NATO-RÚSSIA: Perguntas para a segunda presidência de Bush

As relações entre a Rússia e a NATO nos próximos quatro anos, depois da nova vitória de George Bush-júnior nas presidenciais, tornaram-se o tema central das conversações que no início de Novembro efectuou na capital russa o embaixador dos Estados Unidos na Aliança Atlântica, Nicolas Burns. O diplomata encontrou-se com dirigentes dos Ministérios dos Negócios Estrangeiros e da Defesa, assim como peritos e jornalistas de Moscovo.

Embora o embaixador Burns só pelo seu cargo devesse proferir frases tipo "as relações entre a Rússia e a NATO continuam a ser um factor significativo da segurança europeia e desempenham cada vez maior papel na guerra contra o terrorismo", para ele, apesar da arte diplomática, foi difícil dissimular que, ultimamente, entre Moscovo e Bruxelas nem tudo corre tão bem como se desejaria. Um dos indícios disso é o facto de o actual secretário-geral da NATO, Jaap de Hoop Scheffer, não visitar Moscovo desde há muito tempo, ao contrário do seu antecessor que se deslocava à capital russa de seis em seis ou de quatro em quatro meses, no mínimo.

De multilateral, a parceria entre a Rússia e a NATO torna-se cada vez mais bilateral: russo-italiana como os exercícios IONIEX-2004 no mar Jónio ou russo-francesa como as manobras navais no Atlântico Norte, com a entrada do submarino atómico russo "Vepr" no porto e base militar francesa de Brest, ou russo-americana como os exercícios "Águia Branca" no Atlântico em que participaram os grandes navios anti-submarinos russos "Admiral Levtchenko" e "Severomorsk". Mesmo as manobras antiterroristas "Avaria-2004", para a protecção de estruturas militares nucleares, reuniram observadores não de todos os 26 membros da aliança, mas apenas de 17.

A Rússia concedeu o direito de livre trânsito através do seu território para o Afeganistão não a todos os participantes na coligação antiterrorista, mas só à Alemanha e França. Este facto não passou despercebido aos peritos e jornalistas que se dedicam ao problema das relações entre Moscovo e Bruxelas.

Por que motivo estas relações arrefeceram assim nos últimos tempos? A esta pergunta tentou responder Nicolas Burns.

Algumas personalidades oficiais em Moscovo, disse, continuam a considerar que a NATO não responde aos desafios de hoje, enquanto o alargamento da aliança para leste ameaçaria a segurança da Rússia. Embora tudo isso está longe da realidade, afirma o embaixador. "Os nossos países, - diz Nicolas Burns, - ainda não esgotaram o seu potencial assente no Conselho Rússia - NATO". Entre as esferas da interacção de Moscovo e Bruxelas o diplomata referiu tais vectores como a fundamentação e criação de um sistema ABM no Teatro de Operações Militares da Europa, a luta contra a propagação de armas de extermínio em massa e tecnologias de mísseis, o resgate de tripulações de submarinos naufragados, as conferências científico-práticas de oficiais de 27 países (NATO + Rússia), em que se elabora uma compreensão comum de comandos e ordens, e outros factos que ultimamente não têm tido suficiente cobertura informativa.

"O alargamento da NATO não representa uma ameaça para a Rússia, - afirma Burns, - porque é um factor estabilizador para a Europa e não apenas para ela. A aliança ajudou a prevenir muitos conflitos e hoje continua a desempenhar o seu papel pacificador tanto nos Balcãs, como no Afeganistão".

Nem todos os participantes no encontro de Burns com peritos e jornalistas concordaram com tais afirmações. Assim, o analista científico do Instituto de Economia Mundial e Relações Internacionais, major-general na reserva Vladimir Dvorkin, apontou que é difícil imaginar como as operações de resgate no mar se combinam com a luta contra o terrorismo, enquanto as conversas sobre a criação do sistema ABM na Europa não passam além de declarações políticas. Estes e outros factos não ajudam a reforçar a confiança da Rússia em relação à NATO, tal como a falta de um mecanismo real de compatibilidade operacional de estruturas militares dos países que pertencem ao Conselho Rússia - NATO.

Os peritos de Moscovo falaram também que o reforço desta confiança é impedido pelas armas nucleares dos Estados Unidos instaladas no continente europeu nos países que não fazem parte do "clube nuclear". Além disso, o Kremlin e os seus aliados na Organização do Tratado de Segurança Colectiva estão preocupados com a excessiva actividade da direcção da NATO em algumas ex-repúblicas soviéticas, sobretudo no Cáucaso do Sul. Foram mencionadas também a recusa da Lituânia de deixar passar pelo seu território as cargas militares da Rússia com destino à região de Kaliningrado e outras acções de Bruxelas e países-membros da NATO que não contribuem para a compreensão mútua entre a aliança e a Rússia. Mas Nicolas Burns, não desmentindo como um bom diplomata os factos geralmente reconhecidos, afirmou que todas estas acções visam um único objectivo - o reforço da estabilidade no continente e em torno do Iraque e Afeganistão, onde na luta contra o terrorismo participam alguns países da NATO e as suas estruturas unificadas. A mesma tarefa, na sua opinião, têm as armas nucleares dos Estados Unidos instaladas na Europa - a de proteger os aliados, que não dispõem de tais armamentos.

Ficou, no entanto, não esclarecida a pergunta-chave - de quem devem as armas nucleares dos Estados Unidos proteger os aliados europeus? Só está claro que não é dos terroristas.

Nos corredores do encontro houve também muitas conversas sobre os "padrões duplos" de alguns membros da NATO na chamada luta conjunta contra o terrorismo. Os emissários de Maskhadov continuam a ser recebidos nas capitais da Aliança Atlântica e entre os terroristas chechenos cresce diariamente o número de mercenários não apenas dos países árabes, mas também de Estados da NATO. São cidadãos do Canadá, Turquia (nos últimos cinco anos, 25 pessoas oriundas deste país foram eliminadas no território da Chechénia) e representantes de outros Estados cujos governos não empreendem as devidas medidas para interceptar a actividade de diferentes organizações separatistas e terroristas nos seus territórios.

Esteve em foco também a situação no Afeganistão, onde 10 mil soldados e oficiais da NATO continuam a efectuar durante anos uma operação antiterrorista, mas o narcotráfico do país na fronteira com o Tajiquistão não apenas não diminui, como, pelo contrário, aumentou em flecha nos últimos tempos. Porém, Nicolas Burns prometeu aos participantes no encontro que nos próximos dias começará uma nova operação da aliança no norte e oeste do país, que deve ajudar a resolver também este problema.

Naturalmente, diziam os participantes no encontro, enquanto estamos a falar uns com os outros, procuramos as vias de aproximação e compreensão mútua. Mas é irrealista, e aqui Nicolas Burns tem toda a razão, ultrapassar num ou dois anos os obstáculos acumulados entre nós pela "guerra fria" e as acções pouco perspicazes de alguns políticos.

A Rússia e a NATO já avançam e continuarão a avançar uma ao encontro da outra. Ainda não somos amigos, mas já não somos inimigos. Ainda não somos aliados, mas já somos parceiros, embora não no sentido completo da palavra, mas aproximando-nos dele passo a passo.

Viktor Litovkin observador militar RIA "Novosti"

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