UMA HISTÓRIA QUE NÃO É SOBRE UM HERÓI

Os norte-americanos aproveitaram esta chance para examinar a construção do caça russo. Depois disso, a Rússia teve que substituir o sistema eletrônico de identificação de todos os seus aviões militares. Vários anos depois, jornais russos noticiaram que o seqüestrador do MiG havia sido morto em um acidente de carro, e muitas pessoas na Rússia ficaram satisfeitas com o fato de que a pessoa que cometeu traição fora vingada. Mas na verdade o sequestrador estava vivo e bem.

Victor Belenko nasceu na cidade de Naltchik em uma família operária, e terminou a escola com distinção. Ele estudou numa escola médica por dois anos, mas mudou de idéia e entrou para a Academia da Força Aérea de Armavir. Depois de vários anos de serviço como piloto e instrutor, ele foi designado para uma unidade de defesa aérea próxima à cidade de Vladivostok. O primeiro-tenente Victor Belenko teve uma carreira de sucesso - sendo segundo-comandante de um esquadrão aéreo, ele estava prestes a ser promovido a capitão. Foi-lhe confiado a operação do mais novo avião de caça-interceptador russo, o MiG-25 P. Este avião, com o número 31 no seu lado, fora produzido recentemente, em fevereiro de 1976.

A segunda-feira, 6 de setembro de 1976, será sempre o pior dia para os pilotos desse grupo aéreo. Naquele dia, uma equipe de MiGs decolou do aeroporto de Chuguevka e praticou acrobacias e interceptação de alvos aéreos. De repente, um dos aviões desviou-se para cima e então começou a cair em direção do oceano. Então o avião desapareceu das telas de radar. Os colegas de Victor pensaram que o avião perdera o controle e caíra. Naquela tarde, Victor foi considerado morto e os pilotos começaram a juntar dinheiro para sua esposa e filhinho.

No exato momento quando o avião desapareceu do radar, ele estava voando a 50 metros sobre o oceano rumo ao Japão. Depois de chegar à ilha de Hokkaido, o avião deixou de se ocultar aos localizadores, e dois aviões de caça japoneses decolaram para capturar o avião estrangeiro. Logo o MiG seqüestrado estava na parte sul da ilha, e começou os procedimentos de pouso no aeroporto de passageiros de Hakodate. Belenko quase não pôde evitar a colisão com um Boeing da companhia aérea japonesa que estava decolando, e parou 250 metros fora da pista. O MiG parou muito próximo a uma grande antena de rádio, e o piloto teria morrido e o avião seria destruído se colidisse com ela. O avião tinha combustível para apenas 30 segundos de vôo, o que significa que o piloto não tinha tempo para um pouso mais cuidadoso.

Depois que as autoridades da URSS entenderam que a fuga de Belenko não poderia ser ocultada do público, o ministério do exterior informou que o primeiro-tenente perdeu o rumo e pousou no Japão, onde lhe injetaram drogas à força. O traidor teve uma chance de voltar à sua pátria, mesmo depois de ter solicitado asilo nos EUA. Depois do pedido da URSS, um encontro de Belenko com funcionários soviéticos foi combinado. Depois de entrar na sala, o empregado da embaixada soviética no Japão, chamado Sadovnikov, disse: "O governo soviético sabe que você perdeu o rumo, foi forçado a pousar e lhe injetaram drogas. Eu vim para ajudar-lhe a voltar para causa, para sua amada esposa e filho!" Belenko o interrompeu: "Pare de fazer progaganda para mim. Eu vim ao Japão voluntariamente." E então o "diplomata", que era um oficial da KGB, publicamente ameaçou o sequestrador: "Traidor! Nós o encontraremos onde quer que você esteja!" A história sobre a morte de Belenko em um acidente de carro pode ter sido inventada pela KGB para dissuadir outras pessoas de seguir os passos do sequestrador.

A Rússia não pôde pegar o piloto foragido, mas o avião MiG-25 finalmente voltou ao país. No entanto, antes disso o mais novo interceptador soviético foi levado a uma base militar da força aérea dos EUA, localizada a 80 km de Tóquio. Nesta base, o avião foi cuidadosamente examinado, o que ajudou os norte-americanos a descobrir muitos segredos militares. O avião foi desmantelado e levado a um barco soviético próximo ao porto de Hitachi, na noite de 12 de outubro. O MiG devolvido pelo Japão foi levado à Letônia, à cidade de Daugavpils, onde havia uma academia da força aérea soviética. Os alunos usaram o avião para treinamento.

No fim dos anos 80, o período de operação do avião terminou, e foi levado a um depósito especial de lixo. Crianças e estudantes locais pegaram pedaços do avião como lembrança.

Depois de obter o asilo político nos EUA com ajuda do presidente, Belenko conseguiu um bom emprego - ele ensinou técnicas de combate aéreo em uma academia militar por vários anos. Ele constituiu família com uma mulher norte-americana e teve três filhos. Depois, ele se divorciou e deixou a casa para a ex-mulher, conforme o contrado nupcial. Em 1980, ele ganhou um bom dinheiro depois de publicar o livro "Piloto de MiG", que escreveu com o escritor John Barron. Ele viajou muito como cidadão norte-americano e visitou 68 países.

Atualmente, está vivendo na Califórnia, trabalhando no comércio com diferentes países, inclusive a Rússia. No entanto, em contato com russos, ele sempre se apresenta com nomes fictícios.

O antigo primeiro-tenente não concorda com as críticas dirigidas contra si e explica seu sequestro como um protesto contra a ideologia soviética. Ao mesmo tempo, na sua última entrevista a uma popular revista norte-americana, Belenko confessou o que mais o impressionou nos EUA - os supermercados. Ele dsse que sua primeira visita a um supermercado foi observada por pessoas da CIS e naquele momento ele pensou que a loja era uma montagem para impressioná-lo como visitante incomum. A loja estava em um imenso e belo prédio, tinha muitos produtos e nenhuma fila de clientes, ao contrário da URSS. Depois, o ex-piloto entendeu que o supermercado era real e gostou de comprar uma grande variedade de comidas. "Era muito difícil na Rússia encontrar comida enlatada saborosa. Mas nos EUA eu comprava diferentes comidas enlatadas todos os dias, e todas eram muito boas.

Uma vez comprei uma lata onde estava escrito Jantar, e a fritei com batatas, cebolas e alho - era deliciosa. Na manhã seguinte, meus amigos me contaram que eu tinha comido frango para gatos. Mas era delicioso! Era melhor que as comidas enlatadas para pessoas, que são produzidas na Rússia mesmo hoje em dia."

Tal confissão mostra com que tipo de LIBERDADE o jovem soviético Victor Belenko sonhava em segredo. Para torná-lo realidade, ele aceitou tolerar o regime totalitário, e voluntariamente uniu-se às forças armadas do regime que ele detestava. Ele entrou para o partido e fingiu ser comunista, embora isso fosse obrigatório apenas para oficiais de maior posto que ele, a partir de major. Isso dificilmente seria compatível com um homem com ideais de liberdade, que deveria ser diferente daqueles cidadãos soviéticos que podiam aceitar permanecer em filas para comprar más comidas enlatadas.

A inteligência militar e a KGB trabalharam duro pesquisando a versão de que Belenko havia sido recrutado pela CIS durante seus estudos na Academia, ou em férias numa casa de veraneio em 1976. Nunca se encontraram provas de tal recrutamento. Enquanto isso, Belenko teve a chance de satisfazer seu gosto por boa comida sem causar um dano de dois bilhões ao país onde nascera e fora criado. À primeira vista, não havia nenhuma possibilidade porque apenas repatriados judeus podiam deixar legalmente a URSS naquele tempo. Mas de fato Belenko teve a chance de não revelar os segredos do mais novo MiG. Ele podia ter jogado o avião contra colinas em uma área desabitada de Hokkaido e usar o pára-quedas para descer. Para tal ação ele teria uma explicação razoável - ficou sem tempo de encontrar um aeroporto por falta de combustível.

A luta do personagem desta história por "ideais democráticos" dificilmente poderia ser considerada a verdadeira razão do seqüestro do avião. A razão pode ser descoberta lembrando a promessa de pagar 100 mil dólares para a pessoa que seqüestrasse o mais novo avião MiG russo. Essa promessa foi feita pelos norte-americanos em panfletos jogados sobre as bases aéres do Vietnã do Norte. Os norte-americanos não tinham nenhuma outra chance de obter um avião, a não ser combinando o seqüestro de um avião, porque os pilotos russos eram severamente proibidos de cruzar a linha de frente durante suas missões. Milhares de pilotos soviéticos participaram da guerra no Vietnã, que durou 10 anos, e Belenko poderia receber deles a informação sobre a recompensa oferecida pelos norte-americanos.

E isto é tudo sobre a triste história de um homem que não foi um herói... P.S.: Victor Belenko foi sentenciado a uma pena militar por um tribunal marcial da Suprema Corte da URSS pelo crime de traiçao (artigo 64 do código pena da URSS).

Dmitry KOROBEINIKVO Traduzido por Carlo MOIANA Pravda.Ru MG Brasil

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