Tribunal Europeu de olhos vendados pelo véu islâmico

Tribunal Europeu de olhos vendados pelo véu islâmico

Empresas poderão proibir o uso de símbolos religiosos, políticos ou filosóficos:

O Tribunal Europeu de Justiça, por decisão incontestável de 14.04.2017, deixa à discrição das empresas a decisão de proibir ou não o uso do lenço islâmico no trabalho, sob determinadas condições. Para os 28 juízes do tribunal europeu, os interesses da economia têm caracter prioritário em relação à confissão religiosa ou partidária; as empresas podem proibir o uso de símbolos religiosos, políticos ou filosóficos aos funcionários, no caso de estes se tornarem perturbadores do negócio no contacto com os clientes.

A decisão do tribunal parece inocente, mas pode ter consequências alargadas, pois ao conceder às firmas privadas o direito de neutralidade, na consequência, mais obrigação terá o Estado de praticar a neutralidade nas suas instituições. A consequência que se pressupõe a entrar pela porta traseira é uma rígida separação entre estado e religião. Por outro lado, corresponde à privatização também da política e praticamente ao desfavorecimento da cultura autóctone. A justiça deu um tiro no próprio pé!

Em países civilizados a liberdade religiosa é um direito fundamental e ninguém deve ser discriminado por razões religiosas. A missão do estado é garantir a paz social e a neutralidade do Estado; consequentemente o direito de igualdade de trato (não discriminação) pressupõe que a maioria tenha de se colocar ao mesmo nível da minoria (tratamento igual para todos: um assunto que provocará insónias!). No caso, quem mais sofrerá, a longo prazo, são as instituições cristãs que viam muitos dos seus símbolos, costumes e hábitos tidos com coisa natural, em sociedades de reminiscência cristã, e como tal naturalmente apoiados por muitos Estados. Agora com os muçulmanos, que não só se entendem com direito ao espaço público, mas que também o exigem, surgirão problemas para a sociedade acolhedora para os quais não encontra resposta nem está preparada. O Estado laico e as organizações partidárias, como representantes de ideologias, terão também elas de se colocar no terreno das ideologias, ao terem de se defrontar perante o Islão que é uma religião-política que reúne num só sistema o foro mundano (César) e o foro divino. Numa sociedade, cada vez mais islamizada, isto trará consequências graves quer para o poder secular quer para a organização e agrupamento partidários do Estado. O factor religioso e ideológico ganharão mais espaço público e político e a atmosfera social assumirá um caracter mais jacobino. Por outro lado, o Estado secular, ao não ter em conta a tradição cultural dos autóctones, torna inoperante o equilíbrio até agora criado nas sociedades pelas forças da aculturação e inculturação.

Já vai sendo tempo de a Europa se ocupar dos aspectos negativos do islão e dos aspetos positivos que podem significar os muçulmanos. A política seguida de 1950 até agora tem sido irresponsável para com as sociedades acolhedoras e irrefletida para com os imigrantes muçulmanos ao preocupar-se apenas com o seu desenvolvimento económico e negligenciando a sua modernização religiosa e cultural.  Assim, em vez de se fomentar a visão da Turquia de Atatürk fomentou-se o islão do véu islâmico e dos interesses veiculados pelas associações turcas de interesse

No caso do islão tem-se a ver com uma religião política e o islão do lenço é, precisamente a representação de uma força politizada contra os muçulmanos modernistas e contra uma Europa consciente, que desejariam ver a afirmação de um islão europeu. Isto não quer dizer que se deva proibir o lenço muçulmano, embora seja símbolo da afirmação do islão retrógrado e contra os muçulmanos progressistas na Europa; no islão do lenço, trata-se de um islão à lá Erdogan, em que as comunidades muçulmanas turcas, a viver noutros países, correspondem a comarcas pessoais (não territoriais) no estrangeiro da turquidade e do avanço muçulmano. Como a verdadeira fidelidade é concebida em termos de religiosidade nacional, a dupla nacionalidade revela-se, em muitos casos,  num apelo à infidelidade para com os países de acolhimento. A realidade que se observa e constata: gerações turcas a viverem há 60 anos na Alemanha continuam imunes aos valores democráticos ocidentais ao votarem maioritariamente em Erdogan que desde o início da sua carreira política trabalha no sentido de destruir o estado moderno da Turquia criado por Atatürk para o transformar num fascismo religioso.

Aqui só poderá ajudar uma relação motivada pela bilateralidade de direitos e deveres em relação (neste caso) à Turquia e ao Ocidente; e isto pelo simples facto de se ter de criar proporcionalidade e clareza na política e nos interesses (Não pode ser que os muçulmanos se considerem num país de acolhimento como grupo de identidade estrangeira - um estatuto religioso com direitos de afirmação grupal especial - enquanto os imigrantes na Turquia (ou país muçulmano) sejam considerados apenas como indivíduos e como tal sem direito a afirmarem-se como grupos. A Turquia e países muçulmanos teriam de dar os mesmos direitos às minorias imigrantes dos seus países tal como as suas minorias emigradas pretendem do estrangeiro. Doutro modo uns têm um livro que os defende e os outros encontram-se à chuva por não possuírem livro que os abrigue. Aqui teriam de entrar em acção os políticos com tratados bilaterais que consignem os mesmos direitos e oportunidades bilateralmente; doutro modo em vez de se proporcionar o desenvolvimento de uma interculturalidade respeitosa e mútua afinca-se a luta da multiculturalidade (uma guerrilha sub-reptícia).

O direito europeu não se deveria deixar levar pelas ondas emocionais do tempo. Com a decisão do Tribuna Europeu, os juízes submetem demasiadamente o direito ao critério do humor de opiniões e confissões que arbitrariamente poderão ser consideradas, em qualquer altura, como argumento de perturbação da ordem pública. A justiça terá de estar atenta para, também ela, não se turquizar, abandonando padrões racionais ocidentais pelo facto de se ver confrontada com novas realidades sociais.

Entretanto, é de referir que o tratamento não igual nem sempre é discriminador (idade, sexo...).

A discussão pública sobre o islão é superficial e inocente porque se prende em exterioridades como o bocado de pano que as mulheres muçulmanas colocam ou não na cabeça e como tal perde-se no acidental em vez de se dedicar à linha de princípios e práticas. Mais importante que o lenço a cobrir a cabeça seria pesquisar e falar do que o lenço encobre ou guarda dentro da cabeça.

Importante seria que estado, religião e ideologias trabalhassem em estreita colaboração e m diálogo e na bilateralidade de reconhecimento de umas às outras, em benefício do povo e do país. Doutro modo a coexistência torna-se desconfortante e catastrófica porque se afirma o oportunista e a falsidade em vez do diálogo franco e aberto. Para isso teremos de nos deixar de olhar de lado uns aos outros. Temos de falar todos do essencial e deixarmos de andar a apresentar mezinhas com este ou aquele exemplo de pessoas individuais ou episódios esporádicos que não representam a instituição, mas servem em grande parte para se ir adiando a resolução do problema que terá de passar intelectualmente pela controvérsia para se poder chegar à concórdia. Não chega a boa vontade nem meias verdades; precisa-se também de vontades esclarecidas e de discernimento na procura de uma verdade que é complexa..

António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e pedagogo

In Pegadas do Espírito

Fonte

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