novidade alguma. Entretanto, existem mais do que indícios de que o Grupo Abril está infringindo a legislação brasileira. Não resta dúvida de que a Abril possui uma gama de advogados para criar mecanismos que tentem manter a composição acionária dentro do limite. Mas e as cláusulas dos contratos – como ocorreu na TVA – não podem esconder a verdade? A qualidade dos sócios e “parceiros” da Abril é um ponto suspeito. O grupo Abril está no topo do organograma. Este é formado de 30% da Nasper e 70% dos Civita. E as empresas que estão embaixo?

Além da Telefônica, do JPMorgan e Falcon na TVA, o grupo Abril também é sócio da norte-americana Viacom na MTV. A Viacom é chefiada por Sumner Redstone e é uma das empresas que monopolizam os meios de comunicação nos Estados Unidos. Seu conglomerado envolve a Paramount Pictures, a MTV, a Nickelodeon, Blockbuster, editora Simon & Schuster, CBS News e várias outras empresas. Em seu site, o grupo destaca outros “parceiros” tais como a Cosmopolitan/Hearst, Hachette, Time Inc, Gruner und Jahr, Playboy Internacional e National Geographic Society.

Como se pode observar, motivos não faltam para iniciar imediatamente os trabalhos da CPI da TVA/Abril.

ALESSANDRO RODRIGUES

Fonte: www.horadopovo.com.br

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
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