A propósito de Poesia

A PROPÓSITO DE POESIA

A Poesia tem como condição, a Filosofia, o exercício mais profundo do acto de Pensar.

A Poesia por ser a “essencialidade da escrita” [i] , pressupõe uma economia de palavras rebuscadas, por exigir uma síntese filosófica dessa essencialidade. Ao mesmo tempo, exige um ritmo melódico no uso de uma certa simbologia de imagens textuais (ou gestuais) e às vezes de ênfase irónica na expressão prosódica própria (ortoépica) que pode ser “amarga ou doce” ao “saborearmos” o som dessas palavras. Mas o ritmo é essencial. Daí um pretenso poema será isso mesmo (pretenso) pela ausência do domínio técnico da língua e linguagem em que se escreve e se comunica oralmente. Acrescentando a essa falta de ritmo “poético”, surge a ausência de domínio dessa “essencialidade da escrita” (inspiração e síntese), podendo ser tudo menos poesia. Até pode ser panfleto político, publicitário ou pornográfico (bom ou mau graficamente), mas poesia não será, seguramente.

Da mesma forma é o que acontece com o desenho e a pintura, em que se “massacram” as mais elementares técnicas de artes plásticas com o epíteto de arte.

Na vida e na natureza há uma exigência de especialização através de uma poíesis [ii] ou praxis [iii] permanente. O amadorismo não progride, não vive. Sobrevive e mal. Sucumbe. Não se trata propriamente de um critério pessoal, mas de avaliação consubstanciada na observação das regras próprias da qualidade, do vigor da energia contagiante das ideias numa base construtiva e saudável. Ainda que, com os seus perigos de “contágio” em casos “mal intencionados”, de desvios, do exercício do Poder de vária índole. Uma forma de manipulação através da difusão massificada para audiências “cegadas”, ofuscadas pela globalização via satélite, por meios de novas tecnologias, da “auto-estrada da informação”, ao alcance de um click –, sejam na rádio, televisão, telefone móvel (Celular), Internet, et cetera. Mas isso seria entrar em análise de outros âmbitos apesar de inseridos sempre na temática da manipulação do pensamento humano –, na política e na publicidade comercial (vendas), através de técnicas de persuasão. O (in) vulgar “brainwashing” (lavagem cerebral), das guerras psicológicas, após modelo saído de uma “brainstorming” (reunião de vários especialistas para um único objectivo). E aí a Poesia livre, será sempre Poesia – a Poíesis dos antigos filósofos gregos e a dos anciãos africanos da antiguidade clássica baNto, a que culturalmente, a maioria dos Moçambicanos pertencem na sua raiz ancestral.

(João Craveirinha)

Exemplos de escrita em prosa poética: europeia e africana (baNto)

Portugal

O rapaz dos desejos

Conheci um anjo-rapaz que desejava intensamente a sua diaba-vizinha. Não sei o que aconteceu. Hoje vive no prédio uma rapariga-vampiro.

Ângelo Rodrigues (Poeta português de Torres Novas. Lic. em Filosofia).

Ângelo Rodrigues (2002). um bailado no centro da Alma (p. 52). Editorial Minerva. Lisboa

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Mozambique

And I am who I am

Here I am / Hybrid from black and white / Soft and Severe / Stubborn and lazy / Modest and proud / Obsessive and serene /Gentle and prudent / Nice and egocentric/ Perhaps I am ruled by/ The law of the opposites / Or perhaps it is merely/ A symbiosis of antithesis/ Which makes me an individual/ That is right…/ I am who I am/

Delmar ( Lisbon, 1996, 3rd February. Mozambican Poet from Quelimane, villa Pita and old Torrone).

Delmar Gonçalves (2006). MESTIÇO DE CORPO INTEIRO (Poesia, p.22). Editorial Minerva. Lisboa.

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Brasil

F I A T L U X [iv]

Era uma vez o escuro, / e fez-se a luz, / a tênue luz de um candeeiro, / então questionei:/ – Mal se divulga um vulto? / O candeeiro flamejou:/ – Para quem está no breu / qualquer lampejo é alumbramento. /

José Inácio Vieira de Melo (Poeta brasileiro)

Fiat Lux é um dos poemas do livro A Terceira Romaria (2005). Recentemente fez parte da prova de Língua Portuguesa do Concurso Público do Estado do Amapá – EDITAL N° 001/2006 – CEA/AP. Na prova, que foi aplicada nos dias 19 e 26 de Novembro de 2006, o poema foi explorado através de duas questões interpretativas de múltiplas proporções, as quais o autor não soube responder.

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Moçambique

“QUANDO MEU AMOR ME FAZ SENTIR LEÃO –

…Te recordas amor meu, / Quando tu rosnando/ Que nem Leoa no cio, / Me roçavas ronronando, / Me acariciavas ofegando, / Com tigresa ternura/ De fogosa felina? / E, em crescendo, / Rosnando de mansinho/ Me incitavas te excitando, / Em mim despertando, / O Leão, / Em meu corpo hibernando? / E tu, no teu apogeu, / Ansiosamente me esperando, / Orgasticamente em contenção, / Do Amor, na esquina do diapasão? / E, em infinita explosão, / Felinamente, / Nos reencontrando, / Tu e eu, / No chão, /Rugindo, / Leoa e Leão.../ Freneticamente/ Leão e Leoa, /Rugindo no Chão? / Te recordas de certeza !! / Teu Vanderley . Lisboa, 2004/01/07 – 20.53 hrs.

Com um profundo suspiro Jezebela lê e relê a folhinha conservada pelo tempo tal qual sua alma gentil de mulher sensível. O teor conhece de cor e salteado mas lhe dá uma sensação de auto estima profunda pegá-la e repegá-la e recordar os bons momentos passados com o seu amado Vander na altura Amor de sua Vida e quem sabe… mesmo depois?!...” João Craveirinha (2005). JEZEBELA – O CHARME INDISCRETO DOS QUARENTA- Crónica de uma Mulher (p.234/235). Universitária Editora. Lisboa .

João CRAVEIRINHA

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Pequeno excerto de: Poema MANICA do FEITIÇO para Teatro Moçambicano

de JOÃO Craveirinha © 2004 – Exórdio …” Feiticeiro iNdao, consultado, entra em transe! Os presentes… SENTEM O PODER CHEGANDO: - Davukaa! Muhlanga! Duvaa! (Acorda Muchanga! Zebra!) – Hi va ka xirho xirema, (Saíram de uma coisa a coxear) – xa ku remero ra re kure, bare (nascido de algo pesado que veio de longe) – phelo tlanga na xo, (mas brincam com ela) – Va hlanganissa tiko hi vurha !! (Reúnem-se na sua Terra!!)...

Nota: Baseado em canção laudatória em shiShona e shironga (inguni) arcaico, do século XIX, durante a formação em Manica e Sofala do Império de Gaza de Soshangane (avô de Gungunhane). Etno - linguisticamente, ainda não existiam o actual shinDao nem o shiShangaan em 1859 (ano da morte de Soshangane em Chaimite, Gaza). Seu filho Muzila morre em 1885 na Gorongosa (Udengo, Manica) e ainda não existiam maNdao nem maChangane. O antropólogo moçambicano, DR. (Phd) Eduardo Mondlane, não era por acaso que dizia Shonas de Moçambique em vez de iNdaos.



[i] Como disse o pensador moçambicano, José Craveirinha (1922/2003).

[ii] Poíesis: grego – “Actividade em algo” (deu em italiano poesia).

[iii] Práxis: grego – “Acção”. (Não confundir com a palavra “praxe” do latim (prácse / prática) também derivado do grego (praxis), nesse caso praktikós mas com o significado na origem de: aquele que actua).

[iv] Fiat Lux: latim – “Confia na Luz”.

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
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