Fórum da Família

Primeiramente, quero elogiar a iniciativa do amigo Armando, que propôs a discussão desse tema aqui no PRAVDA. Comecei a refletir sobre o fato de que todos nós hoje em dia enfrentamos problemas gravíssimos dentro de casa e geralmente temos medo até de falar sobre eles. É como se não falar sobre o problema fosse fazê-lo deixar de existir. Mas eles existem e se tornam mais graves a cada minuto, como uma bola de neve arrasadora que desce furiosa da montanha em nossa direção. E nós, mesmo de olhos fechados, podemos ouvir o ruído ensurdecedor que nos paralisa de medo.

Eu disse "todos", todos enfrentamos problemas gravíssimos em casa. Isso porque a vida em sociedade faz do problema do vizinho o nosso problema também. O adolescente viciado, mesmo anônimo, pode cruzar a nossa vida a qualquer momento. Matando, roubando, agredindo, violentando ou simplesmente jogando a realidade cruel do seu sofrimento na nossa cara e perturbando a nossa consciência, tirando o nosso sono.

Infelizmente, a minha experiência com uma adolescente rebelde, perturbada, problemática e muito provavelmente usuária de drogas, está longe de ser uma visão de expectadora. Há 14 anos, minha mãe cuidava de uma senhora idosa e bastante doente que morava próximo à minha casa. Essa atitude caridosa da minha mãe foi estendida à netinha recém-nascida daquela senhora. Um bebê cuja mãe (adolescente, viciada, talvez até prostituída...) saía de casa por mais de 3, 4 dias e a deixava abandonada, sem comida, banho, carinho, na casa dessa avó, que mal podia cuidar de si mesma. Foi então que minha mãe salvou sua vida a levando pra nossa casa e dando-lhe um lar. Um lar com pai, mãe, seis irmãs e muito carinho. Meus pais não chegaram a adotá-la, mas hoje têm a responsabilidade legal sobre ela.

Em retribuição a isso, hoje, 14 anos depois, essa menina se tornou uma adolescente quase tão problemática quanto sua mãe biológica o era (e ainda é). Agride meus pais verbalmente e demonstra ódio e revolta que não conseguimos justificar. Queima roupas, rouba dinheiro, sai de casa e volta dois dias depois sem dar a menor explicação. Envolve-se sexualmente com homens casados, com integrantes de gangues, provoca brigas nas ruas e mente rotineiramente. Vive uma vida de farsa, finge carinho quando quer alguma coisa (principalmente dinheiro), joga com os sentimentos dos meus pais, joga com a nossa relação com eles.

Enfim, tornou-se a maior preocupação que nossa família já teve em toda a nossa vida. Apesar de saber que muitos dos seus amigos são usuários de drogas, ainda não tivemos evidências do seu envolvimento com elas, mas não há outra explicação para esse comportamento. O resultado disso até agora é uma família que se dividiu. Filhas preocupadas com seus pais, idosos (65 e 70 anos) e frágeis diante dessa situação. Filhas que se revoltam e se angustiam por não poder assumir a autoridade dos pais dentro de casa e expulsá-la pra bem longe. Pais que criaram laços profundos de afeto com aquela criança e não conseguem reconhecê-la nessa adolescente que os agride a cada dia. A preocupação de que a qualquer momento essa bola de neve que não pára de ruir exploda sobre nossas cabeças, inclusive e principalmente sobre ela. Qual será a próxima cena desse filme de terror? Roubo, violência física, gravidez, AIDS, morte? Tudo que acontecer a ela, acontecerá também aos meus pais. Tudo que acontecer a eles, acontecerá a toda a família. Conversas, diálogos, confiança, tolerância... foram remédios impotentes com ela. As palavras de orientação, de alerta, de reflexão que tentamos a cada dia fazê-la entender eram esquecidas num prazo máximo de 2 ou 3 dias.

Não conseguimos vencer isso ainda. Rezo para que ela sobreviva mais uns 5 anos (e nós também, principalmente meus pais!) para que talvez o juízo chegue à sua cabeça quando tiver mais idade. Não sei. Essa talvez seja uma visão ingênua, talvez meus olhos ainda estejam fechados. Confio em Deus, em primeiro lugar, que deve saber porque estamos vivendo isso. Uma família feliz, onde os pais criaram e educaram muito bem suas seis filhas legítimas e hoje se sentem fracassados, impotentes e temerosos por causa de uma menina de 14 anos.

Talvez o mundo de hoje tenha mudado tanto que não conseguimos entendê-lo, entender os fatores que a levaram a reagir de forma tão diferente ao amor que recebeu dos meus pais e de nós, o mesmo amor que nós recebemos e valorizamos tanto. Afirmo com toda segurança que ela foi amada e cuidada como uma filha legítima. Talvez até com mais cuidado, com algumas regalias que nem nós tivemos. Não consigo abrir os olhos, confesso que tento esquecer e acreditar que isso vai passar como que por um milagre, mas o barulho é ensurdecedor.

Concluindo, acho que a família é a base de todas as soluções e talvez a causadora dos maiores problemas que enfrentamos. Uma família unida, amorosa, saudável, foi a minha base para ser a mulher feliz e realizada que sou hoje. Uma história de abandono e uma péssima referência dos pais biológicos não conseguiram permitir que ela se tornasse uma adolescente feliz e saudável. E talvez ela acabe por perder todas as chances de construir um belo futuro. Mas mesmo não sabendo o que é o mais certo a fazer, sei que é errado desistir. O que está em jogo é uma vida humana, e muitas outras vidas ligadas a ela. Então, nessa batalha diária, a cada dia aprendemos um pouco, ficamos mais fortes, às vezes mais fracos, nos unimos e nos afastamos. Mas estamos ligados de alguma forma. E, afinal, a vida é mesmo todo o processo, o caminho, e não a chegada. Renata Valadares de Carvalho Brasília, Brasil Resposta à carta da Renata Valadares de Carvalho de Brasília

Renata, primeiro quero agradecer o seu comparecimento no Fórum da Família, depois, tentando fazer você compreender o que se passa na cabecinha dessa garota, vou lhe dar a minha opinião!

Essa garota não agride vocês, mas simplesmente agride quem a tirou do meio em que vivia. Ela odeia a mãe biológica, pois foi ela quem a abandonou, muito antes de vocês a levarem para casa.

No meu artigo que abre o Fórum da Família, eu sito a pergunta que os jovens, como ela, devem estar fazendo à sociedade: Que faço? Apesar de, enquanto esperam a resposta da sociedade, eles demonstram o ódio que sentem por esse ente que os deixaram confusos e decepcionados. Mãe! O mais sublime ser sobre a face da terra?

E ela foi deixada sozinha no mundo! Vocês? Estranhos que vieram lhe oferecer piedade! Sim amiga, vocês podem estar sendo odiados por ela. E, o amor que vocês pretendem oferecer a ela não é aceito!

Ela odeia o mundo, e vocês pertencem a esse mundo! Tudo o que digo, sinto que ela diria se pudesse aceitar o mundo em que vive!

Uma criança abandonada no mundo, encontra depois de, para ela séculos, algumas pessoas que querem ama-la, mas ela não aceita o amor que vocês lhes oferecem, pois não acredita que existe alguém melhor do que uma mãe!

É loucura? Mas é o pensamento de uma criança gravemente ferida! Não sei o por que, mas consigo sentir o que ela sente, e creio que só um grande milagre fará ela se salvar do caminho que está seguindo.

AMOR não se impõe, oferece-se quando se quer e temos que ter a coragem de reconhecermos que não fomos aceitos. Duro, mas verdadeiro. Poderia escrever muitas e muitas páginas, sentindo e tentando lhe informar o que ela ou elas pelo mundo afora estão sentindo nessa situação. Não sei o por que, mas é assim. Abraços do amigo Armando.

Armando COSTA ROCHA PRAVDA.Ru BRASIL

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