Muitas Lições nos 39 anos da Revolução Iraniana

Muitas Lições nos 39 anos da Revolução Iraniana

Beto Almeida*

No dia 9 de fevereiro de 1979, chegava ao poder uma  Revolução que mudou radicalmente a face socioeconômica  da nação persa. Liderada pelo Aiatolá Khomeini, ela completa agora os seus 39 anos de existência, de resistência e de progressos multitudinários que muitas lições oferecem às forças progressistas no mundo, especialmente no Brasil.

O ano de 1979, quando estava em franca expansão a Teologia da Libertação, foi pródigo por oferecer à História duas revoluções com inegável participação de religiosos em sua direção. No Irã e na Nicarágua, esta em julho de 1979.

Sempre observada com dose de desconfiança  e preconceito por alas da esquerda brasileira, o mesmo preconceito que nutriu uma equivocada avaliação sobre o trabalhismo de Getúlio Vargas, a Revolução Iraniana demonstra, ao longo dos anos, de modo exemplar,  como com unidade cívico militar alavanca a capacidade vencer as armadilhas e sabotagens golpistas que o imperialismo lhes colocou no caminho, a começar pelo bloqueio de todas as reservas financeiras iranianas nos bancos internacionais, algo superior a 100 bilhões de dólares, bloqueio ilegal, até hoje não devolvidos.

Irã derrota a Coação da História

Vale registrar que o Irã, tal como o Brasil, teve ceifado, nos anos 50, uma via própria de libertação da Coação da História, uma caracterização usada por Getúlio Vargas para definir a opressão imperial exercida sobre os países periféricos. O governo nacionalista de Mossadeg, que também nacionalizou o petróleo e dava passos fortes na independência do Irã, foi derrubado, em 1953,  por um golpe organizado pela Cia, tal como o governo de Getúlio Vargas, que realizara a Auditoria de Dívida Externa, industrializara o país e erguia a Petrobras, apoiada em amplos direitos sociais e laborais, como uma alavanca para sua definitiva soberania e independência. Àquela altura, o Brasil registrava taxa de anual de crescimento de 12 por cento. Nem a China... Tanto Mossadeg, Vargas, Jacob Arbenz, na Guatemala, e no ano seguinte, 1955, Juan Domingo Perón, foram derrubados por operações golpistas similares. Mas, a incompreensão de uma parcela da esquerda teve significativo peso para o correto entendimento destes processos.

No Irã se verificam alguns dos pressupostos da Teologia da Libertação, que, aparentemente, seria apenas voltada para a ação do mundo religioso católico, mas que, no caso iraniano revelou-se como uma leitura autêntica, rigorosa e verdadeira das palavras dos Islâ,  e que encontrou na revolução social uma via transformadora da relações sociais, culturais, econômicas, científicas e tecnológicas, inclusive com uma doutrina própria e eficaz para a defesa e a soberania. Sem esta unidade dos diversos campos de atuação social, a Revolução Iraniana não teria sido vitoriosa, pois logo em 1980 o imperialismo manipulou o Iraque de Sadam Houssein contra o Irã, numa guerra de 8 anos de duração e mais de milhão de mortos, prova dura para a Revolução Iraniana que, não apenas foi obrigada a sacrificar parte de sua juventude, como também, ao mesmo tempo, teve que construir seus próprios meios de defesa, ao passo que o Iraque era armado pelos EUA. Tal exigência imposta ao Irã lhe  proporcionou um grande salto tecnológico, contando apenas com recursos nacionais e de uma nova geração de cientistas, organizados com base em políticas estatais vigorosas, com a clareza de que se tratava de uma questão de Independência ou Morte para a Revolução.

Salto Tecnológico Iraniano

Seria muito extenso relatar todos os enormes êxitos da Revolução Iraniana, mas vale o registro de que hoje, a indústria petroleira totalmente estatal, não possui um único técnico estrangeiro, sendo que, depois do golpe contra o "varguista"Mossadeg, fora ocupada totalmente pelos ingleses. Além da tecnologia petroleira nacionalizada, o Irã exerce o direito que possui, obviamente, de desenvolver, também, a indústria nuclear, o que tem sido feito com recursos nacionais, muito embora haja também alguma colaboração tecnológica russa. A mídia ocidental apresenta o Irã como se fosse um país retrógado, mas, na realidade, trata-se de um país com alto nível de desenvolvimento científico, tecnológico e cultural.

Comparando com o Brasil, o Irã avançou enormemente em seu programa nuclear, que, no Brasil, foi iniciado também na Era Vargas, sob a direção do nacionalista Almirante Álvaro Alberto, mas, até hoje, o programa brasileiro sofreu ações de descontinuidade, sobretudo nos períodos de governos antinacionais, com o de Fernando Henrique Cardoso e, pior ainda, agora com a marionete imperial Michel Temer. No Irã, sustentada por uma forte unidade cívico-militar, construída a partir das mesquitas, verifica-se que foi exatamente essa unidade que derrotou,  recentemente, com a mobilização de milhões de iranianos nas ruas, o golpe organizado pela Cia, que agora tenta insistir na Campanha Intervencionista para que as mulheres retirem o Chador (Véu), quando, em um plebiscito realizado na década de 1980, as mulheres decidiram, pelo voto democrático, pela manutenção de um costume ancestral. Ou seja, é o próprio governo , com o apoio natural das mesquitas e o uso patriótico dos meios de comunicação, que convoca a mobilização popular que desbaratou a sabotagem imperialista. No Brasil, o governo Dilma não realizou uma imprescindível convocação do povo para exercer democraticamente a defesa do processo democrático

A democracia ocidental é a que mais organiza ditaduras

Ou seja, diferente do Irã o Brasil não foi capaz de reagir às manobras de desestabilizações de sua soberania e sucumbiu ingenuamente ante as operações externas para interromper o curso de transformação que, com a eleição de Lula, permitia recuperar parte do programa soberano que teve início na Era Vargas, com a Revolução de 30. Os exemplos do Irã , ao longo destes 39 anos de revolução, jamais foram discutidos com seriedade e profundidade pela esquerda brasileira que, em boa medida, em algumas alas, contentava-se com a condenação ao processo iraniano adotando como molde um critério de  avaliação sustentado em falsos conceitos de democracia ocidental. A democracia ocidental é a que mais organiza ditaduras.

Antes da Revolução de 1979, o Irã vivia sob ditadura sanguinária do Xá Reza Pahlevi, apoiado pelos EUA e o ocidente, sem eleições, sem direitos sindicais. Mas, desde a Revolução, todos os governos iranianos foram eleitos pelo voto direto e secreto, o que não ocorre nos EUA ou na Arábia Saudita. Atentos às ações externas de desestabilização, a Revolução Persa tem derrotado todas as tentativas de golpe, tem vencido todas as sanções econômicas e financeiras, derrotou a própria agressão militar em que o império terceirizou o Iraque de  Sadam , e hoje, o Iraque já é um grande aliado do Irã, que, por sua vez, tem papel decisivo, ao lado da Rússia, para salvar a soberania da Síria, atacada por um terrorismo fabricado em Washington, como reconheceu Hillary Clinton, em  entrevista divulgada por Telesur, quando disse que "sim, os EUA fundaram a Al Qaeda" .

 Ataque ao Chador visa o programa nuclear do Irã

Obama, falso Prêmio Nobel da Paz, sempre esteve por trás das operações de apoio ao chamado Estado Islâmico, que, pretendia arrasar a Síria, como arrasou com a Líbia (derrubando o regime de mais elevado IDH da África), para só então atacar o Irã. Ao contrário dos governos democráticos populares no Brasil, quando os alertas sobre ingerência externa não foram levados a sério, como, por exemplo, os escancarados financiamentos às Jornadas de Junho de 2013, saudadas por uma certa esquerda.  A direção iraniana, com uma original  aplicação dos ensinamentos islâmicos em sintonia com os valores da soberania e  da  independência nacionais, tendo por base uma revolução que contou com a participação armada das mulheres, com o Chador, mobilizou sempre milhões e milhões de iranianos para os esforços da defesa da Revolução bem como para avanço científico e tecnológico   -  o Irã já envia naves tribuladas ao espaço sideral, e o programa espacial brasileiro está sob intervenção externa   -   e também para o progresso da cultura, com justificado reconhecimento ao talentoso e humanista cinema  persa.

Fantasia e credulidade

Ao contrário do descuido e da superficialidade com que parte da esquerda brasileira tratou as notórias ações de ingerência, espionagem e desestabilização contra a Petrobras, o governo, as instituições brasileiras, a direção iraniana , com sua singular aplicação de uma dialética teologia da libertação, organiza a defesa da Causa Palestina, organiza uma Frente Única Anti-imperialista com a Rússia e a China para defender a Síria e  para promover um comércio regional, com a justa exclusão da moeda sem lastro chamada  dólar, oferecendo, ao mesmo tempo, uma admirável solidariedade persa à Revolução Bolivariana da Venezuela. Descuidada, a esquerda brasileiro ignorou os avisos e sucumbiu na credulidade em torno do funcionamento de instituições que já estavam controladas a partir do poder imperial externo, o mesmo poder que agride, mas não consegue vencer a resistência popular e estatal da Revolução Iraniana.

A beleza de ser um eterno aprendiz

Seria muito útil que as forças democráticas brasileiras, na luta ela recuperação plena da democracia, hoje anulada, refletisse com afinco sobre o que tem possibilitado à Revolução Iraniana, nestes 39 anos de vitória, tantos avanços em sua própria industrialização, e, sua sofisticada tecnologia de defesa e aeroespacial, nos tremendos avanços nas áreas de saúde e educação (hoje o Irã é um polo de turismo em saúde na Região)  e, também, sobre a constante convocação, sem vacilações, da mobilização popular para defender , com milhões nas ruas, todas as conquistas da Revolução iniciada  criativamente nas Mesquitas, liderada pelo  Aiatolá Khomeini e que conquistou também respeito na humanidade.

A Revolução Iraniana jamais agrediu qualquer país, mas desenvolveu, com recursos próprios, uma elevada capacidade de defesa para preservar todas as conquistas a partir de 1979, inclusive, o direito de prestar solidariedade ao povo sírio e palestino, agredidos criminosamente pelos Eua e por seu satélite, Israel. São muitas lições a extrair do processo revolucionário iraniano, mas, para tal, aquela revolução merece ser examinada com respeito e sem preconceitos pelas forças progressistas brasileiras

*Beto Almeida, jornalista, Membro do Diretório da Telesur

Participou da I Conferência Científica Internacional do Movimento dos Não-Alinhados, em Teerã, em 2012

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