Ecos do Bataclan

Ecos do Bataclan

Uma das preocupações mais recorrentes na luta contra o terrorismo são os chamados "copiadores" - aqui também rotulados de "lobos solitários". São indivíduos que nutrem as mesmas convicções de quem executa ataques terroristas, mas não desenvolvem a articulação necessária para colocá-los em prática - ao menos até verem um caminho claramente posto à sua frente, que basta ser repetido.

* Fabricio Rebelo

É um elemento corriqueiro para quem atua na área de inteligência preventiva, especialmente os grupamentos especializados no combate ao terror, cujos responsáveis, justamente por isso, condenam o detalhamento de como agem os agressores, tão comum nas coberturas midiáticas.

Há pouco mais de seis meses, Paris foi palco do mais dramático atentado terrorista de sua história. Uma série de ataques coordenados levou pânico à bela capital francesa, dentre os quais um massacre na casa de espetáculos Bataclan. Foram mais de cem mortos, numa carnificina facilitada pela total impossibilidade de defesa das vítimas, que assistiram à ação de seus algozes por vários - e intermináveis - minutos, gritando, se escondendo, tentando fugir ou pedindo socorro pelo celular, mas sem nenhuma chance de reação. Não só no Bataclan, mas em toda a França o porte de arma pelo cidadão civil é proibido - salvo, como visto, se você for um terrorista que não respeita essa lei, a colocando no mesmo rol daquela que proíbe matar alguém.

Os ataques de Paris foram obra do Estado Islâmico, grupamento radical que usa a fé religiosa como fundamento para atos terroristas, o mesmo que, no último domingo, reivindicou a autoria do maior ataque armado praticado em solo norte-americano. Em Orlando, Omar Saddiqui Mateen, cidadão estadunidense de origem muçulmana, após viajar cerca de 200 quilômetros desde Port St. Lucie (onde morava), se dirigiu à boate Pulse, voltada ao público homossexual, e ali abriu fogo a partir das 2h da madrugada. Permaneceu no local até às 5h, quando foi morto pela polícia. Até ser neutralizado, Omar matou aproximadamente cinquenta pessoas, ferindo outras tantas.

As semelhanças entre os dois ataques são latentes. A exemplo do que ocorreu no Bataclan, as vítimas da boate Pulse não puderam se defender, pois ali é proibido entrar portando armas de fogo. Sem defesa, buscaram se esconder, tentaram fugir, pediram socorro pelo celular, exatamente como fizeram as vítimas em Paris. Em vão. Foi outra grande carnificina, ainda que com a metade das vítimas francesas.

Omar Saddiqui Mateen é nitidamente um copiador. Fez em Orlando o mesmo que foi feito na França, valendo-se da exata mesma impossibilidade de defesa das vítimas e agindo com a calma de quem tem plena consciência dela. Somente foi parado com a chegada da polícia, o que sempre é muito tarde para as dezenas de mortos e feridos.

Outro que parece ter embarcado na imitação é o Presidente Barack Obama, entoando precipitadamente seu discurso desarmamentista, com o habitual apelo emocional, incompatível com qualquer análise mais criteriosa. E dessa vez a precipitação acabou revelando uma inesperada confissão velada.

Ao discursar sobre o atentado, Obama declarou que o fato era "um lembrete sobre como é fácil para alguém colocar as mãos em uma arma e atirar em pessoas numa escola, numa igreja, num cinema ou em uma boate". E pela primeira vez ele está certo sobre o assunto. Escolas, igrejas, cinemas e boates são clássicas gun-free zones, ou seja, locais em que portar armas é proibido. E são, também, os palcos recorrentes para os ataques em massa, sejam terroristas, sejam fruto de insanidade doméstica.

Elencando onde os ataques ocorrem, Obama evoca o argumento mais expressivo contra a sua verdadeira cruzada contra as armas: o de que é a falta delas em determinados locais que facilita a ação de quem, ilegalmente, as usa para praticar os ataques. E é difícil não ceder à obviedade do argumento quando se nota que o agressor de Orlando, tal como os terroristas de Paris, somente foi parado por armas, as dos policiais.

Obama segue retilíneo, sem sequer adaptar seu discurso a cada novo episódio de violência. E continua sendo ignorado em sua obsessão desarmamentista, tal como os inofensivos devaneios de um idealista utópico. Inofensivos, contudo, não são os copiadores de ataques terroristas bem-sucedidos. Enquanto forem irresponsavelmente preservados os elementos que os fomentam, a exemplo da inviabilização da autodefesa, continua alto o risco de vermos novos ecos do Bataclan, agora reverberados pelo massacre da boate Pulse.

 

* Fabricio Rebelo é coordenador do Centro de Pesquisa em Direito e Segurança - Cepedes e autor de "Articulando em Segurança: contrapontos ao desarmamento civil".

 

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