Eleições RD Congo

Se o "jacaré" acordar...

Eugénio Costa Almeida

Eleições RD Congo. 16057.jpegA República Democrática Do Congo (RDC) está na ressaca das votações presidencial e legislativa ocorridas na passada segunda-feira, 28 de Novembro. No momento que escrevo estas linhas ainda não se sabe quantos votaram e quem liderou a votação. Sabe-se, outrossim, que houveram distúrbios e boicotes em alguns círculos, nomeadamente em Lubumbashi, capital do Shaba/Katanga.

Todavia, é ponto assente que Joseph Kabila Júnior, tem todas as condições para voltar a ser o escolhido como o "leopardo" da RDC à frente, bem a frente, de todos os seus adversários, por muito que estes sejam mais credíveis, estrebuchem ou tenham apelado a um boicote sectorial nestas últimas eleições.

E se Kabila parece estar na "pole position" para continuar como presidente da RDC, apesar da forte presença eleitoral de Etienne Tshisekedi, o já experiente candidato oposicionista, essa é também a vontade de Luanda e do Governo angolano dado que, por um lado, já conhece a "peça" e por outro Luanda quer a manutenção da RDC estabilizada porque os dois países partilham uma longa fronteira comum (apesar desta estar a ser sujeita a um escrutínio feroz por parte dos congoleses na parte norte marítima angolana) onde as populações convivem há muitos séculos e pelo facto dessas eleições poderão ser determinantes para o futuro das relações entre os dois países.

Não esqueçamos que as relações Luanda/ Kinshasa só melhoraram depois da geração Kabila (pai e filho) se ter implantado na vida política congolesa. Como reconhecia o meu colega David Zounmenou, cientista político do Instituto de Estudos de Segurança (ISS) em Pretória, África do Sul, à germânica rádio Deutsche Welle, é sabido que a reeleição de Kabila , significará "a continuidade das relações entre Angola e a RDC, que aliás conheceram no passado alguns momentos dolorosos,  nomeadamente com as expulsões de refugiados de um país para o outro e que provocaram algum diferendo entre Luanda e Kinshasa" mas que nos últimos anos "foram desenvolvidos muitos esforços por ambos os lados para que essas relações se normalizem" como na já referida questão das fronteiras marítimas a Norte de Angola. Ora uma inversão desta previsível situação poderia ser catastrófica para a actual potência regional da África Central, Angola.

Um qualquer outro novo presidente na RDC poderia constituir um forte risco para todos os esforços realizados até agora. Este é um facto que condiciona as relações entre a RDC e Angola pelo que estes desejam, abertamente, que Kabila e o seu partido sejam - tenham sido - os vencedores do escrutínio da passada segunda-feira.

A simples incerteza sobre um algum novo presidente que não seja Kabila poderá - e fará - cabalmente preocupar Luanda. E para que este desígnio se torne realidade e Kabila se mantenha na cadeira do poder, houve por parte deste uma alteração à Constituição - já começa a ser usual, em alguns estados africanos (e não só, também na América Latina) esse tipo de propósito - para que a sua (re)eleição fosse (seja) efectiva. A nova disposição  constitucional determina que agora basta uma maioria simples e uma única volta para se tornar - ou permanecer - como presidente da RDC. E, não esqueçamos que Kabila, apesar de esta ser uma segunda caminhada para se manter no poder - em princípio e de acordo com a Constituição, segundo e último mandato - na verdade Kabila já se encontrava há cerca de 5 anos no poder antes de ser formalmente legitimado em 2006 nas suas primeiras eleições. Algo que, parece já conhecermos de mais perto...

Ora se a Luanda é interessante que Kabila seja o presidente (re)eleito também lhe interessa que o "grande jacaré", como é conhecido a RDC em certos sectores da área político-estratégica e como também o provei numa conferência havida há cerca de 2 anos em Luanda, na Universidade Lusíada de Angola, e o provo no meu recente ensaio e já aqui tornado público no Novo Jornal, se mantenha adormecido e não questione a posição geoestratégica de Angola no seio dos Estados africanos do Centro e Centromeridional de África.

Porque, caso o "grande jacaré" acorde, a situação geopolítica, geomilitar e geoestratégica de Angola - e, de certa maneira, da África do Sul e para a Nigéria - na região e no Golfo serão fortemente questionadas. Actualmente isso é algo que às duas potências austro-africanas menos interessa! Conquanto ele esteja adormecido melhor será para a região, em particular para os Grandes Lagos e para os Estados limítrofes.

Para Angola, há um facto que adiciona a necessidade de actual estabilidade política e governativa na RDC e que o "jacaré" continue narcotizado: uma RDC volúvel tornaria o Enclave de Cabinda mais instável, com consequências imprevisíveis.

 

*Investigador e analista político

 

Novo Jornal 202 - Primeiro Caderno (1)

 

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