SOBRE REVOLUÇÕES E GENOCÍDIOS

Todas as revoluções de inspiração marxista que ocorreram até hoje sempre levaram a algum tipo de terrorismo estatal, com o extermínio sistemático da oposição, execuções sumárias, e muitas vezes até a escravização de grande parte da população em campos de trabalhos forçados. O socialismo marxista, na prática, não parece ser muito melhor do que o capitalismo, que também escravizou, exterminou culturas e condenou milhões a condições de trabalho e subsistência duríssimas.

Por outro lado, a honestidade dos líderes revolucionários está acima de qualquer suspeita: não se pode negar que Lenin, Stalin, Mao Tse Tung, Fidel Castro, Pol Pot e outros queriam de fato construir uma sociedade justa onde todos pudessem ter condições de vida muito melhor do que sob o capitalismo. Por que, então, toda essa brutalidade quase sempre ocorreu?

A resposta está no próprio pensamento de Karl Marx e Friedrich Engels, que é uma das poucas doutrinas filosóficas que não possui ética. Pelo contrário, prescinde explicitamente dela, ao querer justificar tudo historicamente.

Marx viveu, pensou e escreveu no século XIX, auge do cientificismo, e sua obra também sofre deste problema: seu socialismo é dito “científico” porque seu criador pretensamente compreendeu o mecanismo da história e, assim, não apenas sabe como tudo ocorreu no passado, como ainda o que ocorrerá no futuro. Assim como a física newtoniana consegue explicar todos os movimentos a partir das noções de força e inércia, permitindo mesmo prever a velocidade, trajetória e aceleração dos corpos, para Marx os conceitos de modo de produção econômico e luta de classes seriam também capazes de prever o desenvolvimento futuro da história: o capitalismo entraria em bancarrota, uma revolução proletária ocorreria, surgiria o socialismo, que pouco a pouco nos levaria ao comunismo, uma sociedade absolutamente igualitária onde não haveria nenhuma classe.

Tudo, então, é historicamente justificável: o que importa é atingir o socialismo e finalmente o comunismo, independentemente dos meios. Não é necessário, para Marx, uma ética: toda ética é relativa, depende do momento histórico. Só um conhecimento cientítico da história, que explique seu mecanismo, pode nos dizer o que é certo ou errado, ou seja, respectivamente, o que nos leva ao comunismo e o que nos afasta dele.

Parece que é exatamente aqui que está o desgaste ideológico do marxismo, que cada vez atrai menos adeptos. Depois de conhecidos os massacres perpretados por Stalin, Mao Tse Tung e Pol Pot, todos aqueles que querem mudar a sociedade se perguntam se os fins justificam os meios, e se vale a pena lutar por uma revolução que muito provavelmente levará a massacres e campos de trabalho forçado. Não é verdade que a humanidade subitamente perdeu seu idealismo e seu desejo de lutar por um mundo mais justo; o que aconteceu foi que se percebeu que a principal doutrina revolucionária mostrou-se muito propensa a desencadear no homem o que ele tem de pior.

Isto já foi percebido muito antes do fim do socialismo em vários países e o conhecimento inegável de todas as barbáries praticadas neles. Lev Tolstoi, que morreu em 1910, antes da primeira revolução socialista, já criticava os revolucionários por isto: admirava seu desejo honesto de mudar e melhorar o mundo e principalmente sua disposição de sacrificar-se por tal ideal, mas os reprochava por não terem uma ética e temia que sua revolução pudesse ser inútil.

Ernesto Sábato, escritor argentino, de certa forma continuador de Tolstoi, escreveu: “Nem o terror das ditaduras de direita, nem o terror das ditaduras de esquerda. Violência sim, quando é indispensável: jamais violação dos direitos humanos. Tampouco o terrorismo indiscriminado. Que pátria podemos esperar desses terroristas do ETA, que explodem inocentes com suas bombas em aeroportos e hotéis? Hitler morreu, mas o hitlerismo triunfou, não apenas em seus atuais adeptos da direita, mas em uma nova e paradóxica forma de sua perversidade: o nazismo de esquerda. Já estava no stalinismo, mas agora é mais tetricamente nítido.” Sábato foi socialista em sua juventude, mas abandonou o partido na década de 30, quando começou a suspeitar dos extermínios massivos da época de Stalin.

O tempo mostrou que ele tinha razão. Porém, longe de tornar-se um niilista amargurado que não crê em nenhuma possibilidade de melhora da situação humana (como acontece com muitos ex-socialistas), Sábato é um anarquista cristão (como Tolstoi) que crê que uma verdadeira revolução é possível, não com golpes, guerras civis, pelotões de fuzilamento e campos de trabalhos forçados, mas com a conscientização ética. Como escreveu Tolstoi em um de seus últimos contos, se todos vivessem de acordo com o ensinamento de Cristo, não seria necessário a revolução: se todos fossem justos, a sociedade inevitavelmente também seria justa. Isto parece mais utópico e mais difícil de ser realizado do que a proposta revolucionária marxista, e com certeza não parece estar em vias de acontecer em um futuro previsível. No entanto, parece ser a única possibilidade verdadeira de construção de uma sociedade melhor, porque a lição do fracasso do socialismo marxista é que de modo algum podemos abandonar a ética. Não há fim justo, se os meios são injustos.

Carlo MOIANA Pravda. Ru BRASIL in Buenos Aires Argentina

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