GUERRA DOS COMPUTADORES PODE VIR A SER UMA REALIDADE

Se o farmacêutico americano John Pamberto, que em 1886 confundiu os ingredientes de um remédio para o estômago e criou deste modo a coca-cola, merece um monumento pelo seu genial erro, em consequência das falhas que podem ocorrer nos sistemas de computadores usados no comando dos modernos armamentos estratégicos poderá deixar de haver quem possa erigir monumentos e material para tal.

Este problema reveste-se de grande actualidade tendo em conta que o diálogo entre Moscovo e Washington no domínio da segurança nuclear decorre de novo de forma muito polémica. Em resposta à decisão dos americanos de iniciar a produção de cargas nucleares de pequena potência, facto que na realidade significa o regresso ao possível emprego de armas nucleares tácticas, o coronel-general Yuri Baluevski, primeiro vice-chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas da Rússia, declarou aos jornalistas que a Rússia corrigirá o desenvolvimento das suas forças estratégicas em função dos respectivos planos dos Estados Unidos.

"As armas nucleares, que anteriormente só eram consideradas como instrumento político de dissuasão, tornam-se hoje armas de campo de combate" - resume Yuri Baluevski.

"A verdade é que por enquanto ainda não se tornaram, pois não existe o próprio "campo de combate", mas a tendência é perigosa. Especialmente se levarmos em consideração o facto de que a maior parte dos armamentos nucleares de ambos os países se encontra historicamente em regime de elevada prevenção militar, de acordo com a concepção de golpe de resposta. Hoje, tal como ontem, os mísseis russos e americanos de baseamento terrestre podem ser disparados apenas alguns minutos depois de receberem o respectivo comando e os mísseis balísticos dos submarinos 15 minutos depois.

A elevada prevenção militar, em combinação com a concepção do golpe de resposta, numa situação em que são destinados apenas alguns minutos à tomada de decisão e a enorme capacidade de destruição das armas nucleares fizeram com que no mundo surgisse um fenómeno novo, a chamada "guerra nuclear casual".

Porquê um fenómeno novo? Ora, o perigo de lançamento não sancionado de mísseis existiu sempre, desde a colocação da primeira unidade de armas nucleares em estado operacional.

No entanto, o caso é que, primeiro, anteriormente o grau de prontidão destas armas era extremamente baixo em comparação com o actual e, segundo, anteriormente não existia o moderno sistema de alerta sobre um ataque de mísseis (SAAM) que hoje se baseia em complexos sistemas radiotécnicos e infravermelhos, instalados em terra e no espaço, caracterizados por um elevado grau de automatização e grande número de computadores de alta velocidade.

São justamente os computadores e não Gorbachev nem Reagan (como anteriormente) que hoje resolvem tudo. É justamente este sistema que elabora o sinal inicial para a tomada da decisão de desfechar o golpe de resposta. Os peritos advertem que em caso de erro fatal do SAAM não haverá tempo para analisar a situação e pode iniciar-se um conflito nuclear até mesmo contrariamente à vontade da máxima direcção política destes ou daqueles países.

O mais evidente método de evitar as consequências deste erro ou da interpretação incorrecta dos dados do SAAM consiste em baixar mutuamente o grau de prevenção das forças nucleares estratégicas, aumentando deste modo o tempo necessário à tomada de decisão sobre o ataque nuclear.

São conhecidos muitos exemplos quando as falhas no funcionamento do SAAM levaram a que os dirigentes de ambas as potências se alagassem de suor. Neste sentido são especialmente memoráveis os anos 80. Assim, em Junho de 1980, o sistema de indicação do posto do Comando da Aviação Estratégica perto da cidade de Omaja (Estado de Nebrasca) informou que um grande número de mísseis balísticos disparados de submarinos se aproximava do território dos EUA. Foram mandadas descolar todas as tripulações de serviço dos bombardeiros estratégicos B-52, que receberam a ordem de bombardear alvos no território da URSS. Só três minutos depois se tornou claro que o alarma tinha sido falso. No decurso da investigação soube-se que "se tinha queimado" um pequeno circuito integrado do computador do SAAM no valor de 50 cêntimos.

Os meios espaciais de prevenção estão igualmente longe da perfeição. Em princípio, o vazamento do aço numa siderurgia pode ser plenamente tomado a partir do espaço pelo lançamento de um míssil. De acordo com as análises de peritos da Força Aérea americana, na década de 80 os sinais falsos emitidos pelos sistemas de alerta verificaram-se, em média, 6 vezes por dia.

Actualmente a situação é agravada ainda pelo facto de que nos últimos anos na Rússia ter diminuído substancialmente o número de satélites militares, elemento básico do SAAM, em consequência das dificuldades económicas do país. Este facto não garante a total confiança no funcionamento dos meios russos de alerta precoce sobre um ataque nuclear.

Na opinião de Aleksei Arbatov, vice-presidente da Comissão de Defesa da Duma de Estado, câmara baixa do Parlamento russo, a decisão de baixar o nível de prontidão militar, expressa ainda em 2001 num relatório especial, contribuiria para a redução das forças nucleares estratégicas, mantendo, ao mesmo tempo, o potencial de dissuasão. Caso os armamentos nucleares de ambas as partes se encontrem em baixo grau de prontidão, não haverá necessidade de dispor de grande número de vectores e ogivas nucleares receando que uma parte considerável do arsenal possa ser destruída por um ataque preventivo de surpresa do adversário.

No entanto suscitam optimismo as palavras de Yuri Baluevski, que contrastam agradavelmente com as suas declarações sobre "as armas de campo de combate". Ele considera que hoje em dia os EUA, que dispõem do mais poderoso exército do mundo, devem ser os primeiros a levantar a fasquia do emprego das armas nucleares. Se compreendemos correctamente o general, neste caso não será necessário convencer longamente a Rússia para que tome a mesma medida.

Andrei Kisliakov observador político da RIA "Novosti"

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